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Cara a cara com os maiores escritores do mundo

Por Paula Taitelbaum*

Sou um gênio. Tive uma ideia de roteiro para um filme. Vou vender para Hollywood. Não, pensando bem, vou oferecer a Woody Allen. De graça. O storyline é o seguinte: a moça vai visitar a National Portrait Gallery, em Londres, e, de repente, todos os escritores que estão nas telas, pintados em diferentes épocas, ganham vida e se misturam. Como assim isso não passa de um misto de “Uma noite no museu” com “Meia noite em Paris”? Ok, você venceu, sou um fracasso como roteirista…

Brincadeiras à parte, esta ideia é meio inevitável quando se visita a National Portrait Gallery, um museu único e exclusivamente dedicado a retratos. Lá, estão os originais de muitas das imagens que conhecemos – e outras que não são tão populares assim. Telas com imagens de Shakespeare, das irmãs Brontë, de Robert Louis Stevenson, de Jane Austen, de Charles Dickens, de Lord Byron, de Jonathan Swift. As fotos (e não as reproduções) de Oscar Wilde, Edgar Allan Poe, Virginia Woolf, James Joyce, Beatrix Potter… Imagina se eles se descolassem dali!

Só os escritores entrariam no meu filme, mas claro que não são apenas eles que estão pelas paredes. Há reis, rainhas, nobres, pintores, músicos, políticos, celebridades, cientistas (o portrait de Darwin é impressionante!), inventores, roqueiros e ricos das mais variadas espécies. Há pinceladas de todos os famosos que o Reino Unido já viu e produziu.

Vá a Londres, visite a National Portrait Gallery. E depois me diga se o meu roteiro, mesmo que óbvio, não seria um sucesso…

Eu e Shakespeare, feitos um para o outro

Eduardo Bueno e Robert Louis Stevenson

Eu e as irmãs Brontë, na tela sozinha está Emily Brontë, autora do "O morro dos ventos uivantes"

Jane Austen, desenhada por sua irmã (e eu no reflexo)

Charles Dickens era lindo!

Mas Lord Byron era mais lindo ainda!

 *Paula Taitelbaum e Eduardo Bueno visitaram a National Portrait Gallery no final de junho.

O ardente The Globe

Por Paula Taitelbaum

Era verão e o público lotava  o The Globe naquela noite de 29 de junho de 1613 para mais uma estreia de Shakespeare. O céu estava limpo e, sob ele, a maioria dos espectadores permanecia em pé aguardando o início de “Henrique VIII”. Eles eram os chamados “groudlings” e se amontoavam em volta do palco, ao ar livre, em pé ou sentados no chão. No The Globe, uma construção octogonal de madeira, era possível acomodar até três mil pessoas e os que tinham mais recursos sentavam-se nos bancos cobertos. Sob o palco, alguns alçapões guardavam surpresas para durante a encenação. Sobre o tablado, havia uma galeria para ser usada em cenas de varanda, saídas e entradas dos atores ou para os músicos entoarem as canções da peça. 

O espetáculo então teve início e, mais uma vez, ele parecia mostrar que o texto de Shakespeare seria um sucesso. Envolvido nas tramas e dramas do monarca Henrique, o público estava concentrado quando soou o tiro de canhão de uma das cenas. O susto foi grande. Além do estrondo, ele acabou atingindo o telhado do lugar. O fogo espalhou-se rapidamente. E assim, em menos de uma hora, há exatos 398 anos atrás, o The Globe, popular teatro de Londres, foi totalmente consumido pelas chamas. Ninguém se feriu e a maioria dos figurinos e adereços das peças de Shakespeare conseguiram ser resgatados do incêndio.

Apesar do incidente, o teatro que era chão de Shakespeare foi logo reconstruído. Mas em 1642, com os puritanos no poder –  e franzindo a testa para qualquer tipo de entretenimento – o governo ordenou que todos os teatros locais fossem fechados. Desta vez, o The Globe não resistiu às fúria flamejante de gente como Oliver Cromwell, líder da Guerra Civil Inglesa, e sucumbiu, sendo demolido em 1644. Felizmente, Shakespeare, que morrera em 1616, não assistiu a esta triste cena.

Foi só a partir de 1970 que começou-se a falar novamente no The Globe e na possibilidade de uma reentrada dele nos circuito de teatros londrinos, com uma campanha liderada pelo ator e diretor britânico Sam Wanamaker. Anos depois, tiveram início as pesquisas arqueológicas para encontrar o local aproximado do The Globe original e uma réplica do antigo teatro começou a ser erguida em 1989, num terreno que, tudo indica, fica a 100 metros de onde estava o antigo. 

