Novo filme de Woody Allen estreia em junho

A revista francesa Première divulgou hoje novas imagens do filme Midnight in Paris, de Woody Allen, que vai abrir o Festival de Cannes em maio e tem estreia no Brasil prevista para junho. Quem também faz sua estreia no cinema é a primeira-dama da França, Carla Bruni-Sarkozy, no papel de guia turística do Museu Rodin, em Paris.

Carla Bruni e Woody Allen nas filmagens de "Midnight in Paris"

Sempre cheio de referências e intertextualidades, Woody Allen não faz diferente em Midnight in Paris. No cartaz do filme, divulgado na semana passada, o cenário da Cidade-Luz se mistura à tela Noite estrelada, de Vincent Van Gogh.

Enquanto espera o filme estrear no Brasil, vá preparando o humor e dê boas boas risadas com os livros de Woody Allen publicados pela L&PM e veja o trailer:

21. Nós e o SNI (Serviço Nacional de Informações)

Por Ivan Pinheiro Machado*

O Luis Claúdio Cunha, combativo jornalista e autor do clássico “Operação condor: o sequestro dos uruguaios” (L&PM, 2009) me alertou no ano passado (2010) que a Casa Civil da Presidência da República estava disponibilizando, para qualquer cidadão brasileiro, sua ficha (se houvesse) junto aos órgãos de segurança durante o período da Ditadura Militar (1964-1985). Embora eu jamais tenha me considerado um perigoso subversivo, por curiosidade, solicitei formalmente ao Gabinete da Presidência da República a minha “folha corrida” nos órgãos de segurança e repressão da ditadura militar..

Sinceramente, achava que receberia uma resposta tipo “nada consta”. Eis que, poucos dias depois, aterrissou na minha mesa um envelope pardo enviado por Sedex, cujo remetente era “Casa Civil da Presidência da República”, com brasão e tudo. Abri o envelope. Havia termos de responsabilidade, confidencialidade, etc, e um aviso dizendo que aquilo era um resumo de cada registro em meu nome, junto ao Serviço Nacional de Informações (SNI), no período entre 1974 e 1985. Caso eu desejasse as informações detalhadas, teria de fazer nova solicitação. As informações resumidas, com o número de cada “ocorrência”, compreendiam umas dez páginas, com mais de 30 registros. Muitas delas me ligavam ao meu pai e ao Paulo Lima, meu sócio até hoje, e ao jornalista Mario Lima, pai do Paulo, todos nós descritos como perigosos subversivos. Registravam os livros ditos “perigosos para o regime” que lançávamos e incluía como fato altamente subversivo, uma jornalzinho de humor, o “Risco”, que editávamos no início da década de 80. Há registros tais como “Ivan Gomes Pinheiro Machado chegou em Frankfurt, Alemanha, em 14 de outubro de 1976. Em 18 de outubro já estava em Londres, Inglaterra, hospedado na casa de Douglas Aguiar… Em seguida foi para Lisboa onde participou de reuniões com grupos de exilados e elementos anti-regime liderados por Josué Guimarães, Fernando Gasparian…” e por aí vai.  Havia menções  também a conversas com o “perigoso subversivo Flavio Koutzii, recém chegado da Argentina”. Os registros do SNI descreviam minuciosamente os nossos passos quando ciceroneamos em Porto Alegre Luis Carlos Prestes, na sua volta do exílio. Prestes era amigo e antigo companheiro de partido do meu pai. Enfim, havia nos resumos cifrados, numerados e carimbados, outros detalhes da minha vida na década de 70 de que eu até já havia esquecido. Li atentamente tudo aquilo e fiquei pensando, pensando. A gente era permanentemente espionado e não sabia. Ou melhor, suspeitávamos que éramos espionados, mas isto sempre se punha na conta da paranóia geral daqueles tempos. “Cuidado com o telefone!”, ou “Não fala alto que o fulano é do DOPS…”. Por outro lado, ingenuamente, não nos achávamos importantes para os órgãos de informação. Quando houve a primeira apreensão de livros por motivos políticos, nos demos conta de que nossa atividade era de risco; aqueles que faziam livros, para uma ditadura, eram mais perigosos do que os criminosos comuns.

