Patti Smith e Philip Glass homenageiam Allen Ginsberg no Edinburgh Festival

Allen Ginsberg se foi em 1997, mas sua poesia pulsante continua viva pelo mundo. Sua obra maior, o Uivo, é fonte de inspiração para o trabalho de grandes artistas da atualidade como Patti Smith e Philip Glass, que prestaram uma linda homenagem ao amigo durante o Edinburgh Festival, na Escócia. O show “The Poet Speaks”, apresentado nesta quarta, dia 14 de agosto, trouxe a poesia de Ginsberg na voz de Patti Smith com Philip Glass ao piano. Certamente, um momento inesquecível!

Patti Smith Philip Glass in Edinburgh

A história de Patti com Ginsberg tem muito a ver com o retorno da cantora aos palcos após a morte de seu marido em 1994. Ela conta que foi ele quem a estimulou a retornar. “Eu tinha deixado de me apresentar porque me apaixonei, casei e decidi viver de forma mais simples para criar nossos filhos. Quando meu marido morreu, em dezembro de 1994, eu fiquei arrasada e eu não tinha ideia de voltar a me apresentar, até que, no fim de janeiro, eu recebi uma ligação de Allen Ginsberg”, contou. Na ocasião, ele a convidava para participar de um evento beneficente. “Ele disse, basicamente, que eu deveria transformar o meu pranto em dança – deixe seu amado ir e siga a sua vida. E foi assim que eu retornei para o mundo das apresentações: através de Allen, e através da palavra falada.”

patti_ginsberg

O show no Edinburgh Festival terminou com a canção People have the power, de Patti Smith, e suas palavras finais foram: “Não se esqueçam de usar a sua voz”, dividindo com a multidão de fãs o privilégio de ter convivido com Allen Ginsberg.

Bukowski e os cavalos

Bukowski nasceu em 16 de agosto de 1920. Na foto, ele com seus pais

Bukowski nasceu em 16 de agosto de 1920. Na foto, ele com seus pais

Gelo para as águias

Sigo lembrando dos cavalos
sob o luar
sigo lembrando de

alimentar os cavalos
açúcar
pedras oblongas de açúcar
mais parecendo gelo,
e suas cabeças são como cabeças
de águias
cabeças calvas que
poderiam morder e

não mordem.

Os cavalos são mais reais que
meu pai
mais reais que Deus
e poderiam ter pisado nos meus
pés mas não pisaram
poderiam ter feito coisas horríveis
mas não fizeram.

Eu tinha quase 5 anos
mas ainda não consegui esquecer;
ó meu deus eles eram fortes e bons
as línguas vermelhas molhadas
projetadas para fora de suas almas.

Poema publicado no livro Textos autobiográficos

Balzac e o imperador

Por Voltaire Schilling*

Nas suas contumazes escapadas dos credores, Honoré de Balzac, um eterno endividado perseguido por letras vencidas, conseguiu alugar, em 1828, uma pequena e modesta vila na saída de Paris. Recorreu a um nome falso para assinar o contrato. Era um ponto estratégico situado entre o observatório e um convento, o que permitiria a ele, em caso de extrema necessidade, saltar o muro dos fundos e ganhar o campo até desaparecer. Nessa nova moradia, uma das tantas em que ele viveu, condenado àquela vida de cigano fujão, colocou sobre a caixa que guardava os seus arquivos um busto de Bonaparte.

Prometera a si mesmo, naquela ocasião, inspirando-se na impressionante aventura ensejada pelo general corso, “reconquistar a Europa com a pena de águia ou de corvo”. O que Napoleão fizera com seu exército, sebmetendo o continente inteiro à sua vontade, ele se predispôs a fazer com seus livros.

(…)

Seguramente foi o exemplo de Napoleão, um sujeito que saíra do nada, nascido do mundo, que serviu-lhe de farol e modelo. Aquela soma de audácia e vontade inquebrantável que imanara da presença do general fez com que Balzac aspirando à mesma fama, se tornasse um escritor-fábrica voltado exclusivamente para a produção de livros. Trabalhador incansável, movido a doses cavalares de café fortíssimo (combustível que o matou do coração aos 51 anos) que ele mesmo gostava de preparar, enfrentava jornadas dignas de um condenado às galés.

