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Os 70 anos do Dia da Vitória

Foi em 8 de maio de 1945 que, esgotados, os alemães assinaram sua rendição, marcando a data como o “Dia da Vitória”. Terminava assim a maior e mais sangrenta guerra de todos os tempos. Sete décadas depois, nesta sexta-feira, 8 de maio de 2015, serão muitos os eventos pelo mundo que lembrarão os 70 anos do fim da Segunda Guerra Mundial.

No Brasil, entre os destaques está a inauguração de mostra fotográfica “70 anos do fim da 2ª Guerra Mundial / Grande Guerra Patriótica” com imagens raras extraídas dos antigos arquivos soviéticos. A exposição acontece em São Paulo, na Biblioteca Latinoamericana Victor Civita. Na abertura, às 18h, haverá apresentação do Quarteto Romanov. A entrada é gratuita e a mostra permanecerá até 6 de junho.

Uma das fotos da mostra

Uma das fotos da mostra

Para marcar estes 70 anos, a L&PM Editores acaba de reeditar A Última Batalha, de Cornelius Ryan, o clássico relato da ofensiva que derrubou o Terceiro Reich.

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Baseando-se tanto em fontes oficiais e entrevistas com líderes militares quanto em depoimentos de soldados e civis, Ryan escreveu uma obra impregnada de tensão humana. A luta diária dos civis para sobreviverem na capital alemã bombardeada e às vésperas da invasão, os impasses políticos e diplomáticos dos bastidores da guerra, o que pensavam os militares próximo à vitória e à derrota e muitas outras histórias são contadas neste livro pelo escritor que reinventou e humanizou a literatura de guerra.

 

 

 

 

Que dia… Que livro

Por Goida*

Poucas semanas antes de começar o “Dia D”, o desembarque das forças aliadas na Normandia, o Marechal Rommell disse ao seu lugar-tenente W. Lang: “As primeiras vinte e quatro horas da invasão serão decisivas… o destino da Alemanha depende desse resultado… para os aliados, do mesmo modo que para nós, será o mais longo dos dias… o dia mais longo do século.”

O nosso encontro com esse longo dia, o primeiro da chamada “Operação Overlord”, foi através dos jornais que se seguiram àquele 6 de junho de 1944. Pouco depois, chegaram as imagens da invasão na cine-atualidades norte-americanas, que eram exibidas na grande maioria dos cinemas de Porto Alegre. Uma visão quase só gloriosa e épica daquela gigantesca saga militar. Nada sobre as incontáveis baixas na praia de Omaha. Nada sobre o massacre quase total dos paraquedistas aliados que tentaram, na madrugada do 6 de junho, marcar pontos de apoio para as tropas invasoras.

Em 1963, lá em Montevidéu, encontrei uma edição do livro O mais longo dos dias de Cornelius Ryan – em espanhol, claro – com imagens reais do desembarque e também cenas do filme produzido por Darryl F. Zanuck para a Fox, em 1962, e ainda não exibidas no Brasil. Era um super espetáculo com três horas de duração, dividido em três campos: o Exército Nazista, os aliados (norte-americanos, canadenses, ingleses) e alguns civis franceses, ligados à chamada “Resistência” contra os invasores alemães. O filme teve três diretores – Gerd Oswald, Ken Annakin e Andrew Marton – mas o próprio Zanuck chegou a dirigir algumas sequências. Cornelius Ryan havia participado do roteiro, com mais cinco escritores (entre eles Romain Gary). Todos ouviam uma exigência quase constante de Zanuck, que pedia: “Usem, o máximo possível, os fatos e os personagens descritos na obra de Ryan”. Cornelius, como correspondente de guerra, esteve na invasão da Normandia e também em outros pontos do conflito na Europa. Para escrever o livro sobre o “Dia D”, ele entrevistou mais de mil sobreviventes, sintetizando tudo numa obra compacta de 300 páginas, de absorvente leitura. A obra é dedicada “para todos os homens do Dia D”.

Curiosamente, só bem depois da morte de Cornelius (1974), o diretor Steven Spielberg  resolveu abordar o tema do desembarque dos aliados em Ohama. O título do filme foi  O resgate do Soldado Ryan (1998, vejam até coincidência nos nomes). A história parecia tirada de O mais Longo dos Dias.

Em junho de 2014 lá se irão 70 anos dessa operação armada que mudou os rumos da Segunda Guerra Mundial. Ainda na Normandia se encontram milhares de sepulturas dos soldados que lá pereceram. Cornelius Ryan ajudou a imortalizá-los neste livro magnífico que tem a mesma força – sem romantismo – do Guerra e Paz de Tolstói.

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 *Jornalista, crítico de cinema e pesquisador. Este texto foi escrito especialmente para o Blog da L&PM.

