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Câmara dos Deputados aprova projeto que cria o Vale-Cultura

Folha de S. Paulo – 21/11/2012 – Por Erich Decat e Nadia Guerlenda de Brasília

A Câmara aprovou nesta quarta-feira (21) projeto que cria o Vale-Cultura, válido em todo o território nacional.

O vale servirá como espécie de “vale-alimentação”, no valor de R$ 50 por mês, para aqueles que recebem até cinco salários mínimos (R$ 3.110) gastarem com cinema, livros e shows, por exemplo. O prazo de validade para gastar o benefício deverá ser definido posteriormente em regulamento.

O benefício deverá ser, preferencialmente, disponível em cartão magnético aos empregados. O documento será confeccionado por empresas cadastradas no Ministério da Cultura.

O vale deverá ser disponibilizado pelas empresas, que terão a opção de integrarem o Programa de Cultura do Trabalhador previsto na proposta aprovada nesta quarta. Essas empresas poderão deduzir o valor despendido com o vale, no máximo 1%, do Imposto de Renda até 2017.

APOSENTADOS E ESTAGIÁRIOS

A pedido do governo foi elaborado nesta quarta-feira um novo projeto que excluiu os servidores públicos, aposentados e estagiários. Dessa forma se evitou o desgaste para a presidente Dilma Rousseff ter que vetar trecho da proposta que previa o benefício para esses três setores.

“Para representantes do governo não se trata de um benefício previdenciário ou que tenha impacto direto ao Orçamento da União, por isso foi retirada essa parte do projeto. O centro deve ser as empresas privadas”, disse a deputada Jandira Feghali (Pc do B-RJ).

Como o texto aprovado foi apresentado agora, ele deverá ir ao Senado para votação. Se não for modificado, será encaminhado para sanção presidencial.

O objetivo do governo é aprová-lo até o fim do ano. Há uma preocupação com as eleições presidenciais de 2014, quando Dilma deve concorrer à reeleição.

Projetos com renúncia fiscal só passam a valer no exercício seguinte. Ou seja, se for aprovado neste ano, só vigorará em 2013. Somam-se a isso os seis meses necessários para a implementação do vale, que estaria a pleno vapor no ano eleitoral.

Mansfield Park mais perto de nós

O tradutor Rodrigo Breunig acaba de entregar a tradução do livro Mansfield Park, da Jane Austen. Ainda há várias etapas pela frente: revisão, diagramação, capa… Mas no primeiro semestre de 2013, Mansfield Park vai se juntar aos outros títulos de Austen que a Coleção L&PM Pocket já oferece: Orgulho e Preconceito, Persuasão, A Abadia de Northanger e Razão e Sentimento. Leia um pequeno trecho da tradução recém chegada:

À educação de suas filhas Lady Bertram não dava a menor atenção. Ela não tinha tempo para tais cuidados. Ela era uma mulher que passava seus dias sentada, lindamente vestida, num sofá, fazendo alguns longos trabalhos de bordado, de pouca utilidade e nenhuma beleza, pensando mais em seu Pug do que em suas meninas, mas muito indulgente com estas últimas quando não houvesse inconveniência para ela, guiada em tudo que fosse importante por Sir Thomas e, em questões menores, por sua irmã. Possuísse ela mais tempo livre em benefício de suas garotas, provavelmente teria julgado qualquer atitude desnecessária, pois elas estavam sob os cuidados de uma preceptora, com mestres apropriados, e não poderiam precisar de mais nada.

