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Patti Smith lê Fernando Pessoa

A cantora Patti Smith – amiga dos escritores beats Allen Ginsberg e William Burroughs – tem uma relação bem próxima com Portugal. Em uma entrevista ao Ípsilon em 2009, ela contou que seu marido, Fred Sonic Smith, falecido em 1994, costumava dizer que, devido à quantidade de livros de fotos de Portugal dos anos 1930 que possuía, um dia iria acordar e “começar a falar como um pescador português”. E Patti completou na entrevista: “Claro que, como muita gente, eu adorava Pessoa. Tom Verlaine [vocalista e guitarrista dos Television] e eu costumávamos ler Pessoa o tempo todo, quando éramos novos”.

Em setembro deste ano, durante mais uma visita a Lisboa, Patti visitou a casa Fernando Pessoa e lá prestou uma homenagem dupla: a Pessoa e a Walt Whitman. Na biblioteca do escritor, onde encontrou livros do próprio autor e também de William Blake, Whitman e Arthur Rimbaud, a cantora leu “Saudação a Whalt Whitman”, poema de Pessoa que ele escreveu sob o heterônimo de Álvaro de Campos (ok, ela leu o poema em inglês…).

O momento foi registrado e disponibilizado esta semana na página de Facebook da Casa Fernando Pessoa.

Aqui está:

A L&PM publica este poema (em português, é claro!) no livro Poemas de Álvaro de Campos – Fernando Pessoa, Obra poética IV (Coleção L&PM Pocket).

 

 

Anonymus Gourmet além mar

Anonymus Gourmet atravessou o Atlântico, chegou na Europa e está no Caderno Life&Style do jornal português “Público”. Na matéria, escrita pela jornalista Alexandra Prado Coelho, e publicada em 28 de novembro, os portugueses são apresentados ao personagem criado há 30 anos por José Antônio Pinheiro Machado e que há duas décadas possui um programa de gastronomia em um canal de televisão do Rio Grande do Sul. Confira parte da matéria:

Afinal, quem é Anonymus Gourmet?

A pergunta no título deste texto não faria qualquer sentido se estivéssemos no estado brasileiro do Rio Grande do Sul. Aí será difícil encontrar alguém que não reconheça o lacinho (gravata borboleta, como dizem os brasileiros), os óculos de aros grossos e redondos, e o sorriso bem-disposto do homem que há duas décadas fala de comida na televisão e se apresenta como Anonymus Gourmet.

Sentado à nossa frente num restaurante de Lisboa, numa recente passagem pela cidade, exibe, orgulhoso, o passaporte, onde aparece identificado com esse mesmo nome: Anonymus Gourmet. “Foi uma personagem de um livro que escrevi há uns 30 anos [O Brasileiro que ganhou o Prémio Nobel – Uma Aventura de Anonymus Gourmet], e que ficou muito marcada”, conta. “Era um homem muito exigente, mas partidário das coisas simples e de boa qualidade, e era contra esses enfeites que muitos cozinheiros fazem para disfarçar os erros”. 

Mas o homem dos óculos redondos e lacinho ao pescoço tem outro nome, e outra (ou outras) vida. Ele é (também) José António Pinheiro Machado, advogado, jornalista, escritor, antigo correspondente em Roma e em Paris, que esteve em Lisboa “durante a revolução dos cravos e muitas outras vezes depois disso”. E um apaixonado por cozinha a quem um dia propuseram que fizesse um programa no canal RBS-TV, que pertence à Rede Globo no Sul do Brasil, chamado Homem na Cozinha. “Eu achei o nome muito calhorda, achei que as mulheres iam detestar e sugeri dar-lhe o nome da personagem do meu livro?”. Nasceu o Anonymus Gourmet. (…)

(Clique aqui e leia o texto na íntegra)

O mais recente livro de receitas de Anonymus Gourmet

O mais recente livro de receitas de Anonymus Gourmet

58. O Primeiro-ministro que amava as novelas

Por Ivan Pinheiro Machado*

Em 1976, Portugal era uma festa. Depois de 40 anos da sinistra ditadura salazarista, a cidade de Lisboa vivia a euforia dos cravos vermelhos. Tudo começara um ano antes, em 1975, quando a Revolução dos Cravos havia devolvido a democracia ao povo português.

Naquele ano, eu debutava na Feira Internacional do Livro de Frankfurt, onde, levado pela mão do grande editor brasileiro Fernando Gasparian, fiz os primeiros contatos com importantes agentes e editores internacionais. Gasparian era um homem internacional na exata acepção da palavra. Circulava nas rodas mais influentes da intelectualidade de esquerda europeia. Havia morado em Londres e feito política no Brasil, onde chegou a ser Secretário da Indústria do Estado de São Paulo. Foi empresário, fazendeiro, ganhou muito dinheiro e sempre se manteve firme nos seus ideais democráticos. Participou ativamente da resistência, foi sócio de O Pasquim e dono do legendário Opinião um dos jornais mais sérios e ativos no combate à ditadura. Na época, Portugal era uma espécie de paraíso para nós, brasileiros nostálgicos da democracia. Um verdadeiro exército de exilados invadia Lisboa. Eram professores, militantes, profissionais liberais, políticos cassados… enfim, uma legião de expatriados que já havia fugido da Argentina, que caíra nas mãos dos militares, e depois escapara do Chile, que estava nas mãos igualmente sinistras de Pinochet. Os que conseguiram sair do Chile acabaram, a maioria, ou em Paris ou em Portugal pós Revolução dos Cravos.