“O mais longo dos dias”: a obra prima de um correspondente de guerra

O irlandês Cornelius Ryan não foi um correspondente de guerra qualquer. Nascido em 1920 em Dublin, tinha pouco mais de 20 anos quando cobriu os conflitos da Segunda Guerra Mundial, entre 1941 e 1945, para a agência de notícias Reuters e para o jornal britânico London Daily Telegraph. Participou de catorze missões de bombardeio junto às forças aéreas norte-americanas, do desembarque no Dia D, do avanço aliado através da França e da Alemanha e, após os últimos meses da campanha no Pacífico, tornando-se um dos mais proeminentes correspondentes de guerra da época. Seu trabalho baseava-se tanto em fontes oficiais e entrevistas com líderes militares quanto em depoimentos de soldados comuns e civis, de modo que toda a sua obra está impregnada de uma forte tensão humana. Foi com rigor  jornalístico de detalhes e informações e com extrema compaixão com dramas das pessoas envolvidas que Ryan escreveu uma trilogia da segunda guerra mundial que começa com O mais longo dos dias, lançado originalmente em 1959 e que está focado no Dia D, quando as tropas aliadas desembarcaram na Normandia para expulsar a Alemanha da França.

Cornelius Ryan

Cornelius Ryan

O mais longo dos dias vendeu cerca de quatro milhões de exemplares em quase 30 línguas e foi levado às telas do cinema em 1962, em uma megaprodução internacional de mesmo nome sob direção de Darryl F. Zanuck e estrelado por grandes atores da época como Henry Fonda, Robert Mitchum, John Wayne e Sean Connery.

Robert Mitchun em ação no "Mais longo dos dias" cinematográfico

Robert Mitchun em ação no “Mais longo dos dias” cinematográfico

Em 1973, Cornelius Ryan recebeu a medalha da Legião da Honra do governo francês. Morreu de câncer no ano seguinte.

A L&PM publica O mais longo dos dias  em pocket e também em formato 14cm X 21cm.

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A polêmica biografia de Kurt Vonnegut

Um curioso duelo intrigou o mundo literário esta semana. De um lado, o escritor Charles Shields, que acaba de lançar um livro de 528 páginas sobre a vida de Kurt Vonnegut, o autor de Café da manhã dos campeões e Matadouro 5. De outro, Mark Vonnegut, filho de Kurt, que acusa Shields de ter feito um retrato equivocado se seu pai no livro And so it goes.

Segundo o biógrafo, Kurt Vonnegut era um velho amargo e solitário, que estava sempre irritado e tinha tendências depressivas, além de tratar mal suas esposas. O levantamento realizado por Shields sugere ainda que o autor do libelo pacifista Matadouro 5 era proprietário de parte das ações da empresa Dow Chemical, fabricante do napalm, usado em bombas incendiárias e lança-chamas no início da Segunda Guerra Mundial e na Guerra do Vietnã.

Além de contraditória (se compararmos com a mensagem que Kurt Vonnegut nos deixou por meio de sua obra), a biografia tropeça em outro problema: segundo Mark, o biógrafo conviveu pouquíssimo tempo com seu pai e as informações que ele apurou sobre a infância e a família do escritor também não são bem assim. Shields conta que Kurt Vonnegut foi uma criança triste, com problemas afetivos, e que seu pai era distante. Mark desmente.

Ele admite que Kurt Vonnegut “não era um homem ou um pai perfeito e teve dois casamentos fracassados”, mas o retrato que Shields pintou com estas “tintas” não mostra a realidade.

“Guernica” por Carlos Saura

Guernica é preto, (…) como as manchetes dos jornais da época que dizem ao homem da rua, preto no branco, sua terrível verdade. É preto, cinza e branco como os filmes de atualidades e as fotos do front de Biscaia (…), de trama tão contrastada que ferem o olhar antes mesmo que se tenha identificado a imagem.

A composição, muito plástica, ordenada, harmoniosa, é forte, monumental, como convinha a uma decoração mural numa tal circunstância. É claramente figurativa, violentamente expressiva, com uma intensidade dramática que vai além do fato da atualidade, mostrando o que há nele de universal e de atemporal. A cidade é apenas simbolizada numa arquitetura elementar de fundo de cenário. Nada mostra uma Guernica real. Não se vêem aviões, nem bombas. A única arma é uma espada quebrada, na mão de um homem caído no chão em primeiro plano, de olho ainda aberto. À esquerda, uma mãe segura um filho morto (a julgar pela maneira como sua cabeça cai pra trás), berra de dor diante de um touro majestoso, tranquilo. Do outro lado, o duplo dessa mãe ergue os braços ao céu. Diante dela, uma terceira mulher, parcialmente ajoelhada, de rosto menos atormentado, estende-se em direção à dupla luz de uma lâmpada elétrica no teto e de uma lamparina nas mãos de uma quarta figura feminina, da qual somente aparece a cabeça, enorme. No centro, um cavalo parte em direção ao fundo do quadro e se volta, relinchando. Muitos serão os que tentarão decifrar esse conjunto de sinais, como se cada um devesse receber uma significação precisa; mas Picasso se contentará sempre em dizer que o cavalo é um cavalo, o touro é um touro, e que a força e a riqueza dos símbolos é que se pode interpretá-los amplamente.

