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Estreia em agosto peça baseada nos textos de David Coimbra

Os textos de Jogo de damas e Mulheres, de David Coimbra, vão ganhar em breve uma adaptação para o teatro. Nos dois livros, David defende que desde o surgimento do homo sapiens, as fêmeas manipulam e dominam os machos através daquilo que eles mais apreciam: o sexo. O objetivo delas, no entanto, seria um só – a manutenção da espécie e, por consequência, da civilização. Mas a civilização está em colapso, alerta o cronista, e é partindo desta premissa que a concepção de Sobre Saltos de Scarpin situa a ação da peça num futuro pós-apocalíptico, quando a Terra, sobrevivente do dito colapso, vive sob um regime totalitário feminino.
Longe de pretender uma projeção futura da guerra entre os sexos, a proposta de um distanciamento temporal visa o efeito cômico, estético e um olhar crítico sobre o senso comum a respeito da relação entre homens e mulheres na sociedade atual. Todos os elementos da encenação, na verdade, fazem uma caricatura das convenções sexistas difundidas na nossa cultura.

A peça simula um mundo dominado pelas mulheres / Foto: Felipe Rosa e Ricardo Mendes

A peça tem estreia prevista para o dia 13 de agosto, no Teatro Renascença em Porto Alegre, e fica em cartaz até 5 de setembro. E fiquem de olho no blog: em breve sortearemos algumas entradas.

O homem que amava as mulheres

Por Ivan Pinheiro Machado

Para desespero de madame Balzac, Laure de Berny tinha 45 anos, era casada com um conde e tinha nove filhos. E foi o primeiro e maior amor de seu filho mais velho, Honoré.

Dela, ele recebeu o carinho que a mãe havia lhe negado e a definitiva iniciação sexual. Balzac era um menino do interior, tinha 22 anos. Laure excitava a imaginação do jovem Honoré, tão chegado no brilho da aristocracia. Afinal – prato cheio para um futuro romancista – Mme. de Berny traía um conde, e seus pais foram íntimos dos reis decapitados; a mãe foi dama de companhia de Maria Antonieta e o pai, harpista de Luis XVI… Não era pouca coisa. E o que no começo foi um escândalo provinciano, acabou por se transformar em uma amizade para toda a vida. Laure também foi decisiva na execução e concepção do grande projeto da Comédia Humana.

Zulma Carraud foi outra paixão da juventude. Casada com um militar, ela foi sua confidente, leitora e orientadora. Mas para desespero do escritor, jamais houve sexo entre eles.

Especialista no chamado “roman a clef” Balzac usava os livros para acertar contas e  concentrava o fogo de sua fúria nos homens. Já para as mulheres, dedicava toda a sua compreensão e tolerância. Como toda a regra tem exceção, seu belo romance “A Condessa de Langeais”, teria sido uma espécie de vingança ao desprezo da Marquesa de Castries, cuja mão foi recusada ao escritor. Mas, ao ler este livro pertencente à magnífica trilogia “História dos treze”, você verá que a marquesa não tinha nada do que reclamar, pois a condessa é um dos grandes personagens de Balzac.

Era conhecido nos ambientes mundanos como grande “causer” ou homem de excelente conversa. George Sand disse numa carta, “Quando entrava num salão, imediatamente o enchia”. No começo da década de 1830, principalmente depois do enorme sucesso de A pele de Onagro, ele já era um personagem célebre e colecionava “casos”, embora perseguisse obstinadamente um “bom casamento”, de preferência com uma condessa rica e viúva. Como Laure D’Abrantés, que foi sua amante por um breve tempo e, além de condessa, era viúva do célebre Marechal Junot, conquistador do Egito com Napoleão.

A celebridade em Paris da Restauração, como de resto em todas as épocas e em todo o mundo, atraía belas mulheres. Balzac recebia dezenas de cartas perfumadas e “diariamente, lindas desconhecidas batiam à sua porta”. Circulava entre os dândis “confirmados” de Paris. Um dos pontos altos da Comédia é a descrição das cortesãs. São várias, todas lindas e inteligentes como Josepha, Esther, Valeria, entre tantas outras que adoravam desfilar nos camarotes da Opéra com os garotos endinheirados. As descrições são tão verossímeis que pressupõe uma familiaridade que ele realmente teve na vida real.  Uma de suas prediletas foi a “demi-mondaine” Olympie Pélisser, uma das mulheres mais lindas de Paris por quem teve uma rápida paixão que custou até um pedido de casamento, por sinal, negado. Olympie foi amante do músico Rossini e do escritor de folhetins, famoso na época, e rival literário de Balzac, Eugène Sue. Dizia-se que a bela cortesã teria sido modelo para a deslumbrante e insensível Foedora de “A pele de Onagro”.

