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Fernando Pessoa e a Revista Orpheu

O famoso retrato de Fernando Pessoa sentado à mesa, escrevendo e tomando café, com um exemplar da revista Orpheu em exibição foi feito em 1954 pelo artista português Almada Negreiros.

Fernando Pessoa

Artista multidisciplinar, Negreiros foi pintor, escritor, poeta, ensaísta, dramaturgo e romancista. Ele e Fernando Pessoa se conheceram por volta de 1915, quando ambos faziam parte da equipe de colaboradores da Revista Orpheu, que lançou seu primeiro número em janeiro daquele ano e ficou conhecida por ter inaugurado o movimento modernista na literatura portuguesa. Como toda atividade de vanguarda, foi ferozmente atacado pela crítica da época, que contestava e ridicularizava seus participantes, entre eles o próprio Fernando Pessoa, o jovem poeta António Ferro e os veteranos Mário de Sá-Carneiro, Luiz de Montalvôr e Ronald de Carvalho (responsável pela distribuição da revista no Brasil).

Capa da primeira edição da revista Orpheu, de 1915.

No entanto, ao invés de intimidá-los, o escândalo provocado pela primeira edição só alimentou a sede de provocação de seus autores, que no número seguinte revelaram nomes como Santa-Rita Pintor, artista plástico “futurista” e polêmico, e Ângelo de Lima, poeta marginal com histórico de internações em manicômios.

Apesar de todo o empenho, a Revista Orpheu durou apenas dois volumes. Em julho de 1915, António Ferro anunciou seu afastamento devido a divergências políticas com Fernando Pessoa e, no ano seguinte, Mário de Sá-Carneiro e Santa-Rita Pintor morreram, deixando Fernando Pessoa sozinho na produção do terceiro volume, que, infelizmente, nunca saiu. Apenas doze anos depois, a Orpheu foi resgatada nas páginas da Revista Presença, publicada em Coimbra de 1927 a 1940 pela chamada “segunda geração modernista”.

Mas, convenhamos, hoje não há mais motivos para lamentar, pois boa parte do legado poético de Fernando Pessoa e seus heterônimos está na Coleção L&PM Pocket.

Fernando Pessoa e o Tejo

O rio Tejo, que corta Portugal de oeste a leste, é personagem típico na literatura feita no país. Nos versos de Fernando Pessoa, um de seus poetas mais ilustres, não seria diferente. Ouça a seguir o poema O rio da minha aldeia, do livro Poesias (Coleção L&PM Pocket), interpretado por Tom Jobim no CD Música em Pessoa, lançado em 1985, por ocasião dos 50 anos da morte do poeta português.

O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.

O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que veem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.

O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal
Toda a gente sabe disso
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai
E donde ele vem.
E por isso, porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.

Pelo Tejo vai-se para o Mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia.

O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.

Conheça os livros de Fernando Pessoa e seus heterônimos na Coleção L&PM Pocket.

Os rascunhos de Pessoa

Escrever à mão, rabiscar páginas, riscar palavras, colecionar cadernos. Difícil encontrar um grande poeta que não tenha passado por isso. Aqui, por exemplo, é possível ver um rascunho de Fernando Pessoa para o poema que abre o livro “O guardador de rebanhos”, que ele escreveu entre 1911 e 1912 e que está no livro Poemas de Alberto Caeiro, Coleção L&PM POCKET. Os que têm olhos de lince (ou um bom computador), talvez consigam ver algumas palavras que Pessoa alterou como a troca de “Pertence” por “Conhece” no início do quarto verso. Embaixo da imagem, você pode ler a primeira parte deste poema sem precisar fazer tanto esforço.

I.

Eu nunca guardei rebanhos,

Mas é como se os guardasse.

Minha alma é como um pastor,

Conhece o vento e o sol

E anda pela mão das Estações

A seguir e a olhar.

Toda a paz da Natureza sem gente

Vem sentar-se a meu lado.

Mas eu fico triste como um pôr-do-sol

Para a nossa imaginação,

Quando esfria no fundo da planície

E se sente a noite entrada

Como uma borboleta pela janela.