A ilustração que será usada na capa de "Mansfield Park", o próximo título de Jane Austen na Coleção L&PM Pocket. A ilustração é de Birgit Amadori

Breve história de Voltaire

A escultura mais famosa da imagem de Voltaire, feita por Jean-Antoine Houdon, conseguiu capturar o sorriso cerrado e os pés de galinha desse homem espirituoso e corajoso. Defensor da liberdade de expressão e da tolerância religiosa, Voltaire foi uma figura controversa. Na Europa do século XVIII, porém, a Igreja Católica controlava com rigidez o que podia ser publicado. Muitos dos livros e peças de Voltaire foram censurados e queimados em público, e ele chegou a ser preso na Bastilha, em Paris, por ter insultado um poderoso aristocrata. Mas nada disso o impediu de desafiar os preconceitos e as pretensões daqueles que o cercavam. No entanto, hoje ele é mais conhecido como o autor de Cândido (1759) – Trecho de Uma breve história da filosofia.

O impressionante busto de Voltaire esculpido por Houdon

Voltaire nasceu em Paris no dia 21 de novembro de 1694 e foi batizado com o nome de François Marie Arouet. Segundo Nigel Warburton, autor de Uma breve história da filosofia, uma das coisas que o diferenciou de outros célebres filósofos foi que Voltaire era rico. Warburton conta em seu livro que, jovem, ele fez parte de um grupo que descobriu uma falha no sistema de loterias do governo e comprou vários milhares de bilhetes premiados. Investiu esse dinheiro e enriqueceu ainda mais. Isso deu a ele liberdade financeira para defender as causas em que acreditava. Acabar de vez com a injustiça era sua paixão.

Cate Blanchett e Mia Wasikowska na adaptação de “Carol” para os cinemas

Em fevereiro de 2013, começa a ser rodada a adaptação de Carol para os cinemas, livro de Patricia Highsmith publicado pela primeira vez no início dos anos 50. O filme terá roteiro adaptado de Phyllis Nagy, direção de John Crowley e terá nos papéis principais Cate Blanchett e Mia Wasikowska.

Cate Blanchett será Carol e Mia Wasikowska fará o papel de Therese

Escrevendo inicialmente sob o pseudônimo de Claire Morgan, Patricia Highsmith criou um romance que aborda uma relação amorosa entre mulheres que, pela primeira vez na literatura, teve um final feliz. Recusado pelo editor norte-americano da escritora, o livro acabou sendo publicado por outra editora com o título de The Price of Salt (só depois ele passaria a ser Carol) e logo se tornou um grande sucesso.

O livro conta a história de Therese Belivet, aspirante a cenógrafa que trabalha como vendedora na seção de bonecas de uma loja de departamentos, e de Carol, uma bela e elegante mulher recém separada e mãe de uma filha que, na época do Natal, em meio à loja lotada, chama atenção de Therese. A vendedora fica hipnotizada por ela: “Alta e clara, com um longo corpo elegante dentro de um casaco de pele folgado (…), seus olhos eram cinzentos, claros e, no entanto, dominadores, como luz ou fogo”.  

Assim começa o romance entre a jovem Therese e Carol. Mas não pense que esta é uma simples história de amor. Patricia Highsmith criou uma trama cheia de aventura, suspense e contornos noir.

Patricia Highsmith teve a ideia de escrever Carol baseada em uma experiência própria: ela se tornou obcecada por uma mulher que viu em uma loja. Anos mais tarde, a escritora contou no prefácio de uma nova edição do livro que costumava receber de dez a quinze cartas por semana endereçadas a Claire Morgan, agradecendo à escritora ou mesmo pedindo conselhos. Para ela, Carol ajudou muitos homossexuais a se libertarem.

 

A Consciência Negra na literatura

20 de novembro é o Dia Nacional da Consciência Negra, data escolhida porque foi nesse dia, em 1695, que morreu Zumbi dos Palmares. Celebrado desde a década de 1960, o Dia da Consciência Negra tornou-se tão importante no Brasil que, em muitas cidades, incluindo Rio de Janeiro e em São Paulo, é feriado. Entre as obras literárias que devem ser lembradas no dia de hoje está Os escravos, de Castro Alves. Poeta símbolo do romantismo brasileiro, seus poemas acabaram se tornando uma bandeira dos abolicionistas na luta contra a escravidão.

