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O que Mark Twain pensaria disso?

Ilustração da primeira edição do livro, em que aparecem Huck e Jim

Uma nova edição norte-americana da obra As aventuras de Huckleberry Finn, de Mark Twain, vai chegar às livrarias com uma alteração no vocabulário original. Todas as 219 vezes em que a palavra “nigger” aparece foram substituídas pelo termo “slave”. A justificativa apresentada pela editora South Books é a necessidade de adaptar a história aos currículos escolares. Literalmente, “nigger” significa “negro” ou “preto”, sempre relacionado à cor de pele, o que, segundo o professor Alan Gribben – que leciona literatura na Universidade Alburn e foi quem propôs a alteração para a South Books – pode ser entendido como uma manifestação racista.

Como era de se esperar, a decisão causou polêmica. Alguns acusam a South Books de tentar “sanear” o livro ao substituir o termo original que reflete as relações sociais do século 19.

Aqui no Brasil, o lançamento da nova edição de As aventuras de Huckleberry Finn pela Coleção L&PM Pocket está previsto para março, com tradução de Rosaura Eichenberg. Segundo ela, a palavra “nigger” aparece da primeira à última página, mas em nenhum momento pode ser entendida como uma manifestação racista. Rosaura explica que, no contexto da época, usar “nigger” para se referir a pessoas de pele escura era usual e livre de carga discriminatória ou ofensiva. Na edição da L&PM, a tradutora optou por utilizar “nigger” de forma literal como “preto” ou “negro”, justamente porque, em suas pesquisas sobre o contexto social da época, o termo era livre de qualquer conotação para além da cor da pele.

“Se a necessidade é adaptar a obra aos currículos escolares, em nome da moral puritana, deveriam cortar o personagem principal, que mente todo o tempo”, brinca a tradutora. Para ela, a adaptação pode ser entendida como censura, pois priva os estudantes de conhecer a realidade social da época em que a obra foi escrita. Ela lembra ainda o ocorrido aqui no Brasil com a obra de Monteiro Lobato e questiona: “Quem virou mais racista por causa da Tia Anastácia?”

E você, o que acha disso?

As salas onde nasceram os clássicos

Se olhasse pela janela entre uma página e outra de seu O som e a fúria, que paisagem Faulkner veria? E o que mais dividia espaço com os originais de Moby Dick na mesa de trabalho de Melville? Afinal, quais ambientes inspiraram estes e outros autores a criar as grandes obras da literatura mundial? O livro American Writers at Home tenta saciar parte desta curiosidade trazendo fotos do interior da casa de 21 escritores americanos, entre eles William Faulkner e Herman Melville. A autoria das imagens é da fotógrafa novaiorquina Erica Lennard.

Provavelmente, algumas das obras mais famosas de Faulkner foram concebidas sob influência da paisagem desta janela, na casa onde o escritor morou em Oxford, Mississipi.

Ernest Hemingway, autor do famoso Por Quem os Sinos Dobram, criava suas histórias nesta sala bem iluminada em sua casa na ilha de Key West, Florida.

Eugene O’Neill trabalhava e recebia visitas numa ampla sala na cidade de Danville, Califórnia. Alguns dos prêmios Pulitzer conquistados pelo dramaturgo provavelmente foram concebidos lá.

Huckleberry Finn, escrito por Mark Twain e considerado por Faulkner a melhor obra da literatura moderna americana, e As aventuras de Tom Sawyer podem ter sido criados em meio a bagunça desta mesa:

Além destes, é possível conhecer um pouco da intimidade de outros grandes nomes da literatura mundial como Louisa May Alcott, Kate Chopin, Emily Dickinson, Frederick Douglass, Ralph Waldo Emerson, Robert Frost, Nathaniel Hawthorne, Washington Irving, Robinson Jeffers, Sarah Orne Jewett, Henry Wadsworth Longfellow, Edna St. Vincent Millay, Flannery O’Connor, Eudora Welty, Edith Wharton e Walt Whitman.

As últimas palavras dos escritores

O site do jornal britânico The Guardian publicou uma matéria bem legal sobre as últimas palavras de célebres escritores. Selecionamos algumas delas (em tradução livre):

The Guardian publicou uma seleção de “últimas palavras” / Reprodução

Mark Twain: Death, the only immortal, who treats us alike, whose peace and refuge are for all. The soiled and the pure, the rich and the poor, the loved and the unloved. (“Morte, a única imortal, que nos trata da mesma forma, para a qual paz e refúgio são para todos. O sujo e o puro, o rico e o pobre, o amado e o não-amado.”)
Essa nota foi encontrada no leito de morte do autor de Tom Sawyer e publicada em uma coletânea de 1935. Depois de sofrer um ataque cardíaco em Bermudas, Twain voltou para sua casa em Connecticut para se recuperar. Previu em 1909 que iria “sair de cena” com o cometa Halley – que tinha aparecido no ano de seu nascimento. E morreu um dia depois da maior aproximação do astro com a Terra. De acordo com seu biógrafo, ele disse: “’Adeus’, e o Dr. Quintard, que estava perto, achou que ele tinha acrescentado: ‘Se nós nos encontrarmos’ – mas as palavras foram muito fracas.”