Fernando Gasparian já tinha vários encontros agendados e no domingo, quando a Feira de Frankfurt acabou, nós voamos para Lisboa. Eu fui para a casa do escritor Josué Guimarães, um dos principais correspondentes de jornais brasileiros sediados em Lisboa, que juntamente com sua mulher Nídia me acolheu principescamente. Chegamos por volta do meio-dia e, ao anoitecer, Gasparian me ligou e disse “vamos a um jantar meio formal, seria bom que você colocasse uma gravata”. Era o seu estilo afirmativo, sua maneira peculiar de fazer convites. Eu ri e perguntei onde iríamos. Ele estava apressado: “Vamos nos encontrar às 8h no Tivoli”. Às 8 horas lá estava eu de gravata em frente ao tradicional Hotel Tivoli. O Gasparian chegou pontualmente num táxi, eu subi e em 15 minutos estávamos no… Palácio Presidencial. “O Mário (Soares) nos convidou para jantar”, disse o Fernando rindo, “você vai gostar dele, é um boa praça”.

Fomos recebidos pelo cerimonial do palácio, umas três ou quatro pessoas. Uma das encarregadas não demorou a explicar a ausência do anfitrião: “O Primeiro-ministro pede que aguardem no salão uns 15 minutos, pois ele está a ver a novela brasileira”. Nós sorrimos e sentamos no magnífico salão. O jantar foi divertidíssimo, pois o Primeiro-ministro Mário Soares, amigo do Gasparian, era um homem culto e muito divertido. E não perdia por nada nenhum capítulo de “Gabriela Cravo e Canela”, que liderava a audiência em Portugal em 1976.

Armando Bogus e Sônia Braga eram Nacib e Gabriela na novela brasileira que era sucesso em Portugal

*Toda terça-feira, o editor Ivan Pinheiro Machado resgata histórias que aconteceram em mais de três décadas de L&PM. Este é o quinquagésimo oitavo post da Série “Era uma vez… uma editora“.

Ó pá: Jack Kerouac em português de Portugal

Nós fomos descobertos e colonizados por eles, herdamos a sua língua e alguns de seus hábitos. Mas, mesmo assim, há um oceano de diferenças que separam os brasileiros dos portugueses. Prova disto são os títulos dos livros de Jack Kerouac na versão “luso beat”. 

Cá entre nós, Pela estrada fora parece música da Chapeuzinho Vermelho, não? Pois este é o título que Portugal escolheu para On the road que, aqui no Brasil, virou Pé na estrada. Abaixo, a edição deles do manuscrito original:

O que para nós é algo suave como Despertar: uma vida de Buda para os portugueses virou uma ordem: Acorda! A vida de Buda:

Este não chega a ser tão diferente, mas o nosso Os vagabundos iluminados soa bem melhor do que Os vagabundos do Dharma, você não acha?

E por falar em Jack Kerouac, não esqueça que, em breve, On the road – O manuscrito original será lançado em versão pocket.

A tataravó de todas as livrarias

Ela foi considerada pelo Guiness Book of Records como a “livraria mais antiga do mundo”. E não há como contestar o feito: a livraria Bertrand, de Lisboa, foi aberta em 1732 no bairro Chiado. Para receber o certificado (que foi colocado em uma das paredes da loja) foi preciso passar por uma “rigorosa prestação de provas”. Entre elas, a Bertrand teve que confirmar que sua atividade nunca foi interrompida ao longo destes 279 anos.

A portuguesa Bertrand tem 279 anos e é considerada a mais antiga livraria do mundo

A Bertrand Livreiros foi fundada por Pedro Faure, que tinha origem francesa, e hoje é a maior cadeia de livrarias do país, com 53 filiais em Portugal e uma loja virtual que oferece mais de 100 mil títulos. No site da Betrand, aliás, pode-se ler o manifesto “Somos livros”. O texto (na verdade um poema) cita o terremoto de 1755 que devastou Lisboa, balançou as estruturas da Bertrand, mas, mesmo assim, não foi capaz de fazê-la fechar as portas. Abaixo, o manifesto:

O fim é o princípio.

Uma página que se vira.

Somos a tinta fresca em folha áspera.

A capa dura. Aquilo que procura.

Somos a História.

Desde sempre.

O terremoto de 55 e a revolução de 74.

Somos todos os nomes.

As pessoas do Pessoa,

Alexandre Herculano e Ramalho Ortigão.

O Mundo na mão.

Ponto de encontro.

De quem pensa. De quem faz pensar.

Temos pele enrugada de acontecimento.

As páginas são nossas.

E o pó que descansa na capa também.

Sabemos falar de guerra e paz,

explicar a origem das espécies

e dizer qual a causa das coisas.

Somos o que temos.

A tradição e a vocação.

A atenção. A opinião.

A história de dor e de amor.

Somos o nome do escritor.

A mão do leitor.

O certificado do Guiness Book está na parede da livraria Bertrand do bairro Chiado, que nunca deixou de funcionar. Ao visitar Lisboa, vale conhecer.