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O “vinho” antes do vinho

No princípio era o verbo. E o nome do vinho precedeu a cultura da vinha. A pré-história do vinho remonta a vários milênios antes do início da era cristã, com o Soma, bebida sacrificial fermentada da Índia védica, que além de uma mistura mágica era um deus poderoso. Essa “poção da imortalidade” não era um vinho de uvas, mas o suco de uma planta sacrificial (ao que tudo indica, a Asclepias acida) que provavelmente tinha propriedades psicotrópicas ou psicodélicas. E o licor do Soma tinha o nome de Vena. Do Vena (amado, em sânscrito) se originaram  os nomes que designam o vinho em quase todas as línguas e povos da Europa: é o caso do russo (vino), do grego (woinos, depois oinos), do latim (vinum), do italiano e do espanhol (vino), do português (vinho), do alemão (wein), do inglês (wine) e do francês (vin). De origem mítica, de essência mística, de natureza santificada, de consumo francês, europeu e mundial, o vinho sempre foi uma bebida civilizatória. O vinho é muito mais do que “vinho”: é um patrimônio da humanidade. (Introdução do livro Vinho, de Jean-François Gautier, Série Encyclopaedia)

Vinho combina com um bom livro. E, como mostram as fotos abaixo, também com bons escritores:

O poeta português Fernando Pessoa em uma adega

Pablo Neruda e Vinicius de Moraes entre garrafas de vinho

Charles Bukowski bem agarrado em uma garrafa de vinho

Um pouco pro “santo” Bukowski

Hollywood está para Bukowski como Nova York está para Woody Allen: a cidade é sua personagem, seu ponto de partida, o cenário de tantas histórias. Na verdade, Los Angeles foi e continua sendo a casa do velho Buk. Onde se pode visitar seu túmulo, o número 875 da seção “Ocean View” do Green Hills Memorial Park em Rancho Palos Verdes, perto de onde ele viveu com sua esposa, Linda, de 1978 até o dia em que morreu, em 9 de março de 1994, vítima de leucemia. Sua lápide traz um desenho simples de um boxeador junto ao epitáfio “Don´t try” (“Não tente”). Basta perguntar a um funcionário do cemitério e os visitantes são conduzidos ao lugar de descanso de Hank. Segundo consta, é comum os fãs chegarem com uma garrafa de cerveja e derramarem o “líquido sagrado” junto ao túmulo numa demonstração de afeto. “Um pouco pro santo”, como se diz. Só que neste caso, nem tão santo assim…

Há os que dão um gole pro “santo” Bukowski

Há os que deixam a garrafa inteira

A L&PM publica todos os romances de Bukowski, mais contos e poemas.

Um carteiro chamado Bukowski

Foi no dia 25 de janeiro de 1663 que o primeiro carteiro que se tem notícia aqui no Brasil começou a trabalhar. Chamado de “Correio-mor”, ele era responsável pela troca de cartas entre as autoridades que aqui moravam e a Corte, em Portugal, buscando e levando as correspondências que chegavam de navio. Nada mais justo, portanto, que o dia 25 de janeiro fosse escolhido para ser o… Dia do Carteiro. E numa data como esta, nós não poderíamos deixar de homenagear o entregador de cartas mais ilustre da literatura: Henry Chinaski, o alter ego do escritor Charles Bukowski.

Como um bom personagem autobiográfico, Chinaski tem muito em comum com seu criador: bebia demais, teve inúmeros casos com mulheres mais jovens e passou boa parte da vida trabalhando como entregador de cartas, apesar de odiar o ofício.

É no romance Cartas na rua, escrito em 1974, que Chinaski aparece pela primeira vez. “Tudo começou como um erro”, ele anuncia já na primeira linha do texto. Este “erro” foi justamente ter se candidatado à vaga de carteiro temporário na época, há mais de uma década atrás, já que o ofício de escritor não lhe pagava nem a bebida. Quando se deu conta, já estava em seu segundo cargo no correio e carregava nas costas 14 anos de uma rotina maçante – ainda mais para um homem de meia-idade que estava sempre de ressaca.

A rotina de entregador de cartas é descrita em detalhes por Bukowski, inclusive a parte dos cães – que, todo mundo sabe, odeiam carteiros.

Era um verão quente e ele veio PULANDO de um quintal e então SALTOU, cruzando o ar. Seus dentes estalaram, errando por pouco a minha jugular.

– OH, JESUS! – gritei – OH JESUS CRISTO! ASSASSINATO! ASSASSINATO! SOCORRO! ASSASSINATO!

A fera deu meia-volta e saltou de novo. Acertei sua cabeça em cheio com a sacola, bem no meio do salto, as cartas e as revista voaram. Ele estava pronto para saltar outra vez quando dois caras, os donos, surgiram e o agarraram. Então, enquanto o cão me encarava sem parar de rosnar, eu me agachei e recolhi as cartas e as revistas que teria de reorganizar em frente à varanda da casa seguinte.

– Seus filhos da puta dementes –  eu disse aos dois homens – esse cachorro é um assassino. Livrem-se dele ou mantenham ele longe da rua!

E não eram só os cachorros os responsáveis por transformar a rotina de Henry Chinaski num inferno. Mais a frente, ele explica:

Todas as rotas tinham armadilhas e apenas os carteiros regulares as conheciam. Todo dia era a mesma merda, e você precisava estar preparado para um estupro, um assassinato, cães ou algum tipo de insanidade. Os regulares não revelavam seus segredinhos. Era a única vantagem que tinham – exceto saberem seus itinerários de cor. Era de matar para um novato, principalmente para um que bebia a noite inteira, ia para a cama à duas, levantava às quatro e meia, depois de trepar e cantar a noite toda, e quase conseguir sair ileso de tudo isso.

Depois de tudo isso, fica mais do que merecida a nossa homenagem a todos os carteiros! E se quiser ler outras peripécias do grande Henry Chinaski, elas estão contadas em vários outros romances como Mulheres, Misto-Quente, Factótum e Hollywood.

O poeta é… Charles Bukowski

viagem à praia

os homens fortes
os homens musculosos
lá na praia eles
se sentam
bronzeados como chocolate
os pesos
espalhados ao seu redor e
intocados

ficam sentados enquanto
as ondas avançam e
recuam

ficam sentados enquanto o
mercado de ações
ergue e destrói
homens e famílias

ficam sentados enquanto
um apertar de botão
poderia transformar
seus caralhos
em palitos de fósforos
pretos e enrugados

ficam sentados enquanto
suicidas em quartos verdes
os trocam por espaço

ficam sentados enquanto antigas
Miss Américas
choram diante de espelhos
enrugados

ficam sentados
ficam sentados com menos
vivacidade que macacos
e minha mulher para e
os olha:
“uuuu uuuu uuuu”, ela
diz.

me afasto com
minha mulher enquanto as ondas
avançam e recuam.

“há alguma coisa errada
com eles”, ela diz, “o que
é?”

“o amor deles só corre em
uma direção.”

as gaivotas giram e
o mar avança e recua

e nós os abandonamos
lá atrás
desperdiçando o tempo que lhes
resta
o momento presente
as gaivotas
o mar
a areia.

De O amor é um cão dos diabos, Charles Bukowski

Oh yes

por Rafael Raffa*

Eu estava morando em outro país. Sozinho. Trabalhava 12 horas por dia, seis dias por semana. Acordava e ia para o trabalho. Voltava de madrugada para lavar roupas, louça, limpar o banheiro. E toda madrugada, eu aleatoriamente abria o livro The Pleasures of the Damned, de Charles Bukowski, e lia alguns poemas. A naturalidade deles me fazia bem. Havia alguém por trás das palavras, realmente. Não havia mentira. Apenas alguns exageros, claro. E o segredo estava nesses exageros. Toda a miséria cotidiana traduzida num simples amarrar de cadarço. A vida simplificada em arte. Como se tudo aquilo pudesse acontecer. O jeito que as palavras rolavam página abaixo, encaixando-se perfeitamente em sua confusão. Humor nos momentos certos. O triunfo sobre a dor. Assim, não me sentia tão sozinho.

Numa dessas madrugadas, pensava em desistir de tudo. Ir embora. Sentia que podia morrer e não haveria ninguém para fechar meus olhos, como fazem nos filmes. Sozinho, no quarto, sem motivo para seguir. Uma pequena tragédia. Ao mesmo tempo, desistir de lá, era desistir de mim. Do que eu pretendia ver e sentir. Estava tão confuso, que folhava o livro sem ler, somente olhando as palavras. Até que parei num poema curto que me chamou a atenção. Oh yes, o título:

há coisas piores na vida do que
ficar sozinho
mas frequentemente leva décadas
para entender isso
e mais frequentemente
quando você entende
é tarde demais
e não há nada pior do que
tarde
demais

Levantei e fui preparar algo para comer. Pensando em ir embora. Pensando em ficar. O mundo pressionando suas paredes contra mim. Coloquei uma pizza congelada no forno. Abri uma garrafa de vinho. Tomei um longo gole no bico. Algo em torno de 20 segundos, o vinho escorrendo pela minha boca. Sentindo-me muito bem com isso. Sentindo um sopro de esperança no estômago.

Comi, como se aquilo fosse um verdadeiro banquete. Como se fizesse sentido. O vinho descendo leve pela garganta. A rua Finchley, laranja, do lado de fora. A melhor pizza do mundo. Tudo tão simples, como nos poemas. Servi outro copo e estiquei minhas pernas. Algo dentro de mim havia esquecido de se preocupar.

Escutei o colombiano com quem eu dividia o apartamento chegando. Subindo as escadas sem vontade. Os pés pesados nas escadas.  Escutei a porta abrindo e batendo forte ao fechar . Deve estar voltando da casa da namorada gaúcha, pensei.

– Meus Deus, as mulheres brasileiras são malucas. Ele disse, entrando na sala e sentando-se ao meu lado.
– Conta alguma coisa que eu não saiba.

Abri o livro na mesa; página 188.  Oh yes, apontei, e fui buscar outro copo para ele. Servi um dos grandes. A gente precisava. Perguntei o que havia achado do poema. Legal, respondeu. Perguntei como estava o namoro. Não podia estar melhor, disse. Nós dois rimos. E continuamos. Rindo da sorte e do azar. Rindo do laranja da rua Finchley. Rindo dos pequenos traumas da vida. Rindo do vinho. E, principalmente, rindo de nós mesmos.

Eu consigo entender quando gritam que Charles Bukowski só escreve sobre miséria, bebedeiras, sexo, escatologias. Que é muito sádico, ocasionalmente fascista e discriminatório contra determinados grupos. Que não presta. Que não tem pretensão artística. Que não é literatura. Eu entendo, mas não consigo deixar de pensar que deixaram escapar alguma coisa. Nunca os vejo falando sobre a esperança, a beleza das pequenas coisas, o apoio no simples. A forma, escondida pela naturalidade. Quase um acidente. A forma através da confusão.

Talvez, quando o leram, fizeram a pergunta errada. Com Bukowski, está tudo ali, exposto. Não há intenções por de trás das palavras. As intenções estão nos detalhes, nos acontecimentos, no humor, na realidade. Perguntaram-se o que ele quis dizer, quando o que mais importa, é o que ele fez eles entenderem. O filho da puta mais durão que você já viu, sem máscara alguma. Assim como eu. Como você. Como qualquer um de nós.

Espero que numa próxima vez, deixem a naturalidade das palavras simples entrarem em seus pulmões. Sem as muletas literárias. Sem as muletas do bom senso. Apenas o galope selvagem das frases que entram cortes e saem cicatrizes.

Sirvo mais um copo de vinho agora. Levanto para o alto. Faço um brinde para o colombiano e outro pra você, Hank.

* Rafael Raffa é estudante de jornalismo e, depois de morar em Londres, voltou à sua cidade natal: Porto Alegre. Ele é tão fã de Bukowski que tatuou em sua perna esquerda um desenho feito por “Hank”, de quem a L&PM publica todos os romances, mais contos e poemas.

As razões de Bukowski

Não é de hoje que o velho safado Charles Bukowski é acusado de escrever obscenidades por puritanos e moralistas de dedo em riste. Em 1985, uma biblioteca pública de Nijmegen, na Holanda, decidiu retirar de suas prateleiras o livro Crônica de um amor louco, sob a alegação de que seu conteúdo seria “muito sádico, ocasionalmente fascista e discriminatório contra determinados grupos”. Por grupos, entendia-se mulheres, negros e gays. Bem politicamente incorreto como só Bukowski sabia ser.

Algum tempo depois, o Ministro Hans van den Broek entrou em contato com o autor para saber sua opinião sobre o ocorrido. Eis a resposta que só Bukowski daria:

(clique para ampliar e ler melhor)

Se o seu inglês não dá conta, aí vai a tradução feita pelo blog quadrinhos e etc.:

Caro Hans van den Broek:

Obrigado por sua carta contando-me da remoção de um dos meus livros da biblioteca Nijmegen. E que ele é acusado de discriminação contra negros, homossexuais e mulheres. E que é sádico por causa do seu sadismo.

A única coisa que temo discriminar é o humor e a verdade.

Se eu escrevo mal sobre os negros, homossexuais e mulheres, é por que os que eu conheci eram assim. Há muitos “males” – cães maus, má censura, há até mesmo “maus” homens brancos. Somente quando você escreve sobre “mau”, homens brancos não reclamam. E eu preciso dizer que há “bons” negros, “bons” homossexuais e “boas” mulheres?

No meu trabalho, como escritor, eu só fotografo, em palavras, o que vejo. Se eu escrever sobre “sadismo” é porque ele existe, eu não inventei isso, e se algum ato terrível ocorre no meu trabalho é porque essas coisas acontecem em nossas vidas. Eu não estou do lado do mal, como se o mal fosse algo inerente. Eu meus escritos, eu nem sempre concordo com o que ocorre, nem vou me afundar na lama por causa deles. Além disso, é curioso que as pessoas que gritam contra o meu trabalho parecem ignorar as partes dele que enaltecem a alegria, o amor e a esperança, e há essas partes. Meus dias, meus anos, minha vida viu altos e baixos, luzes e trevas. Se eu escrevesse só e continuamente da “luz” e nunca mencionasse o outro, então como artista eu seria um mentiroso.

A censura é a ferramenta daqueles que têm a necessidade de esconder realidades de si mesmos e dos outros. Seu medo é apenas a sua incapacidade de enfrentar o que é real, e eu não posso desabafar minha raiva contra eles. Eu só sinto essa tristeza terrível. Em algum lugar, na sua educação, eles estavam protegidos contra os fatos de nossa existência. Eles só foram ensinados a olhar de um jeito, quando existem muitas maneiras.

Eu não estou desanimado que um dos meus livros tenha sido caçado e retirado das prateleiras de uma biblioteca local. Em certo sentido, sinto-me honrado que eu escrevi algo que despertou essas pessoas de seu eu superficial. Mas fico magoado, sim, quando alguém tem seu livro censurado, pois esse livro, geralmente é um grande livro e há poucos desses, e ao longo dos tempos esse tipo de livro tem muitas vezes se tornado um clássico, e o que se acreditava chocante e imoral é hoje leitura obrigatória em muitas das nossas universidades.