Mas entre as muitas mulheres que passaram pela sua vida, a que mais o marcou foi Eveline Hanska, condessa polonesa, leitora de Balzac que aproximou-se dele através de uma carta anônima. Balzac já era o escritor mais lido na Europa e nesta carta a condessa declarava sua admiração. Balzac investigou muito, acabou descobrindo a sua identidade e foi encontrá-la numa viagem a Suíça. Imediatamente tornaram-se amantes. A correspondência entre os dois é imensa e as cartas de Balzac para a “estrangeira” são a principal fonte de seus biógrafos. Já as cartas de Eveline para Balzac são raríssimas e supõe-se que Balzac as tenha destruído pois, afinal, ela era uma senhora casada. Esta ligação de duas décadas só consumou-se seis anos depois que a condessa enviuvou. E aos 50 anos, cansado e doente, Honoré de Balzac atingiu o sonho da vida inteira que era casar com uma condessa de verdade. Morreria seis meses mais tarde.

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O poder das mulheres na Comédia humana

CLIQUE AQUI PARA LER A PARTE 11 DESTA SÉRIE.

O poder das mulheres na Comédia humana

Por Ivan Pinheiro Machado

“Você tem uma sensibilidade em relação ao coração da mulher como nenhum outro homem… Ainda há algumas misérias deste pobre sexo que lhe escapam; mas, decerto, nunca um homem conseguiu entrar mais fundo na existência delas…”

Essas palavras da grande amiga de Balzac, Zulma Carraud, dão uma ideia da grandeza dos personagens femininos da Comédia Humana. Pode-se dizer, sem medo de errar, que entre a imensa galeria de protagonistas, se tirássemos todos os principais personagens masculinos, ainda assim a Comédia Humana se manteria de pé. Mas se deletássemos as mulheres, o edifício fatalmente ruiria.

Há nas 89 histórias (romances, novelas e contos) que compõe o monumental conjunto, um número formidável de extraordinárias mulheres. Só para citar algumas: a terrível prima Bette, a intensa e apaixonada Duquesa de Langeais, a condessa de Mortsauf que, literalmente, morre de amor em O lírio do vale, Julia d’Aiglemont, de A mulher de 30 anos, as fortes e belas Ginevra Pitombo e Eugénie Grandet, as cortesãs cuja beleza deslumbrante colocavam aos seus pés os barões de Paris como Málaga, Esther e Valéria, a maravilhosa e enigmática Paquita Valdés, de A Menina dos Olhos de Ouro e a incrível condessa Fedora, de Pele de Onagro. E há mais uma centena de grandes mulheres, personagens destacados que perambulam pelos volumes da Comédia Humana. São deliciosas as descrições que Balzac faz de uma bela mulher. Ele deleita-se, exagera, atiça a imaginação do leitor. Joga de maneira admirável com sua imensa capacidade de fazer frases de efeito. Veja como ele descreve uma de suas “musas”: “A profundidade de um abismo, a graça de uma rainha, a corrupção dos diplomatas, o mistério de uma iniciação e o perigo de uma sereia”.

No imenso e intrincado “sistema” da Comédia Humana, os personagens femininos possuem uma grandeza e uma dimensão que só uns poucos personagens masculinos conseguem ter. Elas são o centro do círculo social, comandam a cena. Os homens geralmente são marionetes nas mãos de mulheres poderosas. São traídos e humilhados, são mesquinhos e prepotentes, são vaidosos, arrogantes e quase sempre, ridículos.

Ele foi revolucionário ao narrar as vicissitudes do casamento, das uniões sem amor, numa época em que a “suave hipocrisia dos salões” recusava o divórcio e a separação. Criticou duramente os casamentos por interesses. Pregou as virtudes das “balzaquianas” em A mulher de 30 anos, seu livro mais célebre. E tolerou as traições, justificou as adúlteras mal-amadas e não raro, louvou as cortesãs. Na vida real, sempre procurou o amor das mulheres. Teve vários casos rumorosos, mas disso trataremos no próximo post.

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