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Você precisa conhecer Hélio Silva

Hélio Silva foi um homem singular. Nasceu em 1904 e morreu em 1995. Médico de formação, jornalista de profissão e historiador de vocação passou a dedicar-se exclusivamente ao jornalismo na década de 30 e rapidamente tornou-se um colunista influente. Sua carreira foi interrompida devido ao movimento revolucionário de 1930 que o proibiu de exercer a profissão. Mas logo voltou à ativa para ser o chefe da sucursal no Rio da recém-fundada Folha da noite, de São Paulo. Colaborou durante muitos anos no Jornal do Brasil. Em 1949, a convite de Carlos Lacerda, assumiu o cargo de redator-chefe da Tribuna da Imprensa. E foi justamente no jornal de Lacerda, em 1959, que ele começou a publicar suas pesquisas de história contemporânea.

Meticuloso, Hélio teve o privilégio de viver a história do século e registrá-la com maestria. Percebeu desde cedo que poderia ter o depoimento “ao vivo” dos atores desta história. E com isso reuniu um imenso arquivo sobre a história republicana brasileira. Um conjunto de documentos e depoimentos sem igual que deu origem ao seu monumental “Ciclo de Vargas”. Uma série escrita em colaboração com a historiadora Maria Cecília Ribas Carneiro que inicia com a história da Proclamação da República, em 1889 e atravessa os séculos no Brasil.

1964 – Golpe ou contragolpe é um complemento a “Ciclo de Vargas” e foi publicado pela primeira vez pela L&PM Editores em novembro de 1978, em plena ditadura militar. Agora, no ano em que completa 50 anos do golpe, o livro de Hélio Silva volta repaginado. Esta obra apresenta fatos que se interpenetram com os volumes da série, personagens comuns, novos e antigos protagonistas, herdeiros de velhas tradições, sempre tendo como foco o golpe de 1964. Hélio Silva foi narrador, personagem e testemunha dessa história, com a autoridade de um intelectual que, no dizer de Antônio Houaiss, foi “dos mais destacados entre os estudiosos brasileiros (do que quer que seja) e merece a consagração de todos os seus compatriotas”.

No início dos anos 90, Hélio Silva fez voto de pobreza e recolheu-se ao Mosteiro de São Bento no Rio de Janeiro, onde morreu em 21 de fevereiro de 1995. Mas ainda é tempo de conhecê-lo através de livros como 1964 – Golpe ou Contragolpe. Uma obra que segue tão atual quanto antes.

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“Março de 1964 é um episódio da Guerra Fria. Já é possível analisá-lo no confronto das correntes históricas antagônicas, nas marchas e contramarchas do processo renovatório. Esse choque se reflete nas Formas Armadas, mais nitidamente a partir da Segunda Guerra Mundial. A FEB traz, em seus heróis, os líderes dos grupos que se defrontarão em 1945, 1950, 1955, 1961 e 1964.”

55. Hélio Silva: o autor do monumental “Ciclo de Vargas”

Por Ivan Pinheiro Machado*

Hélio Silva foi um homem singular. Viveu o século XX, pois nasceu em 1904 e morreu em 1995. Formou-se em Medicina, foi um urologista respeitado no Rio de Janeiro e, como médico, publicou mais de 50 artigos científicos. Paralelamente, exerceu o jornalismo. Ou, como ele dizia, conseguiu a proeza de exercer suas duas paixões, o jornalismo e a medicina. Na década de 30, passou a dedicar-se exclusivamente ao jornalismo e rapidamente tornou-se um colunista influente. Sua carreira foi interrompida devido ao movimento revolucionário de 1930 que proibiu-o de exercer a profissão. Mas logo voltou a ativa para ser o chefe da sucursal no Rio da recém-fundada Folha da noite, de São Paulo. Colaborou durante muitos anos no Jornal do Brasil. Em 1949, a convite de Carlos Lacerda, assumiu o cargo de redator-chefe da Tribuna da Imprensa. E foi justamente no jornal de Lacerda, em 1959, que ele começou a publicar suas pesquisas de história contemporânea. 

Meticuloso, Hélio teve o privilégio de viver a história do século e registrá-la com maestria. Percebeu desde cedo que poderia ter o depoimento “ao vivo” dos atores desta história. E com isso ele reuniu um imenso arquivo sobre a história republicana brasileira. Um conjunto de documentos e depoimentos sem igual que deu origem ao seu monumental “Ciclo de Vargas”. Uma obra que inicia com a história da Proclamação da República, em 1889, e termina com a história do Golpe de 1964. São 16 volumes, sete mil páginas: 1889 – A República não esperou o amanhecer (L&PM); 1922– Sangue na areia de Copacabana (L&PM); 1926 – A grande marcha (L&PM); 1930 – A revolução traída; 1931 – Os tenentes no poder; 1932 – Guerra paulista; 1933 – A crise no tenentismo; 1934 – A constituinte; 1935 – A revolta vermelha; 1937 – Todos os golpes se parecem; 1938 – Terrorismo em campo verde; 1939 – Vésperas de guerra; 1942 – Guerra no continente; 1944 – O Brasil na guerra; 1945 – Por que depuseram Vargas; 1954 – Um tiro no coração (L&PM); 1964 – Golpe ou contragolpe (L&PM).

Uma das raras imagens do "professor" Hélio Silva

Municiado por arquivos importantes, como de Getúlio Vargas, Oswaldo Aranha, entre muitos outros, Hélio Silva construiu o “Ciclo de Vargas” com a autoridade do testemunho, da proximidade do fato histórico e da sua isenção. Sua obra é fundamental para a compreensão do Brasil do século XX e referência para todas as análises e teses correntes sobre este período.

Lima e eu conhecemos Hélio em 1976. Ele veio a Porto Alegre dar uma palestra no colégio que meu pai, o advogado Antonio Pinheiro Machado Netto mantinha em Porto Alegre. Nesta ocasião, conforme já tratamos no post “A ditadura que odiava livros – parte II” ele nos ofereceu as memórias do Gal. Olympio Mourão Filho que lhe doara no leito de morte com a promessa de publicá-la. Nós topamos o desafio, publicamos e o livro foi apreendido pela ditadura. Leia o post e conhecerá os detalhes desta aventura.

Publicamos vários livros do “professor”, como gostávamos de chamá-lo. Sua produção era enorme e qualificada. Durante toda a sua vida de historiador, contou com a colaboração fundamental da também historiadora Maria Cecília Ribas Carneiro. Era uma homem extremamente católico, modesto, suave e generoso. E um grande trabalhador. Era fanático pela história do seu país e nada o detinha na busca de fatos, explicações e documentos. Quando o conhecemos, ele tinha 73 anos e uma enorme vitalidade. Em 1990, ele resolveu renunciar a todos os bens materiais, fez voto de pobreza e passou a ser monge beneditino recolhido no Mosteiro de São Bento no Rio de Janeiro, onde morreu em 21 de fevereiro de 1995, aos 91 anos.

Hélio Silva e a historiadora Maria Cecília Ribas Carneiro

*Toda terça-feira, o editor Ivan Pinheiro Machado resgata histórias que aconteceram em mais de três décadas de L&PM. Este é o quiquagésimo quinto post da Série “Era uma vez… uma editora“.