Arquivo mensais:setembro 2012

Os belos e malditos Fitzgeralds

Antes de publicar O grande Gatsby, seu romance mais famoso e uma das obras de língua inglesa mais aclamadas do mundo, F. Scott Fitzgerald escreveu Os belos e malditos, uma espécie de história de amor autobiográfica.  No livro, Anthony Patch, um herdeiro milionário formado pela Universidade de Harvard, e Gloria, sua mulher, formam um glamuroso e irresponsável casal que vive em Manhattan e assiste, impotente, a seu espetacular e trágico declínio. Muito mais do que um romance que retrata as loucuras e extravagâncias da chamada Era do Jazz por alguém que a viveu intensamente, esta é a história do próprio casal Fitzgerald.

Os toques autobiográficos estão presentes em boa parte da obra de F. Scott Fitzgerald, tanto que chegou um momento em que ficção e realidade passaram a se confundir, como se ele previsse em seus livros as desventuras que aconteceriam na vida do casal. Em 1930, quando Zelda sofreu um colapso nervoso total após sucessivas crises, Francis confessou: “às vezes, não sei se Zelda e eu somos de verdade ou personagens de um dos meus romances”.

Mais tarde, em 1934, lutando contra uma montanha de dívidas, escreveu Tender is the night, antes de proclamar sua própria “falência emocional” em uma série de ensaios confessionais publicados na revista Esquire e reunidos junto com outros escritos no livro Crack-up da Coleção L&PM Pocket.

Baita livro

Por Juremir Machado da Silva*

Luiz Antonio de Assis Brasil sempre escreveu bem. Já tem seu lugar garantido entre os melhores escritores gaúchos de todos os tempos, que não são muitos, os tempos. Terá, apesar disso, de suportar um clichê que vou cometer agora: está como o bom vinho. Cada vez melhor. Leio-o desde quando eu tinha 22 anos e sonhava em mudar o mundo. Infelizmente para pior. Fui, talvez, o primeiro a resenhar “Videiras de Cristal“. Quando Assis publica um livro, corro para ler. Imaginava que ele andasse absorto na sua labuta de secretário estadual da Cultura e longe da carpintaria da literatura. Nada disso. Ele acaba de lançar “Figura na Sombra” (L&PM). Em linguagem de crítico literário, um romance soberbo. Em bom português, um baita livro. É a história do francês Aimé Bonpland, naturalista e companheiro de viagem de Humboldt por este Novo Mundo.

Bonpland teve uma existência errante. Escalou, com Humboldt, o vulcão Chimborazo e navegou pelas águas do Orenoco até o rio Negro, comprovando a existência dessa ligação através do Canal de Casiquiare. Mais tarde, depois de um retorno à Europa, mudou-se para Buenos Aires. Apaixonou-se pela yerba, a erva-mate. Retomou suas aventuras. Foi prisioneiro de El Supremo, o déspota esclarecido do Paraguai. Abandonou e foi abandonado por mulheres estranhas. Antes disso, cuidou e desenvolveu os jardins de Malmaison, o castelo da imperatriz Josefina, mulher de Napoleão, por quem teria se apaixonado. Foi chamado de vários nomes, especialmente de Gringo “loco”. Teve a vida que muita gente gostaria de ter, inclusive eu, por algum tempo. Assis Brasil mergulha esse personagem bizarro, sábio, iluminado, teimoso numa atmosfera de profunda solidão. Sofreria por amor à sua eterna Josefina? Ou por amor platônico a Humboldt? “Figura na Sombra” deixa essa porta aberta. Se não rolou, foi por medo de Bonpland. Humboldt parecia bem chegado.