Em 1999, o Shakespeare´s Globe Theatre foi inaugurado, mantendo exatamente as mesmas características daquele erguido à beira do Tâmisa em 1542. A peça que abriu a temporada do novo teatro foi justamente uma das primeiras de Shakespeare a ser encenada no velho The Globe: “Henrique V“.

O Shakespeare Globe na beira do Tâmisa

Hoje, lá está ele imponente em seu estilo “retrô”. E basta pagar uma bagatela de 5 libras para sentir-se um verdadeiro “groudling” dos tempos shakespearianos. Foi o que eu fiz há cinco dias atrás. A tarde estava linda e, sob o céu azul, comprei ingresso para um espetáculo que começava às 14h (há sessões às 14h e às 19h30min). A única ironia é que, justamente naquele dia, a peça em cartaz não era assinada pelo do dono da casa, mas por seu maior concorrente: Christopher Marlowe. Mesmo assim, valeu assistir a “Doctor Faustus” à beira de um palco que, naquele momento, fiingi ser o mesmo em torno do qual Shakespeare orbitava.

Consegui um bom lugar na beira do palco - Foto: Eduardo Bueno

Às 14h em ponto os músicos se acomodaram na galeria - Foto: Paula Taitelbaum

Queria ver Shakespeare, mas era dia de Marlowe - Foto: Paula Taitelbaum

 O Shakespeare´s Globe tem uma lojinha ótima. E o melhor é que dá pra comprar pela internet. Dá uma olhada.

O lugar onde nasceu Peter Pan

“Vocês precisam entender que será difícil acompanhar as nossas aventuras se não se familiarizarem com o Kensington Gardens, se não o conhecerem tão bem quanto David o conhece. O Gardens fica em Londres, onde vive o rei, e as crianças o visitam todos os dias, a não ser que estejam decididamente febris, mas ninguém jamais conseguiu percorrer muito rápido. (…) O Serpentina começa aqui perto. É um lago encantado, e há uma floresta submersa no fundo dele. Se você espiar na beira da água, verá as árvores todas crescendo de lá para cá, e dizem que no período da noite também existem estrelas submersas no lago. Se existem mesmo, Peter Pan as vê quando está velejando pelo lago no Ninho de Tordo. Só uma pequena parte do Serpentina fica no Gardens, pois ele logo passa por baixo de uma ponte e se estende para muito longe, até a ilha na qual nascem todos os pássaros que viveram meninos e meninas. Ninguém que seja humano, exceto Peter Pan (e ele é apenas meio humano), consegue chegar até a ilha, mas você pode escrever o que deseja (menino ou menina, moreno ou loiro) num pedaço de papel e depois dobrar o papel em forma de barco e lançá-lo na água, e ele chega à ilha de Peter depois do anoitecer.” (Trecho do primeiro capítulo de Peter Pan em Kensington Gardens)

Se você morasse na frente do Kensignton Garden, como J. M. Barrie um dia morou, provavelmente também ficaria inspirado a criar alguma história, quem sabe um poema, de repente uma música. Os recantos verdes, o lago Serpentine, a ilha cravada na água, as árvores retorcidas, a ponte e os pássaros e tudo o mais que se estendia além das janelas de Barrie, serviu de estímulo para que o escritor criasse os cenários do mundo de Peter Pan. Eu estive lá na semana passada. Eu vi Peter de perto. Eu senti vontade de mergulhar no lago para procurar suas árvores submersas (mas avisos indicam que você não deve tocar na água, pois as algas verdes podem causar “danos à saúde”). Eu atravessei a rua e fiquei orbitando em volta da casa que um dia foi de Barrie. E mesmo que o novo proprietário tenha posto tapumes para evitar as fotos, nós subimos no muro e clicamos o jardim onde muito provavelmente um dia Sir James tomou o seu chá inglês das cinco. (Paula Taitelbaum, que esteve em Kensignton Garden na quinta-feira passada com Eduardo Bueno e fez as fotos abaixo)

O lago Serpentina percorre o Kensington Gardens

As águas e os recantos formam uma paisagem encantada

A seta indica que Peter Pan está por perto

E aqui está ele bem no meio do parque!

O bronze da escultura foi doado pelo próprio J.M. Barrie

Atravessando a rua, chegamos na casa de esquina que um dia foi do escritor

A placa deixa claro que ele morou mesmo aqui

Será que tem alguém em casa?

