Arquivo mensais:dezembro 2012

“História dos Treze”, de Honoré de Balzac

Por Ivan Pinheiro Machado*

Não custa nada relembrar Balzac. Ele deve ser lido sempre. As razões estão em sua própria obra, impressionante na extensão, fascínio, precisão, perenidade e talento.

Quem, na história da literatura ocidental, criou tantos mundos, tantos personagens, tantas intrigas, tantas e tantas histórias como Honoré de Balzac? Criador do romance moderno e do realismo, foi através da monumental Comédia Humana que ele unificou uma obra vasta, original, diversificada em temas, personagens, épocas e lugares.

Concebeu o projeto da Comédia Humana nos início dos anos 1830, quando tinha 30 anos. Em menos de duas décadas (morreu em 1850) criou 89 histórias diferentes – não concluindo o projeto da Comédia, que incluiria 137 livros. Até 1829 escreveu dezenas de romances que publicou sob pseudônimo.

Pela Comédia Humana transitam cerca de 2.500 personagens formando um magnífico e enorme painel da França e da Europa entre as décadas de 1790 e 1830. Frederich Engels, numa carta a Karl Marx, dizia que “eu aprendi mais em Balzac sobre a sociedade francesa da primeira metade do século, inclusive nos seus pormenores econômicos (por exemplo, a redistribuição da propriedade real e pessoal depois da Revolução), do que em todos os livros dos historiadores, economistas e estatísticos da época, todos juntos …”

História dos Treze é a trilogia composta pelos romances Ferragus, A Condessa de Langeais e A Menina dos Olhos de Ouro – completamente autônomos com histórias e personagens totalmente distintos. Em comum, a existência de uma sociedade secreta, Os treze devoradores, espécie de seita composta  por 13 amigos, cujo objetivo é todos ajudarem-se mutuamente – e secretamente – colocando a amizade acima de qualquer preceito moral e até mesmo da lei. Este tipo de “sociedade”, quase um ideal romântico, ocupava o imaginário do público francês e as histórias envolvendo seitas secretas tinham enorme sucesso na época. Balzac embarcou nesta e, muito mais do que seguir uma moda, criou três obras-primas que obtiveram enorme sucesso ao serem publicadas como folhetim nos jornais parisienses.

História dos treze representa um marco na obra balzaquiana, pois ele – ao criar um elo entre os três romances – começava a expor a poderosa mecânica da Comédia, onde centenas de personagens frequentam vários livros, ora como protagonistas, ora como coadjuvantes. Mais do que  o misterioso Ferragus, o legendário herói de guerra general Montriveau, a bela e enigmática duquesa de Langeais, o charmoso De Marsay, a maravilhosa e ambígua Paquita Valdés, a grande personagem destes três livros é aquela que foi a grande paixão de Balzac: a cidade de Paris.

As ruas estreitas, úmidas e escuras, os palacetes, o sofisticado faubourg Saint Germain des Près, as Tulherias, o Boi de Boulogne, os bailes da Ópera, enfim, a grande Paris da Restauração que emergiu dos destroços do império napoleônico está inteira, contracenando e interagindo com homens e mulheres que se debatem em romances improváveis, traições, intrigas, num enredo magnífico que, segundo seu criador, refletia um mundo que resumia sua ambição à busca desenfreada por “ouro e poder”.

* Toda semana, a Série “Relembrando um grande livro” traz um texto assinado em que grandes livros são (re)lembrados. Livros imperdíveis e inesquecíveis.

A língua portuguesa de Olavo Bilac

Em 18 de dezembro de 1918 morria o poeta Olavo Bilac. E mesmo depois de deixar este mundo, ele continuou dividindo opiniões sobre sua obra, como narra Paulo Hecker Filho, organizador da Antologia Poética de Bilac da Coleção L&PM Pocket, no texto de apresentação:

Quando veio o Modernismo na década de 20, uma tomada de consciência, enfronhada da modernidade europeia, do papel do escritor enquanto cidadão e artista, Bilac passa a ser alvo de desprezos fáceis. Mas o líder do Modernismo, seu cérebro estético, Mario de Andrade, não deixou de reconhecer nele o homem sincero e o artista inigualável. Realmente, ninguém tem na língua verso mais plástico e musical.

O poema “Língua portuguesa”, um dos mais célebres de Olavo Bilac, faz parte desta Antologia Poética:

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Retrospectiva: os destaques de 2012

E lá se foi 2012. Deixando boas lembranças e ótimos livros no catálogo L&PM. Foram muitos os lançamentos em formato convencional e pocket. Aqui, destacamos um para cada mês do ano que está terminando, de dezembro até até janeiro.