O texto acima é uma releitura da Guernica, de Pablo Picasso, feita pelo biógrafo Gilles Plazy para a Série Biografias. Um dos quadros mais célebres do pintor espanhol também já ganhou diversas versões em murais e telas mundo afora e até em 3D. E agora chegou a vez do cinema se apropriar de uma das obras mais emblemáticas da história ocidental moderna.

Carlos Saura (o mesmo diretor de “Carmen” e “Tango”) está preparando um longa de ficção chamado “33 dias”, em referência ao tempo que Picasso levou para pintar a Guernica. Em entrevista ao jornal O Globo, o diretor disse que pretende “mostrar como o governo espanhol, em plena Guerra Civil, encomendou a Picasso um quadro de 8 m x 4 m para o pavilhão da Espanha na Feira Internacional de Paris, em 1937, para o qual colaboraram artistas como Miró, Dalí, Calder, Henry Moore e Luis Buñuel”. Em abril daquele mesmo ano, a cidade de Guernica, na Espanha, foi bombardeada por aviões italianos e alemães. Aquele foi um ensaio para os extermínios de civis realizados ao longo da Segunda Guerra Mundial e a fonte maior de “inspiração” para Picasso.

Saura quer retratar também aspectos da vida afetiva de Picasso que, segundo ele, se confundem com o processo de criação da Guernica. Dora Maar, pintora e fotógrafa francesa, amante de Picasso, registrou dia a dia a evolução do quadro. “As fotos feitas por Dora estão no Reina Sofía, assim como os esboços usados por Picasso para fazer uma pintura que pode ser encarada como um dos testemunhos mais impressionantes da inutilidade da guerra”, diz.

Saura ainda não definiu quem será o ator que interpretará Picasso no filme e, por enquanto, se ocupa com a escolha das locações na Espanha e em Paris. O filme “33 dias” ainda não tem data de estreia, mas é certo que sai em 2012, ano em que o diretor espanhol completa 80 anos de vida e 55 anos de carreira.

“Matadouro 5”: a trágica comédia da guerra sem glamour

Matadouro 5” de Kurt Vonnegut é um clássico. Antes de ser um livro “pacifista”, ele é um livro engraçado e sobretudo dolorido, muito longe da glamourização da guerra feita por Hollywood. O centro de tudo é a desastrada participação de Billy Pilgrin na guerra. Foi para o combate, acabou preso pelos alemães e foi testemunha – desde o porão numero 5 de um matadouro – do pior bombardeio da Segunda Guerra; a destruição da bela cidade de Dresden pela força aérea norte-americana. Foi lá que os aliados resolveram fazer uma “operação exemplar” contra os alemães. O resultado foi a morte de 135 mil pessoas, a esmagadora maioria mulheres, velhos e crianças. Havia poucos soldados em Dresden, pois era tida como “cidade aberta”, nome que se dava às cidades que, pelos seus tesouros arquitetônicos, os dois lados concordavam em não bombardear. Mas mesmo assim ela ficou igual à superfície da lua. Afinal, a guerra não tem regulamento, não tem dó nem piedade. Em “Matadouro 5” o gênio de Vonnegut faz com que a história fuja sempre do melodrama. Ele é irônico, tragicômico, satírico e delirante. Seu personagem voa pelo tempo, circula pela guerra, pelo american way of life e pelo planeta de Tralfamador que fica a 717.960.000.000.000.000 km da Terra. A maestria narrativa de Vonnegut põe o leitor em alerta máximo permanente. A morte circunda a história até quase perder a importância. O livro é inundado pela doentia solidão de Billy Pilgrin, o homem que estava em Dresden. Coisas da vida, como ele costuma dizer no livro, sempre que fala da morte.

Quando se chega ao fim, temos a noção muito clara do que é a grande literatura. Sob o clima satírico, quase humorístico, tudo é amargo. E Vonnegut chega à dolorosa conclusão de que o ser humano é inviável e não há heróis quando se matam pessoas. Não importa o lado em que elas estejam. (Ivan Pinheiro Machado)

Em 1972, “Matadouro 5” – cujo título original é Slaughterhouse-Five – foi adaptado para o cinema com direção de George Roy Hill (o mesmo de “Butch Cassidy an the Sundance Kid”) e ganhou três Globos de Ouro na época. Veja o trailer: