Cadastro para compra de livros por bibliotecas públicas tem traduções acusadas de cópia
Criado pela Fundação Biblioteca Nacional (FBN) para ampliar e renovar o acervo das bibliotecas públicas do país, o recém-lançado Cadastro Nacional de Livros de Baixo Preço inclui obras suspeitas de serem traduções plagiadas. A denúncia foi encaminhada à Procuradoria Geral da República nesta semana pela tradutora Denise Bottmann, que enumerou dezenas de casos. A maior parte deles envolve livros da Editora Martin Claret.
Denise publicou em seu blog (naogostodeplagio. blogspot.com) uma lista de obras suspeitas, comparando-as com as versões originais. Entre os livros citados estão “O médico e o monstro”, de Robert Louis Stevenson, “O lobo do mar”, de Jack London, e “A mulher de trinta anos”, de Balzac, todos com traduções atribuídas a Pietro Nassetti e denunciadas há anos como plágios.
No caso de “O lobo do mar”, por exemplo, a versão atribuída a Nassetti reproduz, com pequenas alterações, a tradução de Monteiro Lobato publicada em 1934, pela Companhia Editora Nacional. O romance de London está em domínio público, mas os direitos autorais da tradução pertencem aos herdeiros de Lobato.
O Cadastro Nacional de Livros de Baixo Preço reúne mais de dez mil títulos, cujo preço final para o consumidor não pode ultrapassar R$ 10. Os livros foram inscritos no programa pelas próprias editoras e, desde 13 de janeiro, começaram a ser avaliados por 2.700 bibliotecas e pontos de leitura de todo o país, que escolherão os títulos a serem adquiridos.
Procurada pelo GLOBO, a FBN alega que, para que um livro seja excluído do cadastro, “é preciso que tenha sido objeto de ação judicial, com trânsito em julgado, que tenha determinado o impedimento de circulação das obras”. A FBN argumenta que o edital determina que toda editora, ao participar do programa, reconhece “que os livros que inscreve não violam qualquer princípio legal vigente”. A Martin Claret já foi intimada judicialmente por plágios, como no caso das traduções de Modesto Carone para “A metamorfose” e “Carta ao pai”, de Kafka (não incluídas no cadastro).
Editora substituirá obras
Responsável pelo Departamento Editorial da Martin Claret, Taís Gasparetti afirma que, devido às denúncias dos últimos anos, a editora está substituindo, desde o segundo semestre de 2011, as traduções que confirmou como plágios.
– Nosso Departamento Comercial inscreveu esses títulos no programa da Biblioteca Nacional considerando que eles já teriam novas traduções até o fim da vigência do edital – diz Taís, que pedirá à FBN que remova temporariamente do cadastro os títulos cujas novas traduções ainda não estão prontas.
Segundo ela, a lista de livros que ganharão novas versões inclui, entre outros, “A mulher de trinta anos”, que será traduzido por Herculano Villas-Boas, “O lobo do mar”, por Marcelo Albuquerque, e “O médico e o monstro”, por Cabral do Nascimento. No cadastro da FBN, todos eles aparecem atribuídos a Pietro Nasseti.
Além dos livros da Martin Claret, Denise aponta irregularidades em títulos das editoras Escala (“Assim falou Zaratustra”, de Nietzsche) e Pillares (“A luta pelo direito”, de Rudolf von Ihering) incluídos no cadastro da FBN.
No dia seguinte à publicação desta matéria, Denise Bottmann publicou novas considerações à FBN em seu blog. Leia aqui.