Como ninguém atendeu, Eduardo Bueno resolveu dar uma espiadinha

E conseguiu fazer uma foto do jardim que um dia foi de Barrie

(se quiser ver mais fotos do passeio pela terra de Peter Pan, vá até a nossa galeria no Flickr e divirta-se!)

Kensington Gardens é um parque público de Londres que fica junto ao Hyde Park. O lago Serpentine (Serpentina) foi criado no séc. XVIII a pedido da esposa do rei George II, Carolina de Ansbach. Há alguns anos, ali também foi construido um memorial em homenagem à Princesa Diana.

O sonho de consumo do tradutor de “On the road”

Foi ao entrar na famosa e tradicional livraria londrina Foyles que Eduardo Bueno, o tradutor de On the road, viu seu lado consumista ser consumido pelo desejo. Lá estava uma linha inteira de acessórios para quem quer colocar o pé na estrada junto com Jack Kerouac: agenda, capa de passaporte, garrafa térmica, caderno, eco bag, chaveiro, identificador de bagagem e necessaire de On the road.

Kit completo da Penguin para quem quer colocar o pé na estrada.

Obviamente, Eduardo não se conteve e comprou cinco dos itens oferecidos:

Eduardo Bueno e seus objetos de desejo.

Os objetos são um oferecimento da editora Penguin e ocupam um canto inteiro da Foyles, livraria que tem tudo a ver com o livro de Kerouac, já que tem a maior sessão de livros e de literatura de viagem do Reino Unido. A Foyles ocupa cinco andares de um prédio de tijolos à vista na Charing Cross Road, rua que foi eternizada no filme Nunca te vi, sempre te amei (cujo título original é 84 Charing Cross Road).

Mas é bom dizer que a rua e a região inteira sofreram o impacto da chegada dos e-books e as pequenas livrarias estão todas fechando suas portas. Felizmente, a Foyles persiste e resiste no mesmo endereço desde 1903, no número 121 e, em 2010, foi eleita a melhor livraria da Inglaterra. (Paula Taitelbaum, direto da Charing Cross Road)

Londres tem sangue azul

Alguém duvida de que Londres tem sangue azul? Pois eis que as ilhas de Shakespeare, Conan Doyle, Oscar Wilde, J. M. Barrie, Agatha Christie, Jane Austen e tantos outros soberanos literatos tem sido invadida por belgas, que são mais azulados do que o sangue real que corre nas veias da rainha Elizabeth. Neste final de semana, tanto na vitrine de uma loja em Notting Hill como numa banquinha de quinquilharias da Feira de Brick Laine, lá estavam eles: os Smurfs.

Smurfs na vitrine de uma loja em Notting Hill (clique para ampliar)

Smurfs na banquinha de quinquilharias da Feira de Brick Laine (clique para ampliar)

Criados pelo cartunista Peyo (Pierre Culliford) em 1958, essa parece ser a prova de que os pequenos seres azuis parecem ter mesmo voltado à moda. Isso que o filme deles ainda não estreou e o livro da L&PM ainda nem chegou. (Paula Taitelbaum, diretamente de Londres)

O famoso Grupo de Bloomsbury

1905 foi um bom ano para Virginia Stephen. Com pouco mais de vinte anos, ela começou a dar aulas de literatura a operárias no Morley College. Ao mesmo tempo, todas as quintas-feiras à noite, os amigos de seu irmão Thoby se encontravam na casa dos Stephen, na região londrina de Bloomsbury. Entre eles estavam o pintor Duncan Grant, o crítico de arte Clive Bell e os escritores E. M. Forster, Lytton Strachey e Leonard Woolf (futuro marido de Virginia). Destes encontros semanais, nasceria o “Grupo de Bloomsbury” que perduraria por mais de trinta anos. Ao longo deste tempo, outros artistas, filósofos e intelectuais (entre eles o economista John Keynes) foram se juntando ao consagrado bando, enquanto um emaranhado de relações amorosas se entrelaçava entre eles. O registro romântico dos membros do Bloomsbury, aliás, demonstra que eles estavam muito a frente das convenções inglesas da época. Em 1925, Virginia, que então deixara de ser Stephen e se tornara Woolf, viveu uma tórrida paixão com a também escritora Vita Sackville-West, participante do grupo. O romance entre as duas daria origem ao livro Orlando, escrito por Virginia em 1927. As paixões gays e bissexuais seriam o ponto alto do Bloomsbury.

