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Allen Ginsberg e seu bairro

Allen Ginsberg morreu em 5 de abril de 1997. Dois dias depois, o The New York Times publicou um texto, escrito por Frank Bruni, que mostra a  relação do autor de Uivo com seu bairro. Reproduzimos aqui (em uma livre tradução) alguns trechos desse texto.

A última foto que Ginsberg tirou, de dentro do seu apartamento, no dia 1 de abril de 1997

A última foto que Ginsberg tirou, de dentro do seu apartamento, no dia 1 de abril de 1997

Nos últimos anos, Allen Ginsberg embaralhou-se por restaurantes, livrarias e lavanderias à seco, em torno de seu loft na East 13th Street, próximo à First Avenue. Ele foi em muitos aspectos uma figura normal, um velho e barbudo homem em sua marcha descontraída, de óculos, parecendo tão familiar.

Mas para os que conseguiam colocar um nome naquele rosto, Mr. Ginsberg era maior do que a vida, uma ponte que retrocedia à história ilustre de um lugar que ele, como se fosse uma pessoa qualquer, havia ajudado a colocar no mapa cultural.

Na verdade,  Mr. Ginsberg recebeu atenção do mundo inteiro, mas sempre foi um ícone e uma criatura de “downtown Manhattan”, com sua visão de mundo forjada numa mistura de paixões políticas e sexuais, com suas excentricidades nutridas por aqueles que circulavam num submundo peculiar, sua individualidade confundida entre o mito e o boêmio de East Village, onde ele fez sua casa.   

“Ele encarnava o East Village e o Lower East Side”, disse ontem Bill Morgan, amigo e arquivista de Mr. Ginsberg. “Isso o afetou, assim como ele afetou o lugar. Ele era um pararraios para o ativismo político e para as questões sociais que eram jogadas aqui”.

Mr. Ginsberg morreu de câncer no fígado na madrugada de sábado em seu apartamento, com 70 anos. Ele viveu nesse lugar por cerca de seis meses, mas tinha passado quase duas décadas em um apartamento há menos de um quarteirão de distância, na East 12th Street, também perto da First Avenue. (…)

Downtown Manhattan jamais teria evoluido dessa maneira sem Allen Ginsberg. Entre 1980 e 1990, Mr. Ginsberg permaneceu ativo e altivo em torno do bairro e de outros lugares da cidade, embora menos extravagante. Frequentemente, ele realizava leituras de poesias e no último ano, no Knitting Factory, ele recitou toda a sua obra por mais de 10 noites seguidas. Ele tentou cultivar jovens poetas, deu aulas na faculdade do Brooklyn durante os últimos 10 anos e apoiou ativamente o projeto de poesia da Igreja de St. Mark´s, na East 10th Street. Dois meses atrás, ele participou de um comício em apoio aos ocupantes de um prédio na East 13th Street. Ao longo do tempo, de alguma forma, o bairro passou por Mr. Ginsberg. Apesar de não ter perdido suas preciosas qualidades de poliglota e pansexual, o lugar tornou-se menos anárquico, mais luxuoso, um alvo para a “enobrecimento urbano” e um imã para uma nova geração de “sibaritas”, muitos dos quais não partilham da consciência política radical de Ginsberg e nem ao menos têm consciência de seu trabalho.  