Trecho do poema "Saudação a Palmares", do livro "Escravos" de Castro Alves

Poemas chineses

Por Luiz Antonio de Assis Brasil*

Quem lê jornal e se detém numa coluna de crônica, é porque tem experiência de leitura e possui muito conhecimento acumulado. Seu imaginário acerca da China, por exemplo, não se deixa seduzir por ideias feitas, como Mao-Tsé-Tung ou o catálogo de produtos industrializados que inundam nossas lojas e supermercados. Esse leitor já sabe que a China possui uma antiquíssima e invejável cultura, representada nas artes plásticas, na música, na arquitetura, no teatro e na poesia.

Tomando esses dados como autênticos, não cabe repetir que a poesia chinesa tradicional possui temas que em que está, por excelência e relevância, a natureza. É de Li Bai (701-762, na datação ocidental) o Diálogo sobre a montanha: Há quem pergunte / por que vivo / nestas verdes colinas. / Sem responder, sorrio, / de coração sereno, / enquanto as flores de pessegueiro / flutuam na água. / Tudo vai embora, tudo se apaga. / Aqui é outra, a terra, / e outro, o céu. / Nada parecido / com o mundo dos humanos / lá embaixo. Este poema, e outros do mesmo autor e, ainda, de Du Fu (712-770) e Wang Wei (701-761) foram reunidos no livro Poemas Clássicos Chineses, L&PM Pocket, com tradução e organização de Sérgio Capparelli (sim, o nosso estimado e premiado escritor de obras infantis, mas não só) e Sun Yuqi. Na abertura há um curto, mas cabal ensaio de Leonardo Fróes, recomendável a quem não está familiarizado com a poesia da China.

Não será possível, por óbvio, estabelecer qualquer juízo sobre a acuidade do trabalho da tradução, mas confiamos plenamente nos nomes da capa. Algo que chama atenção, em particular, é a extrema síntese linguística dos caracteres chineses, visível quando comparamos o original nas páginas pares com a respectiva tradução nas páginas ímpares. Os poetas chineses precisavam de apenas quatro linhas, quando precisamos do dobro, pelo menos. Nada de novo.

Mas voltando ao tema da natureza. Observe-se o refinamento deste poema do aristocrata Wang Wei, também músico e pintor: Pássaros / alçando voo. / Montanhas / que se repetem, / sempre, / na cor do outono… / Ando de um lado para o outro / no monte florido: / até quando / essa melancolia?

Quer-se dizer: enquanto, no mesmo período, os aristocratas ocidentais, sem nenhuma melancolia, matavam-se em batalhas cruentas, Wang Wei escrevia um poema sobre montes floridos. Algo a pensar. Mas, antes, é bom ler o livro por inteiro.

*Luiz Antonio de Assis Brasil acaba de lançar Figura na sombra. Esta crônica foi publicada originalmente no Segundo Caderno do Jornal Zero Hora em 19 de novembro de 2012.

“Desembarcando o Alzheimer” entre os mais vendidos na Livraria da Folha

Desembarcando o Alzheimer é um livro que não pode faltar na cabeceira daqueles que convivem ou cuidam de pessoas que sofrem com esta doença. Em quinto lugar entre os mais vendidos da Livraria da Folha na categoria Saúde, este guia foi escrito a quatro mãos pelos Doutores Ana Hartmann e Fernando Lucchese. O livro traz tudo que é preciso saber sobre a doença, sobre o paciente e sobre como familiares e cuidadores podem melhorar a vida dos doentes. No final, ainda oferece respostas às perguntas frequentes. Veja abaixo algumas dessas dúvidas que Desembarcando o Alzheimer ajuda a esclarecer:

Cozinhar com panelas de alumínio causa Alzheimer?
Na realidade, nos anos 60 e 70 surgiu a hipóteses de que alumínio poderia causar Alzheimer, estivesse ele em panelas, bebidas, antiácidos ou antiperspirantes. Estudos posteriores demonstraram não haver ligação entre o alumínio e o Alzheimer.