Do mesmo modo como o jovem tenente Bonaparte, ainda nos seus tempos de anonimato, sonhava com as pirâmides do Egito ou em reproduzir as façanhas de Alexandre o Grande ou de César, a imaginação de Balzac, que deu seus primeiros passos escrevendo literatura do tipo “B”, o empurrou para vôos cada vez mais elevados.

(…)

Uma alma imaginativa feérica e borbulhante como a de Balzac não poderia jamais deixar de inclinar sua simpatia pela figura do imperador, de deixar-se dominar por aquela força da natureza que parecia levar tudo adiante, submetendo os homens e o destino à sua vontade férrea.

(…)

Portanto, nada de se estranhar que Balzac, leitor infatigável, tenha começado a coletar desde 1830 todas as frases atribuídas a Napoleão que conseguiu encontrar nos jornais, nas revistas ou nos livros de memórias dedicadas ao imperador falecido.

(…)

* Voltaire Schilling é historiador e professor e os textos acima são trechos de “Balzac e o imperador”, introdução escrita para o livro “Napoleão, como fazer a guerra – Máximas e pensamentos de Napoleão Bonaparte recolhidos por Honoré de Balzac“.

balzacenapoleao

Passe Livre

Blog da Folha – Por Elekistão (Cassiano Elek Machado) – 14/08/13

Ninguém descreveu melhor um engarrafamento do que Julio Cortázar. No primeiro conto de “Todos los Fuegos el Fuego” (que título, não, senhoras e senhores?), o escritor franco-argentino descreve um congestionamento que dura meses, numa estrada que leva Fontainebleau a Paris. A boa nova é que o mais bonito trânsito da literatura mundial está de volta, em nova edição, a este congestionado país tropical. “A Autoestrada do Sul & Outras Histórias” (org. Sérgio Karam, tradução Heloisa Jahn, 21 tostões) é o nome de uma coletânea de contos que a editora gaúcha L&PM publica estes dias, em formato de bolso — cabe em qualquer porta-luva).

Engarrafamento com 13 mil carros de brinquedo em Madrid

Engarrafamento com 13 mil carros de brinquedo em Madrid

Escrita em 1964, “Autopista del Sur” é uma descrição minuciosa de um gigantesco  nó de carros, enlaçados sob o sol de agosto (e eu cito: “…O sol, que se punha do lado esquerdo da rodovia, derramava sobre cada automóvel uma última avalanche da geleia alaranjada que fazia ferver os metais e ofuscava a vista, sem que jamais uma copa de árvore desaparecesse completamente atrás de nós, sem que a outra sombra entrevista à distância se aproximasse a ponto de mostrar sem a menor dúvida que a massa de automóveis estava se movendo nem que fosse um pouquinho..”).

Os personagens do conto não têm nomes: cada um é tratado de acordo com o carro onde está empacado. Há o engenheiro do Peugeot 404, o homem pálido e solitário do Caravelle, os recém-casados do Volkswagen. Nas primeiras horas, cinco horas, eles avançam uns 50 metros (segundo os cálculos do engenheiro do Peugeot). Mas não muito mais nas horas e dias seguintes. E vem a fome, e a sede, o frio, o sono, as necessidades fisiológicas.

Pouco a pouco, a “sociedade” do engarrafamento vai se organizando. Um consegue água, outro, cobertores, uma das freiras à bordo do 2HP descola um sanduíche de presunto, enquanto o Ford Mercury e o Porsche traficam mantimentos. Motoristas se conhecem, se apaixonam, alguns até morrem.  E eis que, de golpe, do mesmo modo fantástico como havia se formado, a enorme maçaroca de carros começa a se mover.  E então…

“…todos corriam a 80 km/h na direção das luzes que cresciam pouco a pouco, já sem que se soubesse direito para que tanta pressa, para que tanta correria na noite entre carros desconhecidos onde ninguém sabia nada dos outros”

O jovem Cortázar, preparando-se para encarar um engarrafamento

O jovem Cortázar, preparando-se para encarar um engarrafamento

Numa entrevista dada muitos anos depois sobre o conto, Cortázar (1914-1984) contou a origem (e sua leitura crítica) da história.