“Os jovens que se mudaram para este bairro há dois anos não sabem o que Ginsberg significou para ele”, disse ontem Peter Orlovsky, companheiro de Mr. Ginsberg por quatro décadas. Isso pode explicar porque não houve nenhuma manifestação de grande dor por sua perda por aqui, apenas emoções esparsas de pessoas que sentiram, por motivos que talvez nem consigam explicar, que deveriam fazer algo para homenagear a passagem desse homem.  Mitch Corber, 47, que foi para os degraus da Igreja St. Mark’s para recitar um poema que ele escreveu em homenagem a Ginsberg, lembrou que ele não era apenas um artista, mas um ativista que lutou pela liberdade e aceitação dos homossexuais. Mas Sonia Allin, 24, que também gravitava em torno da St. Mark´s, foi menos clara sobre o porquê dela estar lá. “Eu o vi algumas vezes pelo bairro”, disse a Srta. Allin sobre Ginsberg. “Ele ficou muito chateado comigo quando eu lhe disse que sua poesia não falava para minha geração porque estava excessivamente enraizada nos anos 60.” Ah Chong Lan, uma garçonete do Noodle Mee´s Shop e Grill, na First Avenue, o restaurante chinês favorito de Mr. Ginsberg, lembrou que ele era bastante simples e falava de forma bem leve. Claro, ela sabia que ele era alguém importante, um artista. Isso ela poderia dizer a partir de conversas que ouviu e de como os outros, às vezes, apontavam para ele quando entrava. Mas a Srta. Chong disse que ele era, principalmente, um homem sem frescuras, que desejava e confiava no linguado feito no vapor com molho de gengibre. “Quando ele entrava”, ela disse, “nós sabíamos o que ele queria.”  

Allen Ginsberg no bairro que escolheu como seu

Allen Ginsberg no bairro que escolheu como seu

A mesa de trabalho do poeta beat como ele a deixou. Entre os objetos e livros, uma coletânea de poemas de seu pai, Louis Ginsberg

A mesa de trabalho do poeta beat como ele a deixou. Entre os objetos e livros, uma coletânea de poemas de seu pai, Louis Ginsberg

Um tour Jack Kerouac pela Big Apple

Vai para Nova York? Que tal fazer um tour Jack Kerouac pela cidade? Sugerido pelo kerouacsnewyork.tripod.com, a lista inclui bares, restaurantes, parques e igrejas. O roteiro traz apenas locais que ainda existem e alguns deles estão aqui para que você possa colocar o pé na estrada e viajar pelo mundo de Kerouac. Mas sem esquecer de levar seus livros na bagagem, é claro.

White Horse Tavern –  567, Hudson St.
Kerouac morou em frente a esta taverna do século 19. A sala de madeira do bar ainda é a original e eles oferecem uma boa seleção de cervejas, incluindo Ale White Horse. Outros grandes escritores que costumavam frequentar o White Horse: Dylan Thomas, Norman Mailer e Hunter S. Thompson.

Saint Patrick´s Cathedral – 5th Ave. com 49th St.
Localizada em Midtown, a poucos passos do Rockefeller Center, esta bela catedral costumava receber a visita de Kerouac. Pegue a sua cópia de “Visões de Cody” e veja se você consegue encontrar o vitral citado por Jack no livro.

The former Hurley’s Saloon – 6th Ave. com 49th St.
Jack Kerouac costumava frequentar este lugar, principalmente nas noites de sexta-feira, algumas vezes para ver o jazzista Lee Konitz tocar. Só que agora, no lugar do bom e “Velho Saloon”, há um restaurante chique. Então resta fazer algumas fotos da fachada – que é igual a que Jack conheceu.

Manny´s Music Store – 156 W 48th St
Jack seguiu Lee Konitz até esta “loja de música dos hipsters e Symphony Sid”. Vale a visita para comprar uma palheta personalizada ou apenas para conhecer a parede de fotos autografadas.

Washington Square Park – no final da 5 ª Avenida
O parque onde Kerouac costumava ir é um dos principais marcos do Greenwich Village e um espaço famoso por sua tradição de inconformidade. Além da estátua de George Washington, ali também está uma escultura de Garibaldi.

Statue of Samuel Cox – 7th St. perto da esquina com a Avenue A
Em uma cidade repleta de monumentos, as pessoas facilmente passam despercebidas pela estátua de Samuel Cox, no East Village. No entanto, ela é notável para os fãs de Kerouac por causa da famosa fotografia que Allen Ginsberg fez de Jack onde ele aparece de boca aberta com esta estátua ao fundo.

Minetta Tavern – 113 MacDougal St.
Este velho restaurante italiano ainda continua funcionando. Certamente, a atmosfera não deve ser mais a mesma do tempo em que William Burroughs levava Kerouac e outros beat para jantares finos por lá.

