No fundo das águas lodosas do rio Sena em Paris, na altura do museu do Louvre, mais precisamente em torno da Pont des Arts (somente para pedestres), acumulam-se milhares de chaves. Perdidas para sempre, jamais abrirão os cadeados que cobrem as duas muradas da ponte e selam simbolicamente o amor eterno, apaixonado e indestrutível. Pois esta crença teve duas consequências práticas: primeiro, cobriu com milhares de cadeados as duas pontes para pedestres que cruzam o Sena, uma em frente ao museu Quay d’Orsay (Rive gauche) e outra em frente ao Louvre (Rive droit) e, segundo, desenvolveu geometricamente o comércio de cadeados em torno do rio. Uma bela prova de amor que, se não for eterno, poderá pelo menos sugerir aos apaixonados, então separados, o final inesquecível de “Casablanca” quando, na dramática e definitiva despedida, um Humphrey Bogart dilacerado de amor diz à belíssima Ingrid Bergman: “ainda assim, sempre teremos Paris”… (Ivan Pinheiro Machado)
O dia contra a pobreza, por Eduardo Galeano
Página de Os filhos dos dias, mais recente livro de Eduardo Galeano.
Na crônica de Martha Medeiros, o novo livro de David Coimbra
Simples
Martha Medeiros*
“Afugento qualquer pretensão filosófica que dificulte o trato com as coisas simples.” Quando li essa frase de Nélida Piñon, tive vontade de ampliá-la, imprimi-la e pendurá-la na parede, só não o fiz porque não seria preciso: trago esse conceito já aderido na pele e na alma.
Talvez por isso tenha gostado tanto do novo livro do David Coimbra, Uma História do Mundo, que poderia ser considerado um projeto ambicioso, não fosse o David um homem consciente do tempo em que vive: quem, hoje, consegue dedicar-se a calhamaços com milhares de páginas? A vida exige dinamismo. David conseguiu apresentar um panorama histórico desde o neandertal até o início da civilização moderna em 260 páginas. E, nessas 260 páginas, além de traduzir informações sérias para uma linguagem divertida, ele conecta passado e presente utilizando trechos de Marcel Proust, Charles Bukowski e Mario Quintana, e ainda faz graça ao explicar de onde veio o nome da banda Jethro Tull. David é pop. A história do mundo também pode ser. Como?
Simples.
A simplicidade é a principal porta de entrada para a sabedoria. Dois, três degraus, e a pessoa está dentro. Uma vez seduzida, ela então irá decidir se deseja se aprofundar no assunto, e aí, lógico, irá buscar novos acessos que a façam imergir no que lhe interessa, e a viagem se tornará ainda mais excitante e talvez ininterrupta, mas o que a faz iniciar esse percurso rumo ao conhecimento é a curiosidade, a atração e a identificação com um linguajar que estabelece uma agradável comunicação.
O professor Cláudio Moreno faz o mesmo com suas crônicas sobre a Grécia Antiga. Alain de Botton elimina ao menos seis cabeças do monstro de sete que sempre foi a filosofia. Paulo Leminsky e demais poetas da geração anos 80 demonstraram que poesia não precisava ser necessariamente chata e incompreensível. A simplicidade sempre foi um dom, apesar de levantar suspeitas. Os impressionistas (Van Gogh, Monet, Cézanne, entre outros) foram inicialmente desprezados pelos críticos da época. As primeiras exposições desses artistas que hoje são considerados gênios se deram no “Salão dos Recusados”. Os impressionistas eram assim denominados porque pintavam a impressão em detrimento do detalhe. E toda impressão pode ser rapidamente confundida com impostura.
A simplicidade concentra a verdade das coisas – não toda a verdade, mas o seu núcleo, um ponto de partida universal, de onde tudo poderá se tornar mais abrangente, grandiloquente e complexo, à escolha do freguês.
Segundo o filósofo e escritor Eduardo Gianetti, muita gente só se impressiona com o que não entende bem. Já a simplicidade é direta, translúcida e estabelece rápida conexão. Para desconsolo dos herméticos.
*Esta crônica foi publicada originalmente na pg. 2 do Jornal Zero Hora em 17 de outubro de 2012.
Um retrato da nossa alma

Por Paula Taitelbaum*
Quantos anos eu tinha? Dezessete? Dezoito? Já não tenho mais certeza… Só lembro que entrei em um sebo de Porto Alegre e comprei duas edições muito antigas, puídas, em que as palavras ainda eram escritas com “ph”, ambas assinadas por Oscar Wilde: O retrato de Dorian Gray e O fantasma de Canterwille. Era uma época em que tudo o que era usado e velho me fascinava. As roupas, os móveis, os livros. Passados mais de vinte anos, sigo sendo um pouco assim, atraída pelo que tem jeito de passado. Infelizmente, a rinite já não me faz suportar o cheiro de mofo que vem dos sebos. Mas também não é nada que um bom antialérgico não cure…
Mas voltemos ao que interessa. Cheguei em casa com meu frágil livro de páginas titubeantes e mergulhei afoita na vida do belo Dorian, do pintor Basil, do cínico Lorde Henry e de todos e de tudo que a exuberante imaginação de Oscar Wilde foi capaz de criar. E mesmo que eu não tenha percebido na época a releitura de Wilde para o mito de Fausto – que vende a alma ao diabo em troca dos prazeres do mundo – eu me vi totalmente envolvida com a história do belo Dorian em meio às intrigas da sociedade inglesa do século XIX.