Humboldt virou um mito. Bonpland, embora reconhecido e admirado, ficou em segundo plano. Sofria com isso? Teria voltado ao fim de mundo para aplacar o seu ressentimento? Humboldt quis provar a lógica perfeita da natureza. Bonpland intuía que tudo é caos. Ganhou a parada? Hipóteses, especulações, probabilidades… Assis Brasil faz o coração do leitor se apertar. Que puta solidão! Que tristeza! Quanta mágoa, quanta loucura, quanto silêncio, quanta dor! Há mistério, ambiente, imaginário e fantasia em cada página. O autor domina a palavra como um tirano iluminado e iluminista. Se em alguns livros sua narrativa parecia recuperar a estética do século XIX, em “Figura na Sombra” se vê, de corpo inteiro, o narrador deste século XXI, ágil, sintético, curto-circuitando a descrição, alternando ruptura e continuidade, abraçando uma ficção cósmica quântica, uma simulação engenhosa de linearidade feita de saltos e lirismo. Tem balanço de emoções, sinuosidade, um ritmo.

Assis Brasil é escritor de fato: ninguém se atreverá a perguntar-lhe se o que conta é verdadeiro. A pergunta não faz sentido. Só um imbecil a faria. Afinal, como poderia a ficção convincente ser falsa? Impossível.

* Juremir Machado da Silva é escritor, jornalista, tradutor e professor universitário. Esta crônica foi publicada originalmente em sua coluna diária do Jornal Correio do Povo no dia 23 de setembro de 2012.

Árvores poéticas

Hoje, 21 de setembro, é Dia da Árvore. Para homenageá-las, publicamos aqui dois sonetos especialmente escolhidos pelo escritor Sergio Faraco, vindos das páginas do livro As árvores e seus cantores (Editora Unisinos), organizado por ele junto com Maria do Carmo Conceição em 1999. Lembrando que amanhã, 22 de setembro, a primavera adentra o hemisfério sul trazendo suas cores e perfumes e deixando as árvores ainda mais floridas.

Árvore antiga

Freitas Guimarães (Caldas/MG, 1873 – Santos/SP, 1944)

É um carvalho secular, gigante:
o velho tronco, rijo, que o machado
poupou, e o vendaval desencadeado
não conseguiu jamais ver vacilante…

O velho tronco, ainda palpitante,
vive de cima abaixo agasalhado
em túnica de flores, coroado
de ramaria esplêndida e pujante!

Erguido ali, de pé, do alto fitando
as árvores que vivem disputando
a sua altura e o seu viver em festa,

orgulhoso de sua majestade,
cheio de ninhos e de alacridade,
parece um rei no seio da floresta!

* * *

A floresta

Augusto dos Anjos (Espírito Santo/PB, 1884 – Leopoldina/MG, 1914)

Em vão com o mundo da floresta privas!…
– Todas as hermenêuticas sondagens,
ante o hieróglifo e o enigma das folhagens,
são absolutamente negativas!

Araucárias, traçando arcos de ogivas,
bracejamentos de álamos selvagens,
como um convite para estranhas viagens,
tornam todas as almas pensativas!

Há uma força vencida neste mundo!
Todo organismo florestal profundo
é dor viva, trancada num disfarce…

Vivem só, nele, os elementos broncos
– as ambições que se fizeram troncos,
porque nunca puderam realizar-se.

Dr. Fernando Lucchese dá dicas para lidar com quem sofre de Alzheimer

21 de setembro é o Dia Mundial da Doença de Alzheimer, uma data escolhida para discutir o assunto e as melhores formas de tratar e lidar com os doentes. Segundo dados do IBGE, pode-se estimar que 1,2 milhões de brasileiros sofram com a doença, com cerca de 100 mil novos casos por ano no país. O Dr. Fernando Lucchese, autor de Pílulas para viver melhor, entre outras publicações sobre saúde, está preparando o livro “Desembarcando o Alzheimer” com dicas preciosas como estas que ele adiantou no vídeo que acaba de ser feito pela L&PM WebTV:

Autor de “Operação Condor” na Comissão Nacional da Verdade

A Comissão Nacional da Verdade surgiu no governo da presidente Dilma Rousseff com o objetivo de investigar violações dos direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988 no Brasil. Pois esta semana, a Comissão da Verdade formalizou a criação do Grupo de Trabalho sobre a Operação Condor que conta com a colaboração do jornalista Luiz Cláudio Cunha, autor do livro Operação Condor: o sequestro dos uruguaios – Uma reportagem dos tempos da Ditadura, publicado pela L&PM Editores.  

