Arquivo mensais:outubro 2018

“Nenhum escritor pode ser transformado em instituição”

Com essa premissa, Jean-Paul Sartre recusou o prêmio Nobel de Literatura em 22 de outubro de 1964. No dia seguinte à divulgação, Sartre publicou um longo texto no jornal francês “Le Figaro”, explicando seus motivos. Leia abaixo a carta:

“Lamento vivamente que este assunto tenha tomado a aparência de um escândalo; um prêmio foi concedido e alguém o recusa. Isto se deve ao fato de que não fui informado devidamente a tempo do que se preparava. Li no “Le Figaro Litteraire”, de 15 do corrente mês, sob a assinatura do correspondente sueco deste jornal, que a maioria na Academia Sueca era a meu favor, mas não havia sido ainda definitivamente fixada, pelo que bastava escrever uma carta à academia, o que fiz no dia seguinte, para pôr um ponto final ao assunto e não mais se falasse dele. Eu ignorava, então, que o Prêmio Nobel é outorgado sem que se peça a opinião ao interessado e pensei que ainda era tempo de impedí-lo. Mas compreendo muito bem que quando a Academia Sueca faz sua escolha, já não pode voltar atrás. As razões pelas quais renuncio ao prêmio não se referem nem à Academia Sueca, nem ao Prêmio Nobel em si, como já expliquei em minha carta à Academia. Nela invoquei duas espécies de razões; razões pessoais e razões objetivas. As razões pessoais são as seguintes: minha negativa não é um ato improvisado. Sempre recusei as distinções oficiais. Quando, depois da guerra, em 1945, me propuseram a Legião de Honra, recusei-a, apesar de possuir amigos no Governo. Igualmente nunca aceitei ingressar no Colégio de França como sugeriram alguns de meus amigos. Esta atitude é baseada em minha concepção do trabalho do escritor. Um escritor que assume posições políticas, sociais ou literárias somente deve agir com meios que lhes são próprios, isto é, com a palavra escrita. Todas as distinções que possa receber expõem seus leitores a uma pressão que não considero desejável. Não é a mesma coisa se eu assino Jean-Paul Sartre que se eu assino Jean-Paul Sartre, Prêmio Nobel. O escritor que aceita uma distinção deste gênero compromete, também, a associação ou instituição que a outorga: minhas simpatias pelos guerrilheiros venezuelanos somente a mim comprometem, mas se o Prêmio Nobel Jean-Paul Sartre toma partido pela resistência na Venezuela, arrasta consigo todo o Prêmio Nobel como instituição. Nenhum escritor deve deixar-se transformar em Instituição, mesmo que isto se verifique pela mais honrosa forma, como no caso presente. Esta atitude é inteiramente pessoal e, evidentemente, não representa nenhuma crítica contra aqueles que já foram premiados. Tenho muita estima e admiração por muitos dos laureados que conheci pessoalmente. Mas minhas razões objetivas são as seguintes: – O único combate atualmente possível no campo da cultura é o da existência pacífica das duas culturas, a do Leste e a do Oeste. Não quero dizer com isso que seja necessário que se dêem abraços. Sei perfeitamente que o confronto entre estas duas culturas deve, por necessidade, adotar a forma de um conflito, conflito que deve ter lugar entre homens e entre culturas, mas sem intervenção de instituições. Sinto pessoal e profundamente as contradições entre as duas culturas: sou feito dessas contradições. Minhas simpatias vão inegavelmente, para o socialismo e para o que se chama o Bloco do Leste, mas vivi e me eduquei numa família burguesa e numa cultura burguesa. Isto me permite colaborar com todos aqueles que querem aproximar ambas as culturas. Espero, naturalmente que a melhor ganhe, isto é, o socialismo. Por isso é que não posso aceitar nenhuma distinção concedida pelas altas instâncias culturais, tanto de Leste como do Oeste, mesmo que admita sua existência. Embora todas as minhas simpatias vão para o campo socialista, seria impossível para mim aceitar, por exemplo, o Prêmio Lênin, se alguém quisesse me conceder, o que não se dá. Sei muito bem que o Prêmio Nobel, por si mesmo, não é um prêmio literário do campo ocidental, mas se transforma no que se faz dele e podem suceder coisas que os membros da Academia Sueca não podem prever. Por isto que, na situação atual, o Prêmio Nobel se apresenta objetivamente como uma distinção reservada aos escritores do Oeste ou aos rebeldes do Leste. Não se premiou Neruda, que é um dos maiores escritores americanos. Nunca se pensou seriamente em Aragon, que bem o merece. É lamentável que se tenha concedido o prêmio a Pasternak e não a Cholokhov e que a única obra soviética coroada seja uma editada no estrangeiro, proibida em seu país. Poder-se-ia ter estabelecido um equilíbrio mediante um gesto análogo no outro sentido. Durante a guerra da Argélia, quando assinamos o Manifesto dos 111 eu teria aceito o prêmio com reconhecimento, porque ele não teria honrado somente a mim, mas à liberdade pela qual lutávamos. Mas isso não aconteceu e é somente no fim dos combates que se entregam os prêmios. Na motivação da Academia Sueca se fala de liberdade: é uma palavra que se presta a numerosas interpretações. No ocidente, se fala de liberdade num sentido geral. Entendo a liberdade de uma forma mais concreta, que consiste no direito de ter mais de um par de sapatos e de comer pão menos duro. Parece-me menos perigoso declinar do prêmio do que aceitá-lo. Se o aceitasse, me prestaria ao que se pode chamar de uma ‘recuperação objetiva’. Afirma o artigo do ‘Le Figaro Litteraire’ que ‘não se teria em conta meu passado político discutido’. Sei que este artigo não exprime a opinião da Academia Sueca, mas ele mostra claramente em que sentido seria interpretada minha aceitação em certos meios de direita. Considero este ‘passado político discutido’ como ainda válido, mesmo se disposto a reconhecer certos erros passados perante meus camaradas. Não quero dizer que o Prêmio Nobel seja um prêmio ‘burguês’, mas esta seria a interpretação burguesa que dariam inevitavelmente os meios que conhecemos. Finalmente, resta a questão do dinheiro. É verdadeiramente grave que a Academia coloque sobre os ombros do laureado, além da homenagem, uma soma enorme. Este problema me atormentou. Ou bem se aceita o prêmio e com a soma recebida se apóiam movimentos ou organizações que se consideram importantes – de minha parte seria o Comité Apartheit de Londres – ou bem se recusa o prêmio em vista de virtude de princípios gerais, e se priva este movimento ao apoio que necessita. Renuncio, evidentemente, às 250.000 coroas porque não quero ser institucionalizado nem ao Leste nem ao Oeste. Não se pode pedir que se renuncie, por 250.000 coroas, aos princípios que não são unicamente nossos, mas compartilhados por todos os nossos camaradas. Foi isto que tornou tão penoso para mim tanto a atribuição do prêmio como a recusa que manifestei. Quero terminar esta declaração com uma mensagem de simpatia ao povo sueco.”