O retrato de Dorian Gray mostra como a paixão é capaz de capturar a alma e como a vaidade é responsável por criar uma prisão. Há algo de fantástico e sobrenatural nessa história. Mas também há muito de real em sua metáfora. E diálogos primorosos que chegam a arrepiar de tão espetaculares. “Quando o homem trata a vida com arte, o cérebro é o próprio coração” diz lá pelas tantas Lorde Henry. “Eu não quero saber de nada. Gosto de escândalos dos outros, mas escândalos meus não me interessam, pois não possuem o encanto da novidade.” fala Dorian Gray quando Basil pergunta se é verdade o que andam dizendo sobre ele.
O final do livro, lindo, repleto de tensão, é um dos mais incríveis que já li. E talvez a moral que reste seja a de que, como diria o próprio Dorian Gray, “dentro de nós, todos temos o céu e o inferno.”. Já a pergunta que paira no ar é: “Se nossa alma tivesse rosto, como ele seria?”

Sempre imaginei que a beleza de Dorian Gray deveria ser como a de Lord Byron. Mas cada um que imagine seu próprio Dorian
* Toda semana, a Série “Relembrando um grande livro” traz um texto assinado em que grandes livros são (re)lembrados. Livros imperdíveis e inesquecíveis.
Frankfurt 2012: destaques para a crise europeia e para o velho livro de papel
No exclusivo (e milionário) terreno dos bestsellers, o Brasil deu as cartas nesta Frankfurt de 2012. Em relação aos últimos 10 anos, o clima esteve ameno, pouca chuva, temperatura que nunca baixou dos 12, 13 graus, chegando até aos 18 graus na quinta-feira ensolarada. Lá dentro dos enormes pavilhões da Messe (“feira” em alemão), o clima era o mesmo. Não havia o “frisson” e a curiosidade pelos modelos futuristas que caracterizaram o célebre Salão do Automóvel de Frankfurt que ocorreu um pouco antes, entre 15 e 17 de setembro, neste mesmo local. Pelo contrário. Havia no ar uma calma resignação dos agentes literários e vendedores de direitos autorais diante do peso da crise econômica europeia e da austeridade pós-crise dos editores norte-americanos. E não deu outra; a feira ficou ligeiramente menor do que no ano passado, calcula-se uma queda entre 10 a 15 % em termos de participantes. E os brasileiros, mais do que nunca, foram cortejados – e como eu disse acima -, comandaram os grandes negócios da Feira. Primeiro, porque a economia está em ascensão e, segundo, porque o Brasil será o país homenageado da Feira em 2013.
Quem não escapou do clima recessivo foi o livro digital, o famoso e-book. Apesar da influência das grandes empresas de tecnologia sobre a mídia, nada de mais aconteceu. E quem, como eu, participou de mais de 60 reuniões em quatro dias, simplesmente não notou a agitação digital; ela não esteve no dia-a-dia da feira e dos negócios. Era voz corrente que será muito difícil, a médio prazo, se repetir na Europa e na América Latina o fenômeno digital que ocorreu nos EUA. Enfim, os profetas do fim do livro em papel ficaram confinados às palestras que se realizaram entre os encontros laterais da Feira. Estive numa; muitas cadeiras vazias no auditório – e notei que na plateia havia muito mais gente interessada no “business” do e-book do que no livro-conteúdo propriamente dito… (Ivan Pinheiro Machado)
Um ícone americano em Paris
Paris é imbatível quando trata-se de montar magníficas exposições ou retrospectivas dos grandes artistas da história. Nenhuma capital do mundo tem os espaços que a cidade disponibiliza para expor seus tesouros; Louvre, l’Oragerie, Grand Palais, Quai d’Orssay, – só para citar alguns. São museus e galerias que abrigam algumas das mais importantes obras de arte produzidas pela humanidade em toda a sua história. E, mais ainda, nenhuma grande cidade possui a estrutura de organização e pesquisa que é a alma destes mega-eventos artísticos. Afinal, uma equipe altamente preparada pesquisa e busca nos museus, galerias e coleções particulares de todo o mundo os quadros necessários para realizar uma mostra significativa e completíssima como costumam ser as grandes exposições “oficiais” em Paris. O destaque entre as grandes amostras é sem dúvida a mega-retrospectiva de Edward Hopper (1882-1967) um ícone americano, pintor da solidão, dos silêncios e da melancolia. Mas sobretudo o pintor que, em cenas de admirável imobilidade, revela a estética da América da primeira metade do século XX. Enorme, completíssima, cobrindo todos os períodos de sua vida produtiva (inclusive, “ça vas sens dire”, a temporada em Paris) nos EUA – especialmente no Withney Museum, que guarda a grande coleção doada pela viúva Hopper – jamais foi feita uma retrospectiva com a pompa e a circunstância que Paris dedica ao grande pintor. Inaugurada na semana passada, dia 8 de outubro, a exposição encerra em 25 de janeiro de 2013 quando então segue para o maior museu americano, o Metropolitan Museum of Arts de Nova York. (Ivan Pinheiro Machado)
Acorde! É Dia do Professor!