“Estava na Itália e li um ensaio que afirmava que os trânsitos não tinham nenhuma importância: me pareceu superficial e frívolo dizer isso. Os engarrafamento são um dos signos mais negativos desta triste sociedade em que vivemos, que provam a contradição com a vida humana, a busca pela desgraça, a infelicidade, a exasperação através da grande maravilha tecnológica que é o automóvel. Ele deveria nos dar a liberdade e está nos trazendo as piores consequências. Nunca havia estado num congestionamento quando escrevi o conto. É curioso que alguns meses depois de ter escrito a história passei por isso. Estive durante cinco horas numa estrada de uma província francesa num engarrafamento. Descobri com surpresa e com uma sensação de fatalidade que o começo do conto se repete quando você está num verdadeiro congestionamento. Você desce do carro, pede um cigarro para o motorista ao lado, blasfema contra a prefeitura, os automóveis e tudo o mais. E logo há um momento em que começa muito calor e começam os problemas físicos, e vem uma senhora e pede água, porque uma criança está chorando. Foi uma experiência impressionante me ver dentro de meu próprio conto..” 

Soa bastante familiar, não?

P.s. Em agosto de 2010, o conto de Cortázar se materializou numa estrada chinesa, a via que liga Pequim ao Tibete. Um engarrafamento ao longo de 100 quilômetros da rota demorou 11 dias para ser desbaratado. Leia aqui bom texto do escritor espanhol Vicente Verdú sobre o episódio. 

P.s.2  Além de ter exibido sua destreza no congestionamento, Cortázar teve ótima performance em alta velocidade. Em parceria com Carol Dunlop, com quem era casado, ele escreveu no início dos anos 1980 o maravilhoso “Os Autonautas da Cosmopista”, relatando uma viagem pela estrada, de Paris a Marselha. Está esgotado há um par de décadas no Brasil. 

P.s. 3 O livro “A Autoestrada do Sul & Outras Histórias” inclui, pasmem, outras histórias. Entre elas, está a joia “O Perseguidor”, inspirada no saxofonista Charlie Parker, um dos favoritos de Cortázar, ao som de quem estas anotações foram escritas.

Novo filme de Simon’s Cat já tem quase 3 milhões de visualizações

Não resta a menor dúvida: Simon’s Cat é mesmo o mais famoso gato da internet. Seu novo vídeo, “Suitcase”, foi publicado no Youtube no dia 2 de agosto de 2013 e já alcança quase 3 milhões de visualizações.

Simon’s Cat também é publicado em livros pela L&PM Editores. Clique aqui e conheça os títulos.

Os 700 anos de Boccaccio na Unicamp

No ano em que o mundo literário celebra os 700 anos do nascimento do autor de Decameron, a UNICAMP promove um evento internacional sobre Giovanni Boccaccio nos dias 14 e 15 de agosto. Entre os participantes estão Ivone Benedetti, a tradutora da edição do Decameron que a L&PM vai lançar em setembro, e o autor do prefácio, Carlos Berriel, que também faz parte do Comitê de Organização. A programação completa do evento está no site www.giovanniboccaccio700.blogspot.com.br

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Giovanni Boccaccio pelo gravurista italiano Raffaello Sanzio Morghen

A rejeitada Jane Austen

(…) Entre 1795 e 1798, Jane Austen começou a redigir seus primeiros romances: Elinor and Marianne (que seria depois Razão e sentimento), First Impressions (Orgulho e preconceito) e Susan (A abadia de Northanger). Os originais circulavam apenas no âmbito familiar, mas o reverendo Austen, com sua acuidade crítica, achou que a filha era de fato uma escritora digna de ser publicada. Em novembro de 1797, escreveu a seguinte carta ao editor londrino George Cadell:

Prezado Senhor,
Tenho em minha posse o manuscrito de um romance, compreendendo três volumes com a extensão aproximada da Eveline, da srta. Burnay. Por estar perfeitamente cônscio do significado que teria uma obra desse gênero se lançada por um editor de respeito é que me dirijo ao senhor. Ficaria, portanto, muito agradecido se o senhor me informasse, caso esteja interessado nela, quais seriam os custos de publicação a expensas do autor, e qual seria o adiantamento que o senhor estaria propenso a pagar por sua aquisição, na hipótese de vir a ser ela aceita. Caso o senhor demonstre algum interesse, estarei pronto a lhe enviar a obra. De seu humilde servidor,
George Austen.

O Sr. Cadell, ao rejeitar a oferta, não imaginava que seu nome ficaria perpetuado na história literária como o editor que recusou Orgulho e preconceito!