Há tratamentos disponíveis para estancar a progressão da Doença de Alzheimer?
Até o momento, não há tratamento para cura, retardamento ou parada da Doença de Alzheimer. O que se tem são medicamentos que temporariamente retardam o aparecimento dos sintomas por cerca de 6 a 12 meses, em média, mas somente para alguns pacientes.

Quanto tempo dura a doença?
As séries históricas têm demonstrado que a doença tem duração de dois a 20 anos. Trata-se, no entanto, de uma doença fatal, pois é incurável. As variações individuais se devem à idade por ocasião do diagnóstico, à presença ou ausência de outras enfermidades concomitantes, à severidade da própria doença, que é variável de paciente para paciente, e aos cuidados que o paciente recebe.

Escritos do chinês Nobel da Paz chegam ao Brasil

O Estado de S. Paulo – 17/11/2012 – Por Maria Fernanda Rodrigues

Prêmio Nobel da Paz de 2010, intelectual e prisioneiro do governo chinês desde 2009 por “incitação à desmoralização do poder do Estado”, Liu Xiaobo terá seus escritos publicados pela primeira vez no País pela L&PM. Não Tenho Inimigos, Desconheço o Ódio chega às livrarias em dezembro reunindo poemas e textos selecionados por sua mulher para a editora alemã S. Fischer – inclusive o discurso proferido em seu julgamento e lido pela atriz Liv Ullmann em Oslo, na entrega do Nobel. A tradução ficou a cargo de Petê Rissatti. O lançamento é oportuno, já que esta semana a China trocou seus comandantes. Na época da premiação, o país chegou a comentar que a decisão por seu nome era propaganda do Ocidente para desestabilizar o partido comunista. Este ano, outro chinês, Mo Yan, ganhou o Nobel, o de literatura, e desta vez houve festa oficial. Em recente entrevista, Mo disse ter esperanças de que o conterrâneo seja solto – ele cumpre pena de 11 anos. Os brasileiros terão de esperar um pouco mais para conhecer a obra de Mo Yan. A Cosac Naify já garantiu os direitos de Change e prevê a publicação para algum momento de 2013. Por ora, seis tradutores estão sendo testados.

Em entrevista à Folha, Ferlinghetti fala de “Amor nos tempos de fúria”

A capa do Caderno Ilustrada da Folha de S. Paulo de sábado, 17 de novembro, é estampada com uma grande foto de Lawrence Ferlinghetti, escritor que fundou a livraria e editora City Lights de São Francisco (EUA), célebre por lançar os expoentes da geração beat. Em uma bela matéria, o jornalista Cassiano Elek Machado conta porque Ferlinghetti continua sendo, aos 93 anos, um dos grandes nomes da contracultura. Na entrevista exclusiva, Ferlinghetti fala da sua vida e obra, com especial destaque para o livro Amor nos tempos de fúria, romance inédito no Brasil que a L&PM lança em dezembro. 

QUANTO MAIS RADICAL MELHOR

“Precisamos lutar pelo futuro”, diz o poeta da contracultura Lawrence Ferlinghetti

Por Cassiano Elek Machado
De São Paulo

Lawrence Ferlinghetti era capitão de fragata na Segunda Guerra Mundial. Recorda-se bem do vento gelado que sacudia seu barco quando, com um quepe duas vezes maior do que sua cabeça, cruzou o Canal da Mancha em 6 de junho de 1944, o Dia D.

Ferlinghetti chegou de trem a Nagasaki, seis semanas depois do estouro do grande cogumelo atômico. Encontrou lá um interminável campo de palha que parecia ter sido queimado por maçaricos gigantes.

Ferlinghetti esteve preso na cadeia municipal de São Francisco em 1957, quando sua recém-fundada editora, City Lights Books, publicou o “subversivo” volume de poesia “Uivo”, de Allen Ginsberg, dando ignição para a Geração Beat. Ele esteve com Fidel Castro em Havana, em 1959; em Paris em 1968; em Woodstock em 1969; com os sandinistas na Nicarágua e com os zapatistas no México.