15 de outubro é o Dia do Professor. Nem todo mundo sabe, mas tudo começou em 15 de outubro de 1827 quando D. Pedro I baixou um Decreto Imperial, criando o Ensino Elementar no Brasil. Pelo descreto, ficava determinado que “todas as cidades, vilas e lugarejos tivessem suas escolas de primeiras letras”. Será que naquela época os alunos também davam suas dormidinhas em sala de aula?

Gostou da tirinha acima? Então conheça os livros do Snoopy da Coleção L&PM Pocket.
E por falar em escritor chinês…
O Prêmio Nobel de Literatura deste ano foi para um escritor chinês: Mo Yan. Nós não publicamos nenhuma obra dele, mas dá pra dizer que de China a gente entende. E muito. Leia o texto da editora Caroline Chang, publicado na mais recente Revista L&PM que trata justamente desse assunto: a variada gama de opções vindas diretamente das terras da grande muralha:
China para todos os gostos
Caroline Chang*
O Império do Meio sempre esteve entre os interesses da L&PM. Na década de 1990, bem antes do apogeu econômico de que a China hoje goza, a editora publicou Viajando de trem através da China, de Paul Theroux, um dos grandes nomes de livros de viagem. Theroux, já falecido, contava suas aventuras pelos quatro cantos do grande país do Extremo Oriente, no que hoje parece ser uma outra época. Nosso outro viajante célebre é Marco Polo, autor de O livro das maravilhas; neste pequeno volume, narra-se as viagens do veneziano, na segunda metade do século XIII, que tantas descobertas propiciou aos europeus sobre os costumes e as tradições chinesas.
Outro livro incontornável é Os analectos, de Confúcio. Aqui encontram-se reunidos os ensinamentos e provérbios do grande sábio, cujo sistema ético ainda permeia o pensamento chinês. Para melhor compreender a complexa identidade chinesa, nada melhor do que se debruçar sobre a milenar, conturbada e interessantíssima história do país: em China, uma nova história, John King Fairbank e Merle Goldman recontam, de forma deliciosa, o passado e os principais momentos do país, dos primórdios até o início do século XXI; trata-se do melhor título disponível ao leitor brasileiro para se entender a formação da civilização chinesa. No atualíssimo China moderna, o sinólogo e historiador Rana Mitter fornece um breve resumo histórico, mas, sobretudo, aborda os lances mais importantes da história recente do país, como a abertura econômica e o Massacre da Praça da Paz Celestial, e explica os desafios que se impõem hoje à China. Para aqueles que se interessam por ideogramas, o volume Escrita chinesa, da francesa Viviane Alleton, desvenda as principais características desse tipo de registro.
País milenar, a China é rica em folclore. Um pouco do grande repertório chinês de histórias orais pode ser conferido em 50 fábulas da China fabulosa; a edição – bilíngue – é ilustrada por desenhos de papel de seda delicadamente recortado. Uma seleção deste título também pode ser conferido em Fábulas chinesas, da série 64 Páginas. Já Contos sobrenaturais chineses, ricamente ilustrado com bonecos de teatro de sombra (outra arte popular chinesa) dá ênfase especial para fantasmas, aparições e magia.
Em Os anos de fartura, Chan Koonchung fornece uma visão contemporânea para a China de hoje. Banido no país e inspirado em clássicos distópicos como 1984, de George Orwell, o romance se passa na China de 2014. Chan Koonchung retrata um país hegemônico economicamente, mas sem liberdade política, e, num exercício de imaginação, reflete como seria viver nessa realidade.
Finalmente, entre os livros mais recentes, está Poemas clássicos chineses, de Li Bai (701-762), Du Fu (712-770) e Wang Wei (701-761), as mais importantes vozes da poesia clássica chinesa. Com organização e tradução do chinês feita por Sérgio Capparelli e Sun Yuqi, este livro da Coleção L&PM Pocket traz 95 poemas em edição bilíngue.
Ou seja: depois de tudo isso, dá pra dizer que a China é aqui…
* Caroline Chang é editora da L&PM e descendente de chineses. Além dos livros citados por ela, a L&PM lançará, ainda este ano, Não tenho inimigos, desconheço o ódio: escritos e poemas escolhidos, livro de Liu Xiaobo, Prêmio Nobel da Paz 2010.