Mãe de escritor só tem uma

No clima do Dia das Mães, aí vai uma homenagem a mulheres sem as quais algumas das pessoas mais admiráveis do mundo não existiriam: 

Gabrielle, mãe de Jack Kerouac

Clara, mãe de Agatha Christie

Amalie, mãe de Freud

Jane, mãe de Mark Twain

Clélia, mãe de Castro Alves

Maria Magdalena, mãe de Fernando Pessoa

Katharina, mãe de Charles Bukowski

O “Dia Mundial da Poesia” e das flores

O Dia Mundial da Poesia é também o primeiro dia da primavera no hemisfério norte. “O tempo da flor” – como é conhecida a estação mais colorida do ano – é perfeito para localizar a poesia amorosa. Já no século XI, na França, os poetas obedeciam estritamente à convenção de guardar suas odes amorosas para esta época do ano. Em língua portuguesa, há registros desta tradição deixados pelo rei-poeta D. Denis, que viveu no século XIII. Num diálogo entre duas jovens, uma delas apela para as flores novas de um pinheiro para saber notícias de seu amado.

A escolha do dia 21 de março como o Dia Mundial da Poesia não é, portanto, mera coincidência. Na obra da poeta portuguesa Florbela Espanca – que tem flor até no nome! – as flores são presença constante, como no soneto “Crisântemos”:

Sombrios mensageiros das violetas,
De longas e revoltas cabeleiras;
Brancos, sois o casto olhar das virgens
Pálidas que ao luar, sonham nas eiras.

Vermelhos, gargalhadas triunfantes,
Lábios quentes de sonhos e desejos,
Carícias sensuais d´amor e gozo;
Crisântemos de sangue, vós sois beijos!

Os amarelos riem amarguras,
Os roxos dizem prantos e torturas,
Há-os também cor de fogo, sensuais…

Eu amo os crisântemos misteriosos
Por serem lindos, tristes e mimosos,
Por ser a flor de que tu gostas mais!

Fernando Pessoa também canta as flores em seus poemas, sob o pseudônimo de Álvaro de Campos:

Dá-me lírios, lírios,
E rosas também.
Mas se não tem lírios
Nem rosas a dar-me,

Tem vontade ao menos
De me dar os lírios
E também as rosas.
Basta-me a vontade,
Que tens, se a tiveres,
De me dar os lírios
E as rosas também,
E terei os lírios –

Os melhores lírios –
E as melhores rosas
Sem receber nada,
A não ser a prenda
Da tua vontade
De me dares lírios
E rosas também.

Enquanto os poetas do lado de lá do globo gozam a chegada da primavera, do lado de cá, damos as boas vindas ao outono. Pablo Neruda, poeta chileno, faz as honras da estação em seu Livro das perguntas:

XLVII

Ouves em meio do outono
detonações amarelas

Por que razão ou sem razão
chora a chuva sua alegria?

Que pássaros ditam a ordem
da bandada quando voa?

De que suspende o beija-flor
sua simetria deslumbrante?

XLVIII

São os seus das sereias
os redondos caracóis?

Ou são ondas petrificadas
ou jogo imóvel de espuma?

Não se incendiou a pradaria
com os vagalumes selvagens?

Os cabeleireiros do outono
despentearam os crisântemos?

A biblioteca de Fernando Pessoa também pode ser sua

Além de ler o livros de  Fernando Pessoa, publicados pela L&PM, você também pode, a partir de agora, ter acesso aos volumes que o escritor português possuia em sua biblioteca. Os 1.142 volumes do acervo da Casa Fernando Pessoa, em Lisboa, foram digitalizados na íntegra e estão disponíveis na internet. Incluindo manustritos do próprio  Pessoa, além de poemas e traduções escritas nas páginas iniciais de alguns livros. No site da biblioteca virtual, estão ainda anotações, assinaturas, dedicatórias e selos adesivos. Isso mesmo: selos! Em seu diário, Fernando Pessoa colava os selos das lojas  em que costumava adquirir seus livros. Pelas entradas no caderno de anotações, presume-se que o escritor encomendava suas edições a partir de um catálogo de livraria ou de uma editora estrangeira. No espólio pessoano existem ainda muitas listas com as datas de encomenda de livros, como, por exemplo, uma de 7 de Abril de 1916, na qual figuram The MagnetThe Magic Seven, ambos de Lida Abbie Churchillque e que ainda hoje constam da biblioteca particular.

Para conhecer o acervo completo acesse http://casafernandopessoa.cm-lisboa.pt

"Não tinha a túnica vermelha / Vermelho é o sangue e o vinho / A pobre morte a quem amou" traduziu Pessoa na página inicial de "The Ballad of Reading Gaol" de Oscar Wilde