Lawrence Ferlinghetti está ao telefone em sua casa, em San Francisco (EUA), e não quer falar do passado. “Precisamos lutar pelo futuro. Ou respiramos e agimos agora ou acabaremos com tudo.”

Aos 93 anos, o poeta norte-americano acaba de publicar um volume de poesia com este mote, o livro “Time of Useful Consciousness” (New Directions), lançado há 20 dias nos Estados Unidos.

Sua vasta e contundente obra, que lhe rendeu prateleiras de prêmios, também ganha espaço no Brasil. A editora L&PM, que já havia lançado a principal obra poética de Ferlinghetti, “Um Parque de Diversões da Cabeça” (“A Coney Island of the Mind”, 1958), publica na próxima quinzena um dos raros livros de prosa do autor.

O breve romance “Amor nos Tempos de Fúria”, de 1988, narra uma inflamável história de amor entre uma artista e um banqueiro, ambientado na Paris de 1968.

Em entrevista à Folha, Ferlinghetti falou sobre esta obra, comentou seu novo trabalho poético e conclamou os leitores a lutarem por questões sociais: “Não fique aí sentado, seu estúpido!”.

Folha – O seu livro “Amor nos Tempos de Fúria” é dedicado a Fernando Pessoa. Você o fez para homenagear sua mãe, que era de origem portuguesa?
Lawrence Ferlinghetti – A família de minha mãe era mesmo portuguesa, eram sefarditas de uma cidade chamada Monsanto, em Portugal. Mas não cheguei a ter contato com este passado. O livro não homenageia a minha mãe, mas sim a Pessoa. Eu me inspirei no texto dele “O Banqueiro Anarquista”. Peguei deste texto toda a ideia central para meu livro.

O sr. se identifica com as ideias do “banqueiro”, que tem o sobrenome Mendes, assim como sua família?
É curioso, mas o termo anarquismo é usado hoje na imprensa americana como sinônimo de terrorismo. É uma completa ignorância à respeito da tradição anarquista.
Nos anos 50 todos éramos anarquistas. Mas nos anos 50 a população mundial era a metade da atual. Quando havia menos gente era possível ser um deles. Mas quando a população dobra algum nível de planificação da economia mundial se faz necessário.
Hoje eu me descreveria como socialista humanitário.

O sr. já disse que normalmente as pessoas costumam ficar mais conservadoras quando envelhecem e que com o sr. foi o oposto. Por que o sr. acredita que esteja ficando cada vez mais radical?
A pressão do tempo é que dita isso. Tempos radicais pedem respostas radicais. O mundo está num péssimo estado. Lembro que tive uma conversa com Günther Grass em 1975. Ele disse que acreditava que, no final do século 21, as nações tal como as conhecemos não existiriam mais e o mundo estaria coberto de hordas étnicas lutando por comida e abrigo. É uma visão terrível do futuro, mas não é impossível diante do que vivemos. Precisamos lutar.

O sr. se considera um ativista?
Quando alguém escreve para valer é, em essência, um ativista. É importante agir. Não dá para ficar sentado em casa. Não fique sentado aí, seu estúpido, o mundo está em chamas (risos).

“Time of Useful Consciousness”, título de seu novo livro, é um termo aeronáutico que trata do tempo que alguém tem num avião entre o momento em que fica sem oxigênio e a morte. É uma metáfora para a situação do ser humano?
É exatamente isso. Chegamos a um ponto de inflexão em termos de ecologia. Os maiores estudiosos do clima estão discutindo atualmente se a raça humana vai sobreviver a este século. Ou respiramos e agimos agora ou acabaremos com tudo muito em breve.