(Trecho de “A abadia de Northanger ou a rejeitada Susan”, texto de apresentação de Ivo Barroso que também está em Jane Austen – Obras escolhidas, L&PM Série Ouro)

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O guia da felicidade do Dr. Lucchese

O Caderno Vida do Jornal Zero Hora, de 10 de agosto, dedicou uma página inteira ao livro Não sou feliz, do Dr. Fernando Lucchese. Na matéria, Lucchese conta em entrevista que as pessoas são programadas para ser felizes, mas que o ser humano é o pior inimigo de si mesmo. Clique sobre a imagem e leia na íntegra:

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Clique na imagem para ampliá-la

A invenção do amor por Sergius Gonzaga

O amor na literatura é o tema do curso que será ministrado pelo professor Sergius Gonzaga ao longo do mês de agosto na Casa de Ideias, em Porto Alegre. Serão 3 encontros + uma palestra-bônus em que o professor do Instituto de Letras da UFRGS analisa textos clássicos de Goethe, Flaubert, Dostoiévski, F. Scott Fitzgerald, Machado de Assis e outros grande autores de acordo com o cronograma a seguir:

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(clique na imagem para ampliar)

Mais informações e inscrições pelo telefone (51) 3018 7740 ou contato@casadeideias.com

A arte de Jean-Michel Basquiat

O artista Jean-Michel Basquiat morreu jovem, com apenas 27 anos, no dia 12 de agosto de 1988, mas produziu o suficiente para entrar para a história da arte moderna como um dos ícones da pop art ao lado de Andy Warhol. Eles se conheceram em 1982, em Nova York, e Warhol registrou o momento em seus diários:

Segunda-feira, 4 de outubro, 1982. Fui encontrar Bruno Bischofberger. Veio com Jean-Michel Basquiat. É o garoto que usava o nome “Samo” quando sentava na calçada do Greenwich Village e pintava camisetas, e de vez em quando eu dava $10 para ele e o mandava ao Serendipity para tentar vendê-las. Era apenas um daqueles garotos que me enlouqueciam. É negro, mas algumas pessoas dizem que é porto-riquenho, ai sei lá. E então Bruno o descobriu e agora ele está com a vida ganha. Tem um estúdio ótimo na Christie Street. É um garoto de classe média do Brooklyn – quer dizer, foi à universidade e essas coisas – e ficou tentando ser daquele jeito, pintando em Greenwich Village.

Então almocei com eles e aí tirei uma polaroid e ele foi pra casa, duas horas depois mandou uma pintura, ainda molhada, dele e de mim juntos. E, quer dizer, só chegar até Christie Street deve ter levado uma hora. Me disse que foi o assistente quem pintou.

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“Dos cabezas” (1982) de Jean Michel Basquiat

No registro do dia seguinte, 5 de outubro, ele diz:

(…) E esqueci de acrescentar que um dia antes Jean-Michel Basquiat meteu a mão no bolso e disse que me pagaria os $40 que me devia do tempo em que pintava camisetas e pedia dinheiro emprestado para mim e eu disse ah, não, está bem, fiquei constrangido – fiquei surpreso de só ter dado isso pra ele, achei que tivesse dado mais.

Bruno Bischofberger with Andy Warhol, Jean-Michel Basquiat and Francesco Clemente, New York 1984

Andy Warhol, Jean-Michel Basquiat, Bruno Bischofberger e Francesco Clemente (Nova York, 1984)

Jean-Michel Basquiat nasceu no Brooklyn, em 1960, mas sua família veio de Porto Rico e do Haiti. Conhecendo bem a vida nos subúrbios e os problemas a ele inerentes, como o racismo, a imigração e a exclusão social, Basquiat tornou-se um símbolo dos desenhos urbanos nos anos 80. Começou a se destacar em NY com os grafites que fazia com a sigla SAMO (“Same Old Shit”). Interessado em hip-hop, jazz, basebol e boxe, mas também em poesia francesa, Leonardo Da Vinci e arte modernista, ele começou cedo na pintura, comunicando com clareza e urgência a sua própria experiência de vida com um quê neo-expressionista. Suas criações são uma combinação de símbolos, escrita e cores encontradas fora da “normalidade”: são as cores da cidade, das ruas e do mundo em que viveu.

A vida de Basquiat virou filme sob a direção do amigo e contemporâneo Julian Schnabel e é citado inúmeras vezes no vol. 2 dos Diários de Andy Warhol da Coleção L&PM Pocket.