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Andy Warhol fora da latinha

O artista multimídia Scott Blake criou um mural com um grande retrato de Andy Warhol feito com códigos de barras iguais aos de supermercado. Cada um dos códigos corresponde a um tipo de comida enlatada da marca Campbell’s – os códigos que formam o rosto de Andy são curvados para imitar o formato cilíndrico das latas. O jogo é simples: ao escanear um código com um leitor daqueles de supermercado, é exibido um vídeo que mostra o conteúdo de uma daquelas latas sendo consumido. Para quem sempre se limitou a apreciá-las nas telas de Andy Warhol, mas nunca teve a oportunidade de abrir uma, eis a chance de desfazer o mistério.

Em meio às latas, Scott escondeu umas surpresinhas: alguns códigos exibem outros vídeos do criador da pop art, como a famosa sequência em que ele aparece comendo calmamente um sanduíche ou ainda cenas do filme Basquiat em que Andy Warhol é interpretado por David Bowie.

Quem quiser saber mais sobre as famosas telas com as latas Campbell’s, vale ler os Diários de Andy Warhol e o volume Andy Warhol da Série Biografias, ambos publicados pela L&PM.

54. Andy Warhol, o retorno

Por Ivan Pinheiro Machado*

No post numero 22 destes relatos memorialísticos sobre a história da L&PM Editores, contei a história de um grande fracasso de vendas, os “Diários de Andy Wahrol”, edição de Pat Hackett, lançado em 1989. O investimento foi de, na moeda de hoje, cerca de 70 mil dólares. Era um livro enorme, 1.000 páginas no formato 23 cm x 16 cm. Só a tradução custou 30 mil dólares (1.500 laudas)… E o preço para o público, convertido para o dinheiro de hoje, ficou em R$ 120,00. Mais da metade da tiragem encalhou e os livros remanescentes  acabaram, meses depois, fazendo a festa dos leitores nos balaios de saldos das principais feiras de livro do país. Tudo isto, em 1989.

Pois em setembro de 2011, a L&PM decidiu recomprar os direitos e FAZER DE NOVO os diários de Andy Warhol. O leitor, agora ciente dos prejuízos que este livro causou no passado, perguntará perplexo: “Vocês enlouqueceram?!”

Pode ser. Tudo começou neste ano, quando decidimos lançar a excelente biografia de Andy Warhol em nossa “Série Biografias” (com previsão para chegar em dezembro), que publicaremos em colaboração com a respeitadíssima editora francesa Gallimard. No embalo da biografia, surgiu a possibilidade de editarmos o livro “America” de Andy Warhol. Foi aí que começamos a discutir a questão dos “Diários”. Que tal republicá-los?

Inclusive me propus a fazer uma “edição” dos livros, “limando” as passagens sem importância e deixando só o substancial. Para que ficasse mais barato e prático. Propusemos ao agente literário encarregado do espólio, reeditar o livro com a metade das páginas. Depois de muitas idas e vindas, os agentes americanos toparam. Foi então que eu iniciei a tarefa de cortar 50% dos diários. Nas primeiras 10 páginas, eu havia deletado no máximo metade de… UMA página. Prossegui, li, li de novo e lá pela página 300 eu cheguei à conclusão de que seria um crime cortar um dia sequer, uma linha que fosse daquele diário.

Como editor, eu deveria publicar na íntegra ou não publicar. O livro não ficara “melhor” do que em 1989, mas me dei conta de que havia uma razão maior que trazia uma nova dimensão aos “Diários”: o passar do tempo. Passados 22 anos da publicação e 25 anos da morte de Andy Warhol, aumentou radicalmente a importância dele e de muitos personagens que frequentam os suas páginas. Por exemplo, o grande cult da chamada “arte de rua” Jean Michel Basquiat, morto em 1988, aos 28 anos, um ano após a morte de Andy Warhol, é mencionado inúmeras vezes, pois foi uma descoberta do criador do Pop. Ele diz em 4 de outubro de 1982: “O Basquiat é o garoto que usava o nome de ‘Samo’ quando sentava na calçada do Greenwich Village e pintava camisetas, e de vez em quando eu dava 10 dólares para ele e mandava ao Serendipity para tentar vendê-las. Era apenas um daqueles garotos que me enlouqueciam. É negro, mas algumas pessoas dizem que é porto-riquenho, aí sei lá. (…)” Enfim, são centenas de pessoas do show business, das artes, da realeza européia, do rock and roll, do punk rock, da literatura, moda, imprensa, teatro, cultura underground, jet set em geral, milionários, drogados famosos, enfim, gente que superou a sua previsão de que “um dia todos vão ter pelo menos 15 minutos de fama”.

25 anos depois, este livro se tornou história. Uma fonte de referência para se entender as décadas do fim do século XX, a cultura da celebridade, a contra-cultura novaiorquina da época, a estética do Pop, o cinema underground e conhecer os registros praticamente diários desta grande aventura da última jornada verdadeiramente de vanguarda da arte moderna. Até as frivolidades que permeiam em abundância este livro adquirem agora um significado histórico. É Nova York pré-11 de setembro. A grande Meca da modernidade, cujos sonhos transgressores e vanguardistas derreteram junto com as torres gêmeas.

Por isso e muito mais nós decidimos encarar o desafio. Mas desta vez “Os diários de Andy Warhol” serão editados na coleção L&PM POCKET em dois volumes de 600 páginas cada um. O primeiro vai de 1976 até 1981 e o segundo, de 1982 até 1987.

O preço dos dois volumes juntos será, pelo menos, a metade do que custava a fracassada versão de 22 anos atrás. Assim, eu considero respondida a pergunta do leitor perplexo. Acho que ainda não enlouquecemos. Pelo menos não por enquanto.

* Toda terça-feira, o editor Ivan Pinheiro Machado resgata histórias que aconteceram em mais de três décadas de L&PM. Este é o quinquagésimo quarto post da Série “Era uma vez… uma editora“.