O sr. é conhecido por sua poesia, não pela prosa, e em ambas usa linguagens experimentais. Por que no romance que está saindo aqui o sr. usou um estilo mais convencional?
Quando escrevi “Her” [1960], meu romance anterior, estava interessado em trabalhar o fluxo de consciência. Estava influenciado por obras inovadoras como “Nadja”, de André Breton. “Amor nos Tempos de Fúria” foi escrito num momento diferente. Eu tinha voltado a morar em Paris, eram os anos 1980 e o Centro Georges Pompidou tinha digitalizado todos os jornais de 1968. Li tudo e achei que deveria ambientar um romance neste momento.

O sr. disse que releu o livro para esta entrevista. Gostou do que leu?
Sim, embora eu prefira o estilo de “Her”. O deste é mesmo mais convencional. É quase uma reportagem desta época, com a graça de usar como protagonista o personagem de Fernando Pessoa.

Há um mês o sr. deu uma de “Banqueiro Anarquista” e recusou um prêmio de € 50 mil por razões ideológicas, não?
Recusei o prêmio do PEN Club da Hungria depois de descobrir que parte do dinheiro vinha do governo daquele país, que hoje é um dos mais autoritários da Europa e cujo primeiro-ministro andou homenageando um nazista. Foi difícil negar o prêmio, porque € 50 mil é mais do que eu ganhei com poesia durante toda a minha vida, mas não tive escolha.

Mas “A Coney Island of the Mind” é considerado o livro mais vendido de um poeta vivo americano. Já vendeu um milhão de cópias…
Deve ser, mas em nenhum ano ganhei mais do que US$ 10 mil de royalties.

O sr. ainda vai à livraria que fundou, a City Lights?
Costumo dar um pulo lá de vez em quando, mas me aposentei do trabalho mais ativo. Você sabe, tenho 93 anos. Coloquei um pessoal mais jovem para tocar o negócio. Prefiro me dedicar à pintura e à poesia. No livro novo junto as duas, já que na capa há uma pintura minha.

A capa mostra um relógio com dois ponteiros quase sobrepostos…
É o tempo que está acabando. É um livro um pouco sombrio, mas, no final do poema, depois de escrever sobre os terríveis prognósticos para o planeta, eu escrevo “Chega, chega”. Eu tento encontrar alguma esperança no futuro. Nas últimas páginas há esta grande virada. Não queria terminar com um tom de desespero. Por isso é que, no final do livro, eu cito Walt Whitman, o eterno otimista.

O sr. costuma ser chamado de “o último beat”, mas já li declarações suas dizendo que não gosta do epíteto.
Eu me associei aos beats mais por ter sido editor deles. Mas minha poética é diferente. Minha poesia foi influenciada por franceses como Apollinaire, Jacques Prévert e outros voltados para a cultura europeia. Os beats não iam por esta linha. Havia outra diferença. Sou heterossexual. Metade dos beats era gay.

Quais as principais diferenças em termos poéticos?
A poesia de Allen Ginsberg era baseada na ideia do “primeiro pensamento, melhor pensamento”, um conceito que ele pegou do budismo. Jack Kerouac acreditava nisso. Você escreve a primeira coisa que aparece na sua cabeça, sem censura. É um modo profundo e verdadeiro de conceber poesia. O que você escreve primeiro é muito frequentemente melhor do que o que consegue depois de burilar o texto. Mas isso é mais verdadeiro se você é Ginsberg, um gênio com a mente original. Mas se você ensina isso para centenas de estudantes de poesia, como Kerouac fez numa escola em Colorado, não vai funcionar. As pessoas têm mentes comuns e produzirão alqueires de poesia chata. Ele pregava que as pessoas deveriam escrever sobre a primeira coisa que vissem logo que acordassem. Isso pode ser lindo no olhar de Ginsberg, mas não funciona para todos. Imagine: “Acordei. Vi minha escova de dentes. Ela caiu no chão. Abaixei para pegá-la”, fim do poema (risos).

 Na mesma matéria, Cassiano Elek Machado conta sobre os novos livros da Série Beats que serão lançados pela L&PM. Clique aqui para ler.