Charge de Santiago que está no livro “Retroscópio” (L&PM, 2010)

Lembro até de uma frase do Millôr Fernandes, sobre aqueles tempos sombrios: “Nós temos muita importância para sermos presos e nenhuma importância para sermos soltos…”. Era bem isso. Hoje se vê; quanto dinheiro eles gastavam para espionar os cidadãos! Estabelecer conexões para xeretear a viagem de um menino de 23 anos em Frankfurt, Londres, Lisboa! Os documentos oficiais que me chegaram às mãos comprovam como uma ditadura é burra, insensível e dispendiosa. Deu pra ver que tínhamos, sim, razões para ter medo. E deu também para chegar a uma melancólica conclusão sobre a natureza humana. Há, nestas dezenas de folhas que eu recebi da Casa Civil, informações quase íntimas, que faz supor que o inimigo/informante, se não estava ao lado, estava muito próximo e muitas vezes, quem sabe, sentado na nossa mesa no bar…

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Os relógios derretidos de Salvador Dalí

Quando se fala em Salvador Dalí, a imagem que logo vem à mente é a do quadro A persistência da Memória. Muitos podem até não saber o título da obra, mas logo identificam os relógios derretidos, metáfora para a liquidez do tempo. A obra é um ícone da escola surrealista, que tem Dalí como um de seus principais representantes.

Mas surreal mesmo é a imagem abaixo. Pode esfregar os olhos à vontade, mas é isso mesmo: o “melting clock” retratado por Dalí em seu quadro surrealista virou realidade!

A peça foi projetada para ficar apoiada na borda de um móvel plano e dá a impressão de que vai escorregar e cair a qualquer momento. Se você é um apaixonado pela obra do pintor espanhol, vai dar pulos de alegria ao descobrir que o relógio está à venda na Amazon por um preço bem acessível.

Já quem não vê emoção em ter um relógio escorrendo da borda de sua mesa, vale ler o Libelo contra a arte moderna, da série L&PM Pocket Plus, para conhecer melhor o gênio de Salvador Dalí e, quem sabe, se apaixonar por sua obra também 🙂

via zupi

“Os magnatas” e a crise de 2008 nos EUA

No filme Trabalho interno, vencedor do Oscar de Melhor Documentário em 2011, o escritor Charles Morris, autor de Os magnatas, é um dos especialistas que tentam explicar o crash de 2008 nos Estados Unidos. O documentário narrado por Matt Damon revela detalhes sórdidos da crise que abalou a maior economia do mundo, causando um prejuízo estimado em mais de 20 trilhões de dólares.

Em sua participação no filme, fica evidente que Charles Morris tem uma visão privilegiada da história, pois para entender o presente, há de se conhecer o passado.  Em Os magnatas, escrito em 2005 (anos antes da crise), ele joga luz sobre os quatro homens por trás do exuberante crescimento econômico que fez dos Estados Unidos o país mais rico, mais criativo e mais produtivo do mundo. Andrew Carnegie (1835-1919), John D. Rockefeller (1839-1937), Jay Gould (1836-1892) e J.P. Morgan (1837-1913) combinavam inteligência, ambição e determinação e, segundo Morris, foram os responsáveis pela criação da supereconomia americana.

Veja um pequeno trecho do documentário (em inglês):

O livro Os magnatas foi publicado na Coleção L&PM Pocket em 2009.

Marilyn Monroe na intimidade

Marilyn Monroe era objeto de desejo. Mas quais os objetos de desejo de Marilyn Monroe? Roupas, sapatos, óculos, bolsas, carteiras, jóias, perfumes, maquiagem… Muito brilho, muito dourado. No recém lançado Marilyn Monroe, da Série Biografias L&PM, você vai conhecer melhor a menina, a jovem e a mulher que foram donas dos objetos abaixo.

A canequinha da pequena Norma Jeane, no tempo em que ainda vivia com a mãe, Gladys:

O batom da jovem Norma foi guardado como relíquia por Beebe Goddard, filha de Grace Goddard, com quem Marilyn morou na adolescência:

Era aqui que a diva guardava seus cigarros, uma cigarreira em marfim com dois filetes de ouro:

Os copos usados no ritual de casamento  judaico que uniu Marilyn a Arthur Miller:

Carteira para noite, toda em ouro, também com as iniciais MM:

Eu e Jack Kerouac em Buenos Aires

Por Paula Taitelbaum

Buenos Aires é o reino encantado das livrarias e dos cafés. Uma e outro convivem como que em um casamento, misturando seus aromas e texturas: em toda livraria há sempre um café. E em todo café há sempre alguém lendo um livro. Já estive incontáveis vezes na capital portenha e, mesmo assim, ela sempre é capaz de me oferecer uma livraria desconhecida. Foi o que aconteceu neste último final de semana. Caminhando pela Calle Honduras, em Pallermo Hollywood, fui atraída primeiro pelo letreiro e depois pela vitrine de “Libros Eterna Cadência”.  Chegando perto,  meus olhos encontraram-se com um velho amigo: Jack Kerouac.