Os escritores Lytton Strachey e Virginia Woolf, membros do Grupo de Bloomsbury. Mesmo gay, ele propôs casamento a Virginia antes dela casar-se com Leonard Woolf

A vida social do grupo girava em torno de várias casas de campo e os amigos costumavam passar as férias juntos na França, Itália e Grécia. Entre as casas mais badaladas estavam a de Virginia e Leonard e também a de Lady Ottoline Morrell, uma rica socialite, mecenas das artes inglesas. Foi Lady Morell, inclusive, que inseriu no grupo artistas como o coreógrafo e bailarino Frederick Ashton e a estrela do ballet russo Lydia Lopokova.

E se o grupo há décadas não existe mais, a região de Bloomsbury continua lá, abrigando o Museu Britânico, a Academia Real de Arte Dramática, a Universidade de Londres e até uma placa em homenagem a Virginia e seus amigos.

A placa em homenagem ao grupo

Para saber um pouco mais sobre o assunto, não deixe de ler Virginia Woolf, livro recém lançado na série Biografias L&PM.

O que você acha de passar o Natal na casa de Charles Dickens em Londres?

Ainda não sabe onde vai passar o Natal? Pois o Museu Charles Dickens, em Londres, vai receber visitantes durante todo o período natalino. Nos dias 24, 25 e 26 de dezembro, entre às 11h e 18h, as portas da casa que um dia foi de Dickens estarão abertas com uma programação especial. A decoração vitoriana vai demonstrar como o autor de Um Conto de Natal comemorava a data com sua família. Além da exposição especial, também serão exibidos filmes baseados na história do personagem Scrooge e acontecerão leituras das obras do escritor inglês. Mas o melhor de tudo é que o ingresso de 14 Libras para adultos e de 6 Libras para crianças inclui um copo de vinho quente preparado segundo uma receita do próprio Charles Dickens, bolo e pudim de Natal e até um presente surpresa. Os ingressos podem ser adquiridos com antecedência ou no dia. O Museu Charles Dickens fica na 48 Doughty Street, Bloomsbury, Londres. Ainda dá tempo de comprar a passagem. Mas, caso você não consiga ir, clique aqui e faça um passeio virtual pela casa.

A L&PM publica Um Conto de Natal (A Christmas Carol), de Charles Dickens, na Coleção L&PM POCKET. Você certamente conhece a história de Scrooge, o famoso avarento que, na véspera de Natal, é visitado por três fantasmas. Tio Patinhas (que originalmente tem o nome de Uncle Scrooge) foi explicitamente inspirado neste personagem de Dickens.

A primeira vez de Otelo

“Pudesse a terra ser fecundada por lágrimas femininas, de cada gota por ela derramada nasceria um crocodilo.” Assim disse Otelo, o mouro personagem de Shakespeare que deixou-se consumir pelo ciúmes que sentia da amada Desdêmoda. A peça teria sido apresentada pela primeira vez no dia 1º de novembro de 1604 no Whitehall Palace em Londres. De lá para cá, foi publicado em livro (a primeira edição em 1622, depois da morte de seu criador) e continuou sendo encenada e aplaudida pelos palcos do mundo. Em 1995, o ator afro-americano Laurence Fishburne foi escolhido para viver Otelo no filme de Oliver Parker. Por incrível que pareça, antes disso, nenhum negro havia recebido o papel no cinema. Veja o trailer do filme na L&PM Web TV.

O russo Constantino Stanislavski encarnou Otelo em 1896. Seu rosto recebeu uma pintura mais escura para viver o mouro de William Shakespeare

Paul Robeson como Otelo e Peggy Ashcroft como Desdemoda, encenando a peça em Londres, 1930. Ele foi o primeiro ator negro a ganhar o papel no teatro.

Em 1965, Laurence Olivier viveu Otelo nas telas de cinema, ao lado de Maggie Smith

Cartaz de Otelo, filme com Laurence Fishburne, o primeiro negro a viver o personagem no Cinema

A L&PM publica Otelo na coleção L&PM POCKET, com tradução de Beatriz Viégas-Faria.

Feira do Livro de Londres disponibiliza vídeos de seminários

Se você tinha se programado para ir a Feira do Livro de Londres (The London Book Fair) e viu sua viagem virar cinza por causa do vulcão, temos a solução para pelo menos alguns dos seus problemas (se você estiver preso no aeroporto há 10 dias, infelizmente, não podemos fazer nada para ajudar). A organização do evento prometeu disponibilizar boa parte das palestras e seminários em vídeo no site oficial. A medida foi tomada justamente para diminuir os prejuízos dos que não conseguiram chegar à capital inglesa. A Feira do Livro de Londres começou ontem, dia 19 de abril, e vai até amanhã. Para acessar a programação completa, clique aqui.