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38. O dia em que o dr. Lucchese bateu Paulo Coelho e Harry Potter (juntos)

Por Ivan Pinheiro Machado*

Há poucos dias, neste espaço, eu falei sobre o Grenal (clássico do futebol que divide o RS entre Grêmio e Internacional). Pois bem, no Rio Grande tudo é Grenal. As pessoas se sentem na obrigação de ter um lado. Um contra o outro. Em qualquer coisa, sobre qualquer assunto. Bem ou mal, é assim.

A história que vou narrar a seguir começa com uma gafe:

Para você não confudir o dr. Lucchese com o dr. Nesralla, aqui está a foto do nosso autor

Em Porto Alegre, no Grenal da cardiologia, existem dois grandes médicos, o dr. Fernando Lucchese e o dr. Ivo Nesralla. Ambos têm seguidores que não se relacionam entre si. Nem eles, que são amigos cordiais e já trabalharam juntos, explicam isso. Mas, reza a lenda, havia uma grande rivalidade entre os dois. O dr. Ivo Nesralla, no início dos anos 2000, além de emérito cardiologista, acumulava as funções de diretor da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre e da Bienal de Artes Plásticas do Mercosul. Digo isso porque um belo dia, recém eu havia me mudado para um novo prédio quando, na garagem do edifício, encontro um velho amigo de escola, o também cardiologista João Ricardo Santanna. Nos abraçamos e logo engatamos uma conversa de rememorações da nossa infância no Colégio de Aplicação. Nesse momento, perto de nós, um carro estaciona e desce dele um senhor que vem sorrindo em direção ao João Ricardo. Meu ex-colega me apresenta o recém-chegado:

– Dr. Lucchese, eu queria apresentar o meu velho amigo, o editor Ivan Pinheiro Machado.

– Muito prazer em lhe conhecer – disse, simpático, o dr. Lucchese.

Eu quis ser mais simpático ainda e tasquei:

– Dr., eu queria lhe cumprimentar pelo grande trabalho que o senhor faz à frente da Bienal do Mercosul….

O João Ricardo arregalou os olhos e disse:

–Não, Ivan! A Bienal do Mercosul é com o Dr. Nesralla.

Lucchese caiu na gargalhada e gentilmente tentou me tirar do imenso embaraço:

– Não se preocupe, é assim mesmo. Vivem nos confundindo. Eu até já receitei em nome do Dr. Nesralla.

Eu havia naufragado no Grenal da cardiologia. Mal recomposto da gafe, conversamos um pouco e rapidamente combinamos que, já que seríamos vizinhos, eu incentivaria o dr. Lucchese a entrar no mundo dos livros. E o primeiro passo, segundo sugestão do doutor, seria um livro bem popular sobre prevenção a doenças. E mais não falamos. Ainda envergonhadíssimo, peguei o elevador e fui para minha casa.

Três meses depois, recebo um envelope com um simpático bilhete. “Vê se é este o livro. Abraço do Lucchese”.

Abri, dei uma trecheada nos originais e deixei em cima de um móvel na sala de estar. Passaram-se alguns dias, eu não tive tempo de ver melhor o livro e Dona Circe, minha mãe, foi almoçar lá em casa. Leitora compulsiva, ela pegou o envelope e começou a ler, só interrompendo para almoçar. Eu comi e saí correndo para um compromisso. Minha mãe passou a tarde com os netos. À noite ela me ligou:

– Eu li aquele livro que estava em cima da mesinha da sala, “Pílulas para viver melhor”. Acredita que comecei e não consegui largar?! É um livro espetacular! Festejeou minha mãe.

Fiquei alerta! Ao chegar em casa li os originais, liguei para o doutor e comuniquei a ele que a L&PM estava interessada em publicar o livro. Lançamos em março de 2000 na Coleção L&PM POCKET. Dona Circe tinha toda a razão. O sucesso foi instantâneo. A consagração veio na Feira do Livro de Porto Alegre cuja lista dos mais vendidos, para espanto de todos, apontava o dr. Lucchese em primeiro lugar, na frente de Paulo Coelho, Harry Potter e outros grandes bestsellers da época. Em 17 dias foram vendidos 12 mil livros (só em Porto Alegre), sendo que no último dia de Feira, nas primeiras horas da tarde, o livro tinha esgotado. O pessoal chegou a disputar no braço os últimos exemplares.

Detalhe do Jornal Zero Hora que mostra a lista dos mais vendidos na Feira do Livro de Porto Alegre no ano 2000

O livro estabeleceu o recorde absoluto da Feira do Livro de Porto Alegre em sua história de mais de 60 anos. Depois disso, “Pílulas para viver melhor” chegou à marca de 200 mil exemplares vendidos e o dr. Lucchese já escreveu outros 13 títulos. Há uma anedota (verdadeira) relacionada com o livro. Um dia, bem no final da tarde, havia pouca gente na editora e o telefone tocou. Eu mesmo atendi. Era uma senhora com uma voz muito distinta, dizendo que queria fazer uma reclamação em relação ao livro do dr. Lucchese: “O senhor veja só; hoje a tarde comprei o livro do dr. Lucchese. Quando cheguei em casa e abri a sacola,  vi que só estava lá o livro. Não me entregaram as pílulas…”

*Toda terça-feira, o editor Ivan Pinheiro Machado resgata histórias que aconteceram em mais de três décadas de L&PM. Este é o trigésimo-oitavo post da Série “Era uma vez… uma editora“.

Islã, um mundo muito distante do nosso

A notícia corre por todos os cantos do planeta: Paulo Coelho foi informado de que seus livros estão proibidos de serem publicados e vendidos no Irã, em uma censura imposta pelo Ministério da Cultura e das Diretrizes Islâmicas. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o escritor disse suspeitar que a origem da proibição esteja no fato de, em 2009, ele ter ajudado seu editor iraniano, Arash Hejazi, a deixar o Irã depois das eleições. “Minha obra é publicada no Irã desde 1998, já vendeu milhares de exemplares e, em 2000, eu estive naquele país, sendo esperado por aproximadamente 5 mil pessoas no aeroporto”, disse ele. “O mais surreal é que até as edições piratas estão vetadas. Não sei como vão controlar isso”, completou.

Ontem, também foi divulgada a notícia de que regras mais rígidas foram impostas nas vestimentas das universidades iranianas. As jovens alunas estão proibidas de usar unhas compridas, roupas com brilho e lenços coloridos, além de piercing e tatuagens. Os rapazes também não podem tingir o cabelo, aparar as sobrancelhas, usar jóias ou camisas com “mangas muito curtas”. Tais regras, como sabemos, são só um grão de areia no meio do deserto de radicalismo que envolve o Irã e os outros países árabes-muçulmanos seguidores do islamismo. Mas, afinal, nos perguntamos todos: o que é o Islã? É uma religião? Uma lei? Uma moral? Um estilo de vida? Ou uma cultura?

Na verdade, como explica Paul Balta no livro Islã, da Série Encyclopaedia, ele é tudo isso. Balta, que é especialista no assunto, nos ajuda a entender um pouco melhor como se formou e como funciona esse povo seguidor do Alcorão e que, segundo ele, não é “um todo monolítico, imutável através dos tempos e estático no espaço.” Melhor ler para (tentar) compreender…