Maria Aparecida Botelho Pereira Soares*
A leitura dos textos literários russos costuma causar alguma dificuldade por causa da grande variação dos nomes dos personagens; por isso, para facilitar, damos aqui uma visão geral de como os russos costumam se dirigir uns aos outros. De acordo com a tradição russa, as pessoas são registradas com três nomes: um prenome (geralmente simples, raramente composto): Anna, Ivan; um patronímico, que é formado a partir do prenome do pai e os sufixos -itch, -ovitch ou -evitch: Ilitch (de Iliá), Ivânovitch, para homens, e -ovna ou -evna para mulheres: Ivânovna, Andrêievna; um sobrenome de família, geralmente o do pai: Gorbatchov, Tchékhov, Dostoiévski.
Na linguagem coloquial, o patronímico masculino costuma ser abreviado: em vez de Aleksândrovitch, torna-se Aleksândrytch (o y representa aí uma vogal posterior, quase um [u] sem arredondamento dos lábios); Ivânovitch se torna Ivânytch. A maneira respeitosa de se dirigir a uma pessoa que ocupa um lugar de destaque na sociedade ou é mais idosa é usar sempre o prenome seguido do patronímico: Maria Ivânovna, Piotr Vassílievitch (ou Vassílhitch numa situação menos formal).
Para crianças, usa-se um apelido. Os russos têm apelidos (às vezes mais de um) para os nome mais usados. (Para fazer uma analogia, no romance Quincas Borba, de Machado de Assis, não era difícil para os contemporâneos deduzir que o personagem se chamava Joaquim, porque Quincas era um apelido usual para Joaquim, assim como Quinzinho; da mesma forma todos sabem que se alguém é chamado de Chico, seu nome de batismo é Francisco, e Chico é um apelido). Em russo, se uma menina se chama Tatiana, ela será chamada pelo apelido de Tânia, e um menino chamado Vladímir será chamado de Volódia. O nome Ielena tem apelidos como Lena e Liôlia. Esses apelidos são também usados informalmente para adultos, no seio da família ou entre colegas. Quando se trata de criados, empregados, pessoas de status inferior, pode-se usar somente o prenome, sem o patronímico (nestas novelas vamos encontrar Iákov, Vassíli), ou então um apelido (Macha, Gacha). Os russos são altamente afetivos no tratamento interpessoal e utilizam inúmeros diminutivos. Esses diminutivos podem incidir no prenome ou no apelido. Por exemplo, O nome de Tolstói, Lev, pode receber os diminutivos Lévotchka e Levucha, maneira afetuosa como ele era chamado pela esposa e parentes; o apelido de Ivan, Vânia, pode ganhar os diminutivos Vaniucha, Vânitchka ou Vanka (este último tem uma nuance pejorativa e nunca era usado para nobres); o apelido de Iekaterina, Kátia, pode ter os diminutivos Kátenka, Katiucha ou Katka, estes dois últimos mais usados nas camadas populares.
* Este texto é um trecho da introdução escrita por Maria Aparecida Botelho Pereira Soares para “Infância, Adolescência, Juventude“, livro de Tolstói traduzido por ela direto do russo.
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O encontro entre Tchékhov e Tolstói
Havia três anos que Tchékhov vivia em Melikhovo, na província de Moscou, e continuava sempre arranjando uma desculpa para não visitar a não muito distante fazenda de Yasnaya Polyana. Até que tomou coragem e resolveu apresentar-se ao proprietário do local, ninguém menos do que o conde Tolstói.
Em agosto de 1895, Tchékhov finalmente bateu à porta do autor de Guerra e Paz. Mas chegou bem na hora em que o mestre, vestindo uma camisa branca de linho, dirigia-se ao riacho para tomar um bom banho. Tolstói convidou Tchékhov para acompanhá-lo. Chegando lá, o mais velho tirou a roupa e mergulhou na água, enquanto o mais novo permaneceu sentado à margem. Imerso até o pescoço, com a barca branca flutuando, Tolstói conversou com seu visitante.
Naquele dia, Tchékhov passou a noite em Yasnaya Polyana, depois de lerem em voz alta passagens da primeira versão de Ressurreição, livro que Tolstói iniciara naquele ano e que viria a ser seu último romance, publicado em 1899.
Depois do encontro, Tolstói disse que gostou de Tchékhov, mas que achou que faltava a ele um ponto de vista. Isso porque Tchékhov preferiu omitir suas opiniões, contrárias às do anfitrião, já que Tolstói, por exemplo, opunha-se à educação de nivel superior, à propriedade privada e até mesmo à prática da medicina.
Mais tarde, eles se encontrariam de novo e então discutiriam suas diferentes visões de mundo. E apesar das rivalidades filosóficas, Tchékhov preocupava-se com a saúde de Tolstói e o chamava de “velho manhoso”. Costumava dizer também que “Enquanto houver um Tolstói na literatura será agradável e prazeroso ser escritor”.
Tchékhov e Tolstói também estão juntos na Coleção L&PM Pocket e na “Caixa especial literatura russa“.
No iníco de 2013, será lançado “Infância. Adolescência. Juventude” de Tolstói.