Não estou dizendo que meu livro é um desses, mas eu estou dizendo que em nosso tempo, nesta época em que qualquer momento pode ser a último para muitos de nós, é condenadamente irritante e incrivelmente triste que ainda temos entre nós a pequenez, as pessoas amargas, os caçadores de bruxas e os declamadores contra a realidade. No entanto, estes também pertencem a nós, eles são parte do todo, e se eu não tenho escrito sobre eles, eu deveria, talvez o faça, e isso é suficiente.

que todos nós possamos ficar melhor juntos,
seu,

Charles Bukowski

via Rafael Raffa Ramos, no Facebook

Crazy Love: um filme raro que faz jus à obra de Bukowski

Charles Bukowski jamais poderia imaginar que uma das mais fiéis adaptações de sua obra para o cinema nasceria das mãos de um diretor belga. Pois foi exatamente o que aconteceu com “Crazy Love”. Realizado em 1987, “Crazy Love” é o primeiro longa-metragem de Dominique Deruddere, diretor que ficou conhecido mundialmente ao ser indicado para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, em 2001, por “Fama para Todos”.

Inspirado em diversos contos de Bukowski, principalmente “A Sereia que Copulava em Veneza, Califórnia”, do livro “Crônica de um amor louco“, a trama se desenrola através de três momentos da vida do trágico e patético personagem Harry Voss e sua incessante busca por amor e aceitação: da adolescência conturbada até um homem amargo e solitário.

Apesar de ser falado em francês, “Crazy Love” é considerado pelos fãs de Bukowski como sendo uma das mais fiéis adaptações do universo de desesperança e degradação criado pelo velho Buk.

Se você estiver em Porto Alegre e ainda não arrumou programa para amanhã à noite, o projeto Filmes Raros da Sala P. F. Gastal (Usina do Gasômetro, 3º andar) vai exibir “Crazy Love” nesta sexta-feira, 04 de novembro, às 20 horas com entrada franca! A duração do filme é de 90 minutos.

Abaixo, um trecho do filme para você sentir o clima “Bukowskiano”:

Verbete de hoje: Matthias Schultheiss

Com o lançamento da nova Enciclopédia dos Quadrinhos“, de Goida e André Kleinert, o Blog L&PM publicará, nos domingos um verbete do livro. O verbete de hoje é MATTHIAS SCHULTHEISS:

O cinema já tentou adaptar, para imagens, o espírito da obra de Charles Bukowski. Não chegou perto, porém, dos acertos e da incrível transposição para os quadrinhos realizada pelo desenhista alemão Matthias Schultheiss. Ele desenhou com um estilo realista, paradoxalmente belo, o universo dos bêbados, das prostitutas, dos marginais e dos desesperados que povoam os contos e novelas de Bukowski. Foram várias narrativas publicadas em álbum pelo Editor Heyne Verlag, da Alemanha, logo traduzidas para outras línguas. No Brasil, com os títulos de Delírios cotidianos e N. York, 95 cents ao dia, os contos de Bukowski/Schultheiss foram publicados na coleção “Quadrinhos L&PM” e depois lançados num só álbum, em 2008. Antes disso, Schultheiss havia desenhado uma série sobre caminhoneiros (“Truckers”, para a revista Zack, em 1980). Convidado para colaborar com revistas francesas, fez Le Théorème de Bell, para L’Echo des Savanes. Colaborou também para a revista Circus. Depois de levar para os quadrinhos de maneira perfeita Bukowski, Schultheiss tentou outras transcrições, não com a mesma felicidade. O sonho do tubarão saiu completo, em três partes, na revista Animal. O teorema de Bel teve uma primeira e uma segunda parte. Ele alcançou mais sucesso com uma série supererótica, “Talk Me Dirty” (assim mesmo, em inglês), que saiu na Europa e na Argentina (na revista Super Sexy), editada nos anos 90 por Carlos Trillo.