Ali estava ele, amarelo esverdeado (ou seria verde amarelado?), deitado do outro lado do vidro. Mas o que mais chamava a atenção era uma palavra impressa na capa: “Poesía”. Entrei e fui direto pedir para ver o livro. O dono precisou pegar o exemplar da vitrine, já que era o único que o estabelecimento oferecia. Informou-me também que era raro encontrá-lo e que aquele tinha vindo da Espanha, uma edição bilíngüe da Bartleby Editores. E ali fiquei eu, emocionada, com os Haikais de Kerouac nas mãos. Nunca tinha lido nenhum – e não consegui mais parar de ler. Os pequenos poemas em três versos trazem imagens que, obviamente, em algum momento, estiveram no campo de visão de Kerouac. Folhas caídas no parque, um barco ao longe, a bruma dos bosques, uma sopa sobre a mesa, um campo de beisebol. Tudo foi capaz de virar um pequeno poema sob a pena do autor de On the Road. O “Libro de jaikus”, tradução espanhola para o original “Book of Haikus”, traz mais de 500 Haikais. Comprei o livro, trouxe para a editora. Quem sabe um dia ele não saia por aqui e se junte aos tantos Kerouacs que temos?

Literatura e café: na cafeteria da Eterna Cadência, os livros fazem parte da decoração

E pra dar um gostinho do conteúdo que tenho nas mãos, seguem dois Haikais de Jack (tomei a liberdade de traduzir):

First December cold                                                         

wave  – not even                                                       

One cricket  

Dezembro, primeiro frio 

em ondas  –  não anda              

Nenhum grilo

 

No telegram today 

Only more                                                                                         

Leaves fell      

Hoje nenhum telegrama

– Só mais   

Folhas caídas na grama

20. O “cara” (ou o chato) do Balzac

Por Ivan Pinheiro Machado*

Um dia, estava numa livraria num Shopping em Porto Alegre e uma senhora de uns 60 anos, especialmente bem vestida, aproximou-se, pediu licença e perguntou com uma informalidade em nada condizente com sua sóbria vestimenta e sua idade: “O senhor é o “cara” do Balzac?”. Rindo, respondi alguma coisa e fui saindo… A verdade é que a senhora tinha razão. Por curiosas razões, acabei me transformando em uma espécie de “amador aprofundado” na vida e obra de Honoré de Balzac. Vou contar como e porque aconteceu isso:

Em 2004, dentro do projeto editorial da Coleção L&PM POCKET decidimos publicar as principais histórias da Comédia Humana já que, há muito tempo, ela não se encontrava nas livrarias os romances de Balzac. As 100 histórias (novelas, romances e contos) que compõem a Comédia Humana foram editadas no Brasil pela editora Globo na década de 1940 numa edição capitaneada por Paulo Rónai. Na década de 1980, houve uma reedição dos 17 volumes da Comédia Humana. Logo esgotaram-se os exemplares e nunca mais se ouviu falar dos romances do Balzac. Nas livrarias, só eram encontrados volumes dispersos e geralmente os factuais, livros que ele escreveu sobre a imprensa, “teoria do andar” e alguns ensaios sobre comportamento e política. Ilusões Perdidas, Pai Goriot, Esplendores e misérias das cortesãs, o célebre Mulher de 30 anos, O lírio do Vale, Pele de Onagro, só para citar alguns, apenas eram encontrados em sebos e olhe lá! Pois nós decidimos recolocar o grande Honoré nas livrarias. Mais precisamente na nossa coleção de bolso e em novas traduções feitas pelos melhores tradutores disponíveis no mercado editorial. Pois por melhor que fossem as traduções da edição da Globo, eram traduções datadas. O que, aliás, era normal, já tinham sido feitas na década de 1940.