Luiz Cláudio Cunha é jornalista especializado na análise das graves violações de direitos humanos, praticadas sistematicamente pelas ditaduras civil-militares implantadas nos países do extremo sul do continente, inclusive o Brasil. Em novembro de 1978, ele foi testemunha ocular do sequestro dos uruguaios Lilian Celiberti e Universindo Rodríguez Díaz, em Porto Alegre.  A obra jornalística de Cunha já recebeu os prêmios Jabuti, Vladimir Herzog e Casa de Las Americas.

Agraciado em maio de 2011 pela Universidade de Brasília (UnB) com o inédito título de ‘Notório Saber em Jornalismo’, Cunha é reconhecido por especialistas e entidades de direitos humanos por seu engajamento no debate sobre terrorismo de Estado e, especificamente, as ações ainda encobertas da Operação Condor.

Vem aí mais um livro de Martha Medeiros

Há duas coisas que Martha Medeiros ama fazer: escrever e viajar. Aliás, segundo suas próprias palavras, viajar sempre esteve em seu DNA. E agora essas duas paixões se uniram em um novo livro cujos originais ela acaba de entregar aqui na editora. Hoje, 19 de setembro, Martha veio até a L&PM para conversar com o editor Ivan Pinheiro Machado sobre Um lugar na janela – Relatos de viagem que será lançado em outubro e que traz impressões sobre lugares que a escritora vem visitando desde seus vinte e poucos anos.

Mas não espere um guia de viagens, pois este não é propósito de Um lugar na janela. O livro traz, isso sim, relatos sinceros e muitas vezes emocionados sobre muitos cantos do planeta como Paris, Madri, Londres, Nova York, deserto do Atacama, Istambul, Praga, Punta del Leste, Rio de Janeiro, Fernando de Noronha, Porto de Galinhas, Olinda e mais cidades da Suíça, Havaí, Marrocos, Itália, Grécia, Peru, entre outros países. São crônicas que, como Martha revela na introdução, chamada de “Pré-embarque”, nasceram porque “atravessar fronteiras era um desejo meu desde menina, incluindo as fronteiras mentais, não apenas geográficas. Conhecer, descobrir, avançar, aprender: verbos que de certa forma me definem, todos relacionados com o exercício da liberdade.”

Nos textos do novo livro, muito mais do que dar dicas para turistas, Martha conta sobre quando dividiu a mesa com finlandeses desconhecidos em um restaurante em Budapeste, chorou em um posto de gasolina em Paris por ter sido confundida com uma golpista, entrou no banheiro masculino de um bar de Lisboa e passou por um terremoto em Los Angeles, só para citar algumas histórias. É aguardar para viajar… 

Martha Medeiros com Ivan Pinheiro Machado. A escritora acaba de entregar "Um lugar na janela - Relatos de viagem", seu novo livro

Tchékhov no teatro com o Grupo Galpão

Dias 20, 21 e 22 de setembro, o grupo mineiro Galpão apresenta, dentro da programação do Porto Alegre em Cena deste ano, a peça Eclipse, montada a partir da leitura de quase 200 contos do escritor russo Anton Tchékhov. O espetáculo faz parte das comemorações dos 30 anos da companhia teatral. Em Eclipse, o grupo mergulhou na obra de Tchékhov para criar uma peça em que cinco pessoas, presas num mesmo espaço, aguardam o final de um eclipse solar. Enquanto isso, elas discorrem sobre a existência e a condição humana, perpassando os contos e a filosofia do escritor. Eclipse faz parte do projeto “Viagem a Tchékhov”, que deu origem também à montagem “Tio Vânia (aos que vierem depois de nós)” e marca o retorno do Galpão ao Porto Alegre em Cena. A peça será apresentada no Theatro São Pedro, sempre às 21h.