Gas Light Cafe – 116 MacDougal St.
A Gas Light foi berço dos saraus poéticos do Village. Jack e todos os grandes leram seus textos por lá. Bob Dylan também tocou por lá no começo de sua carreira (e inclusive morou no andar de cima).

Para completar, ainda há o Café Reggio na MacDougal St., 121; o Kettle of Fish também na MacDougal, mas no número 114; a “Our Lady of Guadalupe”, uma das igrejas favoritas do escritor que fica na 229 W 14th St. e o Glen Patrick´s que era um pub frequentado por Kerouac quando ele morava em Richmond Hill.

Múltiplos olhares sobre Allen Ginsberg

Pelo jeito, o Howl Festival 2011 realizado de 3 a 5 de junho em Nova York para comemorar o aniversário de Allen Ginsberg foi um sucesso! Basta dar uma olhada nas notícias e fotos da festa que circularam na internet desde o primeiro dia. Como de costume, o festival abriu com uma leitura em grupo de Howl (Uivo), o longo e célebre poema de Ginsberg que dá nome ao evento. Ainda na programação, vários shows de música, apresentações de dança, performances, poesia e até um carnaval infantil.

Ao longo do Tompkins Square Park, que fica no East Village, bairro em que Allen Ginsberg morou até o fim da vida, diversos artistas gráficos também prestaram sua homenagem ao poeta. Fazendo uma busca simples por “Howl Festival 2011” no Flickr, você encontra uma verdadeira cobertura fotográfica colaborativa do evento:

(passe o mouse sobre as fotos para ver os créditos ou clique para ir direto ao perfil do fotógrafo no Flickr)

howl festival 2011

Art Around the Park, Howl Festival 2011, East Village, New York City - 3

ginsburg, allen at Howl

P1050565

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P1050551

Quer ver mais fotos? No Flickr há centenas delas! Clique aqui e sinta o clima do que foi o Howl Festival 2011.

Para comemorar o aniversário de 85 anos de Allen Ginsberg

“Allen Ginsberg nasceu em Mewark, Nova Jersey, a 3 de junho de 1926, filho de Louis e Naomi Ginsberg, ambos de famílias de judeus russos emigrados. Seu pai foi poeta e professor de literatura no secundário. Chegou a ser publicado em antologias importantes e frequentou círculos literários de prestígio. Sua mãe, também professora, passou boa parte da vida internada, vítima de esquizofrenia paranóica. Por isso, a infância e juventude de Ginsberg em Paterson, para onde logo se mudaram e Louis passou a lecionar, foram difíceis e dolorosas. Convivendo com crises e dificuldades, Ginsberg cresceu, contudo, em um ambiente culto, pelas leituras e pela produção do pai, e politizado, também por influência de Louis, socialista, e de Naomi, comunista militante. O drama familiar o levou a interrogar-se sobre sua identidade, seu papel na sociedade e no mundo. Contribuiu para que desenvolvesse, como observam seu biógrafo Barry Miles e outros comentaristas, tolerância e simpatia pela loucura e excentricidade, quer fossem de personalidades da literatura, os escritores visionários e desregrados, ou das pessoas com quem conviveu durante o período de formação da Geração Beat nos anos 40 e 50, e ao longo do restante da sua vida” (Claudio Willer* no prefácio de “Uivo“)

Allen Ginsberg, que faleceu em 5 de abril de 1997, faria 85 anos hoje. Para comemorar a data, desde 2003, seus fãs organizam o Howl! Festival em Nova York. É uma grande festa que começa no dia 3 de junho e vai até o dia 5, com eventos de música, dança, poesia e até um carnaval infantil. Basta chegar e participar. A comemoração acontece no Tompkins Square Park, que fica no East Village, bairro em que Ginsberg morou até o fim da vida.  Como de costume, o festival abre com um grupo de leitura de “Howl” (Uivo), o longo e pulsante poema de Ginsberg. No ano passado, cerca de 100 mil visitantes celebraram as palavras de Ginsberg. Quem estiver em Nova York já tem programa pra este final de semana.

*Claudio Willer realizou a tradução, seleção e notas de “Uivo” – editado em formato convencional e pocket pela L&PM