Emily Dickinson: I must go in, the fog is rising. (“Eu devo ir, o nevoeiro está aumentando.”)
A saúde de Dickinson piorou consideravelmente nos últimos anos de sua vida, até que ela finalmente ficou presa à cama, limitando-se a escrever pequenas notas. Seu médico considerou como causa da morte a doença de Bright, um mal renal agora chamado de nefrite.

Robert Louis Stevenson: What’s that? Do I look strange? (“O que é isso? Eu pareço estranho?”)
Com a saúde debilitada desde 1880 (ele morreu em 1894), o autor de O médico e o monstro mudou-se para Samoa na tentativa de uma recuperação. Stevenson provavelmente morreu de hemorragia cerebral. De acordo com sua biógrafa, “no fim da tarde, ele desceu as escadas falando sobre um tour de palestras na América que estava ansioso por fazer, já que estava ‘se sentindo tão bem’… de repente ele colocou as duas mãos sobre a cabeça e gritou: ‘o que é isso?’ Aí ele perguntou logo depois: ‘eu pareço estranho?’” E logo que fez isso caiu de joelhos ao lado dela.

Anton Tchékhov: It’s a long time since I drank champagne. (“Fazia muito tempo que eu não bebia champanhe.”)
Já doente terminal, foi com a esposa Olga para Badenweiler, no interior da Alemanha. Mais tarde, ela recordou seus últimos momentos: “Anton sentou-se estranhamente reto e disse alta e claramente (embora não soubesse quase nada de alemão): ‘Ich sterbe’ (estou morrendo). O doutor o acalmou, pegou uma seringa, aplicou uma injeção e pediu champagne. Anton pegou uma taça cheia, examinou-a, olhou pra mim e disse: ‘Fazia muito tempo que eu não bebia champagne’. Aí ele bebeu tudo, colocou a taça do seu lado esquerdo sem fazer barulho e eu só tive tempo de correr até ele, me inclinar sobre a cama e chamá-lo, mas ele tinha parado de respirar e estava dormindo tranquilamente como uma criança.”

Franz Kafka: Dearest Max, my last request: Everything I leave behind me … in the way of diaries, manuscripts, letters (my own and others’), sketches, and so on, (is) to be burned unread. (“Querido Max, meu último pedido: tudo que eu deixo pra trás… diários, manuscritos, cartas (minhas próprias e de outros), sketches, e assim por diante, deve ser queimado antes que possa ser lido.”)
O bilhete foi deixado por Kafka pouco antes de morrer de tuberculose em um sanatório perto de Viena. Como se sabe, Max Brod não cumpriu o último pedido do amigo, o que resultou agora, em 2010, numa grande disputa judicial pelos direitos do material deixado por Kafka.

Virgínia Woolf: I feel certain that I’m going mad again… (“Tenho certeza de que estou enlouquecendo de novo…”)
Temendo que estivesse a beira de mais uma crise, Woolf suicidou-se enchendo seus bolsos de pedras e afongando-se no Rio Ouse. O corpo só foi encontrado vinte dias depois. O bilhete que deixou para o marido dizia: “Tenho certeza de que estou enlouquecendo de novo… Eu sinto que não podemos passar novamente por outro daqueles tempos terríveis. E não acho que vou me recuperar dessa vez. Comecei a ouvir vozes e não consigo me concentrar. Então estou fazendo o que parece ser o melhor a fazer… Eu não posso continuar a estragar a sua vida por mais tempo. Eu não acho que duas pessoas poderiam ter sido mais felizes do que nós fomos.”

Leia a íntegra da matéria aqui.

Original inédito de Mark Twain é vendido nos Estados Unidos

Os leilões estão mesmo bombando nos últimos dias (vide post anterior sobre a máquina de escrever do Kerouac). O inédito “A Family Sketch”, de Mark Twain, foi vendido por mais de US$ 242 mil na última quinta-feira, bem mais que os US$ 180 mil esperados pelos organizadores. O comprador não foi identificado.

O manuscrito era uma homenagem do autor de As aventuras de Tom Sayer a sua filha, Olivia “Susy” Clemens (para os mais desavisados, o verdadeiro nome de Mark Twain é Samuel Langhorne Clemens). Susy inspirou duas das histórias do pai e morreu aos 24 anos, depois de contrair meningite.

“A Family Sketch”, de 64 páginas, estava entre outros duzentos manuscritos, cartas e fotografias de Twain. O restante dessa coleção de documentos, que pertencia ao executivo James S. Copley, deve ser vendida por no mínimo US$ 750 mil.

Autobiografia de Mark Twain finalmente será publicada

Antes de morrer em 1910, Mark Twain pediu que a autobiografia escrita nos últimos dez anos de sua vida só fosse publicada 100 anos após a sua morte. Se você tem conhecimentos básicos de matemática, já entendeu: esse ano será lançada a autobiografia do autor de O príncipe e o mendigo. Ou pelo menos parte dela. São aproximadamente cinco mil páginas que devem ser divididas em três volumes pela Universidade de Berkeley, na Califórnia, onde os originais estavam guardados. No livro, Twain fala sobre o relacionamento escandaloso que teve com Isabel Van Kleek Lyon, sua secretária que, dizem as más (ou boas) línguas, chegou até a lhe dar brinquedinhos sexuais. Ele revela também que tinha reservas quanto à ação americana em Cuba, Porto Rico e nas Filipinas. As críticas de cunho político são, aliás, um dos motivos apontados para o “atraso” na publicação da obra. O lançamento do primeiro volume está previsto para novembro.