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Um carteiro chamado Bukowski

Foi no dia 25 de janeiro de 1663 que o primeiro carteiro que se tem notícia aqui no Brasil começou a trabalhar. Chamado de “Correio-mor”, ele era responsável pela troca de cartas entre as autoridades que aqui moravam e a Corte, em Portugal, buscando e levando as correspondências que chegavam de navio. Nada mais justo, portanto, que o dia 25 de janeiro fosse escolhido para ser o… Dia do Carteiro. E numa data como esta, nós não poderíamos deixar de homenagear o entregador de cartas mais ilustre da literatura: Henry Chinaski, o alter ego do escritor Charles Bukowski.

Como um bom personagem autobiográfico, Chinaski tem muito em comum com seu criador: bebia demais, teve inúmeros casos com mulheres mais jovens e passou boa parte da vida trabalhando como entregador de cartas, apesar de odiar o ofício.

É no romance Cartas na rua, escrito em 1974, que Chinaski aparece pela primeira vez. “Tudo começou como um erro”, ele anuncia já na primeira linha do texto. Este “erro” foi justamente ter se candidatado à vaga de carteiro temporário na época, há mais de uma década atrás, já que o ofício de escritor não lhe pagava nem a bebida. Quando se deu conta, já estava em seu segundo cargo no correio e carregava nas costas 14 anos de uma rotina maçante – ainda mais para um homem de meia-idade que estava sempre de ressaca.

A rotina de entregador de cartas é descrita em detalhes por Bukowski, inclusive a parte dos cães – que, todo mundo sabe, odeiam carteiros.

Era um verão quente e ele veio PULANDO de um quintal e então SALTOU, cruzando o ar. Seus dentes estalaram, errando por pouco a minha jugular.

– OH, JESUS! – gritei – OH JESUS CRISTO! ASSASSINATO! ASSASSINATO! SOCORRO! ASSASSINATO!

A fera deu meia-volta e saltou de novo. Acertei sua cabeça em cheio com a sacola, bem no meio do salto, as cartas e as revista voaram. Ele estava pronto para saltar outra vez quando dois caras, os donos, surgiram e o agarraram. Então, enquanto o cão me encarava sem parar de rosnar, eu me agachei e recolhi as cartas e as revistas que teria de reorganizar em frente à varanda da casa seguinte.

– Seus filhos da puta dementes –  eu disse aos dois homens – esse cachorro é um assassino. Livrem-se dele ou mantenham ele longe da rua!

E não eram só os cachorros os responsáveis por transformar a rotina de Henry Chinaski num inferno. Mais a frente, ele explica:

Todas as rotas tinham armadilhas e apenas os carteiros regulares as conheciam. Todo dia era a mesma merda, e você precisava estar preparado para um estupro, um assassinato, cães ou algum tipo de insanidade. Os regulares não revelavam seus segredinhos. Era a única vantagem que tinham – exceto saberem seus itinerários de cor. Era de matar para um novato, principalmente para um que bebia a noite inteira, ia para a cama à duas, levantava às quatro e meia, depois de trepar e cantar a noite toda, e quase conseguir sair ileso de tudo isso.

Depois de tudo isso, fica mais do que merecida a nossa homenagem a todos os carteiros! E se quiser ler outras peripécias do grande Henry Chinaski, elas estão contadas em vários outros romances como Mulheres, Misto-Quente, Factótum e Hollywood.