Uma vez tomada a resolução, por onde começar? Primeiro, tentamos um contato com a Globo. Quem sabe comprar as traduções e revisá-las? Fomos informados de que era impossível negociar ou republicar a “Comédia” devido a questões jurídicas. Pensei em consultar algum especialista que pudesse me dar um roteiro de publicação, uma ordem de importância. Perguntei em Porto Alegre, São Paulo, Rio… e nada. Poucos nomes me foram sugeridos, todos indisponíveis. Tentei nas universidades, fui atrás de “balzaquistas”, mas acabei dando sempre com a cara na porta. Foi então que – na falta dos especialistas, resolvi eu mesmo, exercendo meu ofício de editor, mergulhar no mundo impressionante do inventor do romance moderno. Ou seja, resolvi abraçar Balzac. E me pus a ler. Compramos aqui na editora uma edição da Plêiade, da Gallimard, para ter o Balzac no original e nos sebos, reunimos a edição dos 17 volumes da Globo, capa dura, da década de 1950. E me pus a ler, ler, ler, quase pirei. Saí atrás de textos sobre Balzac. Procurei raridades em Paris, o livro de Teophile Gautier, o ensaio de Baudelaire, o livro de Alain, a biografia escrita por Stefan Zweig, a escrita por Maurois, outras mais, enfim, viajei. Foram cerca de 40 romances e novelas, uns 15 contos do Balzac e mais uns 20 livros sobre ele, além de meia dúzia de biografias. Quase virei um chato.

Um dia, num evento literário na Livraria Cultura em Porto Alegre, promovido pela Aliança Francesa, fui convidado a falar sobre Balzac. Era eu e o professor Voltaire Schilling, um homem de vasto saber. Cada um tinha um tempo determinado para falar. O prefessor Voltaire fez uma bela explanação sobre a relação entre Balzac e Paris. Falou uns trinta minutos e me passou a bola. Fiz um perfil biográfico rápido de Balzac, citei seus livros principais e – como curiosidade – falei sobre a “diversidade sexual” em Balzac, ou seja, vários de seus livros contemplam todas as tribos, da homossexualidade masculina, feminina, viciados em sexo, polígamos, cortesãs insaciáveis e até zoofilia. Enfim, comecei a contar histórias, passagens, falar sobre a Comédia Humana, seus personagens que se entrecruzam, e fui falando, falando, até que o francês da Aliança Francesa, sentado entre eu e o professor Voltaire (que tinha colocado na minha frente vários papeizinhos, que eu nem notei) agarrou-se no meu braço e sussurou no meu ouvido: “Chega!”. Eu, espantado, interrompi em meio à frase em que eu falava dos estonteantes atributos físicos da Condessa de Langeais… Ele me tomou o microfone e disse. “Muito obrrrrigado a todos! Assim encerramos nosso ciclo sobrrrrre Balzac”.  Em tempo: os tais papeizinhos que eu não li, diziam o seguinte: “Faltam dois minutos”, outro dizia “Um minuto” e outro “Tempo encerrado, faça a conclusão”…

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Marilyn e os monstros

Cabelos curtos, dourados e bem ordenados, sombra colorida e boca bem delineada. Basta bater os olhos para reconhecer, pois Marilyn Monroe é pop. Inspirado nos quadros que Andy Wahrol fez com a imagem da grande estrela de Hollywood, o artista americano Jesse Lenz conservou a cabeleira loira e a make-up da diva para criar a série Monsters and Marilyns.

Nestas obras, Lenz coloca dentro do contorno da figura de Marilyn os rostos de personagens marcantes e contraditórios (reais ou não) como Hitler, Marx, Fidel Castro e Jack, o personagem de Jack Nicholson no filme O iluminado:

Jack, Hitler, Fidel Castro e Marx por Jesse Lenz

A pergunta que Jesse Lenz quer trazer à público é: será a arte capaz de manipular a mentalidade social?

Se quiser pensar um pouco mais antes de responder, veja as outras peças da galeria de Monsters and Marilyns no Flickr do artista. E para quem quiser conhecer melhor a musa que inspirou Andy Warhol, Jesse Lenz e inúmeros artistas, Marilyn Monroe acaba de chegar à Série Biografias. Leitura recomendadíssima!

O “Dia Mundial da Poesia” e das flores

O Dia Mundial da Poesia é também o primeiro dia da primavera no hemisfério norte. “O tempo da flor” – como é conhecida a estação mais colorida do ano – é perfeito para localizar a poesia amorosa. Já no século XI, na França, os poetas obedeciam estritamente à convenção de guardar suas odes amorosas para esta época do ano. Em língua portuguesa, há registros desta tradição deixados pelo rei-poeta D. Denis, que viveu no século XIII. Num diálogo entre duas jovens, uma delas apela para as flores novas de um pinheiro para saber notícias de seu amado.

A escolha do dia 21 de março como o Dia Mundial da Poesia não é, portanto, mera coincidência. Na obra da poeta portuguesa Florbela Espanca – que tem flor até no nome! – as flores são presença constante, como no soneto “Crisântemos”:

Sombrios mensageiros das violetas,
De longas e revoltas cabeleiras;
Brancos, sois o casto olhar das virgens
Pálidas que ao luar, sonham nas eiras.