jeanpaul

 

Um passeio por Rimbaud

Era 20 de outubro de 1854 quando Vitalie Rimbaud, uma católica fervorosa, pariu seu segundo filho, o qual batizaria de Jean-Nicolas Arthur Rimbaud. O menino, que ficaria conhecido simplesmente como Arthur Rimbaud, nasceu de forma pouco poética, na cidade de Charleville, nas Ardenas francesas, mais precisamente na Rue Napoleón, número 12.

Atualmente, na cidade natal do autor de Uma temporada no inferno, há um lindo museu que leva seu nome. O Museu Rimbaud está localizado no antigo moinho de Charleville, uma bela e elegante construção erguida em 1626 e renovada em 1896 pelo arquiteto Petitfils que redistribuiu seus espaços interiores. O local apresenta a vida e o trabalho de Arthur Rimbaud através de manuscritos, objetos pessoais, fotos e documentos. Além disso, o museu também expõe o trabalho de muitos artistas que homenageiam os escritos do poeta como Fernand Léger, Jean Cocteau ou Sonia Delaunay.

RIMBAUD MUSEU CHARLEVILLE OUTRO

RIMBAUD MUSEU CHARLEVILLE COLUNA

RIMBAUD MUSEU CHARLEVILLE FOTO

Novos poemas de Bukowski

o melhor da raça

não há nada para
discutir
não há nada para
lembrar
não há nada para
esquecer

é triste
e
não é
triste

parece que a
coisa
mais sensata
que uma pessoa pode
fazer
é
sentar
com bebida na
mão
enquanto as paredes
acenam
seus sorrisos
de adeus

a gente sobrevive
a
tudo
com certa
dose de
eficiência e
bravura
e aí
se manda

alguns aceitam
a possibilidade de que
Deus
os ajude
a
superar

outros
encaram
de frente

e à saúde destes

eu bebo
esta noite.

Novo livro de poemas de Bukowski que acaba de chegar

Novo livro de poemas de Bukowski que acaba de chegar

Clique aqui para saber mais sobre “Você fica tão sozinho às vezes que até faz sentido“.

Charles Aznavour Entre Aspas e para sempre entre nós

O incansável Charles Aznavour descansou. Morreu nesta segunda-feira, 1 de outubro, aos 94 anos, em sua casa na serra das Alpilles, no sul da França. Mas mesmo com a idade avançada, o cantor continuava fazendo shows.

Nascido Chahnour Vaghinag Aznavourian, ele se tornou um dos maiores nomes da música francesa, “autor de mil canções”.

No livro “Entre Aspas – 2“, o jornalista Fernando Eichenberg conversou com Aznavour –  filho de modestos artistas de origem armênia e que foi secretário, amigo e confidente de Edith Piaf –  sobre as vezes que esteve no Brasil e, aos 90 anos (idade que tinha ao conceder a entrevista) também sobre sua relação com a morte: “A morte é mais jovem do que eu, não penso nela. Ela tem 17 anos a menos do que eu. É ela que deve ter medo de mim , não eu dela.”

Charles Aznavour foto

Leia aqui a entrevista completa (clique nas imagens para ampliá-las):

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