Pernas pra que te quero…

As pernas de Úrsula e outras possibilidades, de Claudia Tajes, é a novidade do dia. O livro, lançado originalmente em 2001, volta agora em nova edição, na Coleção L&PM POCKET. Para homenagear essas que nos aproximam de pessoas e lugares, que correm o mundo, que caminham sem rumo e que se enlaçam de amor, nós separamos alguns textos e poemas que falam nelas, as pernas:

“Nos meus devaneios, as pernas de Úrsula haviam andado pelo mundo inteiro, conhecido línguas, em todos os sentidos, e causado a desgraça de franceses, egípcios e neozelandeses. Eu podia ver as pernas de Úrsula correndo da polícia nas manifestações das Diretas Já, dançando em cima da mesa nos bailes de carnaval do Monte Líbano, entrando em campo para uma partida de futebol feminino, fazendo um strip-tease para um felizardo qualquer…” (Trecho de As pernas de Úrsula, de Claudia Tajes)

* * *

(…) a garota do vestido vermelho
que desceu do carro branco
tinha as melhores pernas
a garota do vestido rosa
que desceu do carro vermelho
tinha pernas razoáveis

mas sigo lembrando da garota no vestido azul
que desceu do carro azul
vi suas calcinhas

você não sabe o quão excitante a vida pode ser
por volta
das 5h35 da tarde.
(Trecho de garotas voltando para casa, de Charles Bukowski, em O amor é um cão dos diabos)

* * *

(…) E todavia aquela perna indica
que muito longe dela o céu não fica:
tentar, como um Titã de raio em troco?

Aquela ponte de marfim maciço
passar, subir… quem pode fazer isso?
um louco? – Eu vou… Quem há do que eu mais louco?
(Trecho de A Perna, de Luís Delfino, em Livro dos poemas)

* * *

Eu abro as pernas para perpetuar a tênue ternura do infinito / da Fênix e seu rito. / Eu abro as pernas para enrijecer o grelo / descontrolar o grito / gotejar a gruta / e me perder no atrito. / Eu abro as pernas para entrar em mim / mimetizar o ego / e transformá-lo em mito.
(poema de Paula Taitelbaum em Porno Pop Pocket)

Diferentes estilos de ser feliz por nada

Aqui na redação deste blog, a expressão “feliz por nada” está tão presente no nosso dia-a-dia (é o nome do mais recente livro de Martha Medeiros) que acabamos fazendo uma brincadeira. Uma espécie de exercício de criatividade que agora compartilhamos com os leitores. É o seguinte: o que alguns dos nossos autores preferidos teriam a dizer sobre ser “feliz por nada”? Aquela sensação de estar alegre sem ter motivo e de ficar rindo à toa sem saber porquê… Pensando nisso – e inspirados nas palavras e nos estilos literários de Allen Ginsberg, Woody Allen, Charles Bukowski e Jack Kerouac – criamos algumas frases que juntamos com as fotos mais felizes que encontramos de cada um deles (parece que Jack Kerouac não gostava muito de mostrar os dentes…). Veja aqui o resultado:

Allen Ginsberg: “Feliz por nada, flutuando sobre os tetos das cidades contemplando jazz…”:

Woody Allen: “A genialidade está nos cromossomos. Você sabia que meu DNA brilha no escuro? É por isso que de vez em quando me sinto feliz por nada. E não me diga que isso é efeito do Prozac…”

Charles Bukowski: “Um dos caras me alcançou um cigarro. Dei uma tragada, exalei fumaça pelo nariz e bebi todo o copo num gole só. Não conseguia entender aquela sensação de estar feliz por nada. Ainda nem tinha bebido o suficiente pra isso…”

Jack Kerouac: “Cambaleamos para dentro do bar. Na junkebox, ressoava a voz rouca que repetia com seu sotaque latinamente triste: ‘Estou feliz por nada… Feliz por nada…'” (Kerouac é o da direita, aqui ao lado de Neal Cassady):

E por falar nisso, hoje Martha Medeiros autografa seu livroFeliz por nada“, às 19h, na Livraria Saraiva do Leblon. E amanhã, sábado, ela vai estar na Bienal do Livro do Rio de Janeiro, às 16h no Espaço Degustação Digital e às 17h no Mulher e ponto.