No vídeo abaixo, um dos integrantes do grupo fala sobre a montagem e a direção de Jurij Alschitz em entrevista concedida em abril de 2012, quando Eclipse foi apresentada no festival de teatro de Curitiba.

Clique aqui e veja os livros de Tchékhov publicados na Coleção L&PM Pocket.

Turma da Mônica numa aventura contra preconceito contra crianças soropositivas

Uma revistinha especial, criada para ser distribuída gratuitamente no Brasil, apresenta dois novos personagens da Turma da Mônica, crianças saudáveis, que levam uma vida normal, mas são portadoras do vírus HIV. Seus nomes são Igor e Vitória.

O gibi pretende abordar as formas de infecção da doença, o que é o vírus da Aids, como conviver com crianças soropositivas e o impacto social causado pela patologia.

“Uma criança portadora do HIV/Aids, por exemplo, não tem culpa de ter contraído o vírus e é vista com receio pelos próprios coleguinhas e seus pais. Por essa razão, precisamos já promover sua inclusão junto aos seus colegas na escola. Serão adultos melhores”, afirmou Maurício de Sousa.

A tiragem inicial, de 30 mil cópias, será distribuída em brinquedotecas, pediatrias dos hospitais da rede Amil, postos de gasolina da rede Petrobras e hospitais públicos da Secretaria da Saúde do Distrito Federal. Em 2013, a publicação deve ser lançada em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Curitiba, Salvador e Recife.

Sozinho numa ilha deserta

Por Caroline Chang*

Uma das boas coisas que me trouxe o mestrado foi a leitura de As aventuras de Robinson Crusoé, para uma disciplina de teoria do gênero. Nunca havia eu lido a obra mais conhecida de Daniel Defoe (1660-1731), publicada em 1719, e que – bem aos moldes do que se fazia nesse período em que o romance se estabelecia como forte gênero literário -, se pretende um manuscrito encontrado, que conta uma história real. “O editor acredita que se trata de uma história verídica; não existe nela qualquer aparência de ficção”, diz o prefácio. Assim, Robinson Crusoé teria de fato existido; teria de fato ignorado os conselhos paternos para seguir uma vida mediana de temperança e partido para longas viagens; teria realmente naufragado sucessivas vezes, e sobrevivido; teria sido feito escravo, e posteriormente teria se tornado senhor de uma ilha, onde teria conhecido e convertido ao cristianismo o selvagem Sexta-Feira.

Ao romance, como se vê, não faltam peripécias nem reviravoltas. O que mais me ficou da leitura, porém, foi um prazer a uma ideia um tanto pueril, que encontra expressão nos trechos em que o protagonista, preso numa ilha deserta e selvagem, precisa encontrar maneiras de “reconstruir” parte da civilização, para poder sobreviver. Assim ele fabrica ferramentas, planta, caça, cria animais, constrói uma cabana com matéria-prima tirada da natureza e aprende a fazer cerâmica.

Quem jamais se pensa numa ilha deserta, deserta também dos chatos, de contas a pagar, de poluição, trânsito, Big Brothers e outros subprodutos da nossa civilização? Quem jamais acarinhou a fantasia de fazer tudo com as próprias mãos?; “sem precisar de ajuda de ninguém”, pensa a criança; “sem lojas, cartão de crédito, vínculo empregatício ou ajuste anual de imposto de renda”, pensa o adulto.

Em tempo: segue a dica de um “companheiro” ótimo para a leitura ou releitura desse que é um dos livros fundadores do romance moderno: “A ascensão do romance”, de Ian Watt.

* Toda semana, a Série “Relembrando um grande livro” traz um texto assinado em que grandes livros são (re)lembrados. Livros imperdíveis e inesquecíveis. Caroline Chang é jornalista e editora da L&PM.