Vermelhos, gargalhadas triunfantes,
Lábios quentes de sonhos e desejos,
Carícias sensuais d´amor e gozo;
Crisântemos de sangue, vós sois beijos!

Os amarelos riem amarguras,
Os roxos dizem prantos e torturas,
Há-os também cor de fogo, sensuais…

Eu amo os crisântemos misteriosos
Por serem lindos, tristes e mimosos,
Por ser a flor de que tu gostas mais!

Fernando Pessoa também canta as flores em seus poemas, sob o pseudônimo de Álvaro de Campos:

Dá-me lírios, lírios,
E rosas também.
Mas se não tem lírios
Nem rosas a dar-me,

Tem vontade ao menos
De me dar os lírios
E também as rosas.
Basta-me a vontade,
Que tens, se a tiveres,
De me dar os lírios
E as rosas também,
E terei os lírios –

Os melhores lírios –
E as melhores rosas
Sem receber nada,
A não ser a prenda
Da tua vontade
De me dares lírios
E rosas também.

Enquanto os poetas do lado de lá do globo gozam a chegada da primavera, do lado de cá, damos as boas vindas ao outono. Pablo Neruda, poeta chileno, faz as honras da estação em seu Livro das perguntas:

XLVII

Ouves em meio do outono
detonações amarelas

Por que razão ou sem razão
chora a chuva sua alegria?

Que pássaros ditam a ordem
da bandada quando voa?

De que suspende o beija-flor
sua simetria deslumbrante?

XLVIII

São os seus das sereias
os redondos caracóis?

Ou são ondas petrificadas
ou jogo imóvel de espuma?

Não se incendiou a pradaria
com os vagalumes selvagens?

Os cabeleireiros do outono
despentearam os crisântemos?

Para marcar o Dia da Imigração Judaica

“Havia guerra na Europa, mas a hora era de calma no Bom Fim. Os grandes negros da Colônia Africana ainda dormiam, ressonando forte e cheirando a cachaça. Três mulatas dormiam dilatando as narinas com volúpia. As gordas avós judias dormiam, os pálidos judeuzinhos dormiam, de boca aberta e respiração ruidosa por causa das adenóides. As mães judias dormiam seu sono leve e intranqüilo. Os pais judeus dormiam; logo acordariam e iriam, bocejando, acender os fogões de lenha, tossindo e lacrimejando quando as achas úmidas começassem a desprender fumaça.” (Moacyr Scliar em “A guerra no Bom Fim”)

Se há um escritor brasileiro que retratou a comunidade judaica no Brasil, ele é o saudoso Moacyr Scliar. Lembramos dele porque hoje, 18 de março, é o Dia Nacional da Imigração Judaica. E para marcar a data, aqui vão outros trechos de escritores judeus que a casa oferece. Além de Woody Allen, Allen Ginsberg e Franz Kafka, ainda há Isaac Singer, Freud e muitos outros.

“E, como se seu Q. I. já não o isolasse bastante, sofria injustiças e perseguições por causa de sua religião, principalmente vindas de seus pais. É verdade que tanto seu pai quanto sua mãe frequentavam a sinagoga, mas não conseguiam admitir a ideia de que o filho fosse judeu. ‘Como foi acontecer isto?’ perguntava seu pai, indignado. Minha cara não mente, pensava Weinstein todo dia ao barbear-se. Tinha sido confundido várias vezes com Robert Redford, mas sempre por um cego. E havia também Feinglass, outro amigo de infância.”

“Por que nego o maná para os outros? / Porque o nego para mim. / Por que me neguei para mim mesmo? / Quem mais me rejeitou? / Agora acredito que você seja adorável, minha alma, alma de Allen, Allen – e você tão amada, tão doce, tão lembrada na sua verdadeira amabilidade, / seu Allen original nu respirando / alguma vez você voltará a negar alguém? / Querido Walter, obrigado pelo seu recado / Proíbo-o de deixar de tocar-me, homem a homem / Autêntico Americano / Bombardeios rasgam o céu (…)

“Tudo isso não era, por certo, um fenômeno isolado, as coisas se passavam de maneira semelhante em grande parte dessa geração de transição judaica, que emigrou do campo para as cidades ainda relativamente religiosa; acontecia espontaneamente, apenas acrescentava à nossa relação, à qual já não faltavam agudezas, mais uma bem dolorosa. Por outro lado também aqui tu deves, do mesmo modo que eu, acreditar em tua ausência de culpa…”