DEZEMBRO – Não tenho inimigos, desconheço o ódio, de Liu Xiaobo. Por que é destaque: o chinês Liu Xiaobo é um escritor, intelectual, ativista e professor que foi condenado a 11 anos de prisão por suas ideias. Prêmio Nobel da Paz 2010, pela primeira vez seus textos foram reunidos e publicados no Brasil, apresentando uma China que o ocidente ainda não conhece.

NOVEMBRO – Allen Ginsberg e Jack Kerouac: as cartas. Por que é destaque: o livro reúne a correspondência trocada entre os dois escritores beats durante mais de 20 anos. As quase 500 páginas que separarm a primeira da última carta oferecem “uma das mais frutíferas fusões de vida e obra da literatura do século 20” conforme disse a Folha de S. Paulo.

OUTUBRO – Um lugar na janela, de Martha Medeiros. Porque é destaque: a autora de Feliz por nada compartilha com seus leitores as mais afetuosas memórias de viagens feitas em várias épocas da vida, aos vinte e poucos anos e sem grana, depois, já mais estruturada, mas com o mesmo espírito aventureiro.

SETEMBRO – A interpretação dos sonhos, de Sigmund Freud. Por que é destaque: pela primeira vez no Brasil traduzida direto do alemão, a obra maior de Freud chegou à coleção L&PM Pocket em dois volumes coordenados por psicanalistas e professores de renome e que incluindo notas e comentários que Freud adicionou ao longo da vida, mais exclusivo índice de sonhos, nomes e símbolos.

AGOSTO – Guerra e Paz, de Tolstói, na Série Clássicos da Literatura em Quadrinhos. Por que é destaque: no caso de Guerra e Paz, uma obra bastante extensa, a adaptação para HQ é muito impressionante. “Coleciono HQs, de forma intensa, desde 1958. Nunca, nesses anos todos, vi ou ouvi falar de Guerra e Paz no formato de quadrinhos. Qualquer roteirista, mesmo com experiência e capacidade, deve ter sonhado com essa aventura louca.” disse Goida a respeito do livro.

JULHO – Os filhos dos dias, de Eduardo Galeano. Por que é destaque: inspirado na sabedoria dos maias, Galeano escreveu um livro que se situa como uma espécie de calendário histórico, onde de cada dia nasce uma nova história. Provocante, intenso e sensível como toda obra do escritor, os textos formam uma colcha de retalhos costurada com poesia, emoção e concisão.

JUNHO – Uma breve história da filosofia, de Nigel Warburton. Por que é destaque: a filósofa e escritora Sarah Bakewell definiu este livro como um “manual de existência humana em que poucas vezes a filosofia pareceu tão lúcida, tão importante, tão válida e tão fácil de nela se aventurar”. Partindo da tradição iniciada com Sócrates, o autor traz dados interessantes sobre a vida e o pensamento de alguns dos mais instigantes filósofos de todos os tempos.

MAIO – História secreta de Costaguana, de Juan Gabriel Vásquez. Por que é destaque: Juan Gabriel Vásquez foi um dos convidados da Flip 2012 – Festa Literária Internacional de Paraty. Misturando fatos históricos e ficção, Vásquez cria uma história em que o escritor Joseph Conrad é um dos personagens e que tem como pano de fundo a construção do Canal do Panamá.

ABRIL – Simon’s Cat, de Simon Tofield. Por que é destaque: em abril, Simon’s Cat foi publicado pela primeira vez no Brasil. O gato que não tem nome definido é o mais famoso felino do Youtube. Depois de Simon’s Cat – As aventuras de um gato travesso e comilão, em novembro deste ano foi lançado o segundo volume da série: Simon’s Cat – Em busca de aventura.

MARÇO – Erma Jaguar, de Alex Varenne. Por que é destaque: esta HQ luxo traz todas as aventuras de Erma Jaguar, personagem criada pelo notável ilustrador Alex Varenne. Erma é uma espécie de “madame” moderna que à noite, vestindo seu corpete preto e dirigindo seu carro, vai satisfazer todas as suas fantasias. Insaciável, ela enlouquece homens e mulheres de todos os tipos.

FEVEREIRO – Diários de Andy Warhol. Por que é destaque: esta nova edição dos Diários do artista pop Andy Warhol, dividida em dois volumes em formato de bolso (e reunidos em uma caixa especial), marcou a entrada da Coleção L&PM Pocket na casa dos 1.000 títulos. Um dos mais reveladores retratos culturais do século XX, Diários de Andy Warhol soma mais de mil páginas de glamour, fofocas e culto às celebridades.

JANEIRO – 1961 – O golpe derrotado, de Flávio Tavares. Por que é destaque: este livro conta como um movimento de rebelião popular paralisou e derrotou o golpe de Estado dos ministros do Exército, Marinha e Aeronáutica e evitou a guerra­ civil. Escrito por um jornalista que testemunhou e participou do Movimento da Legalidade junto a Leonel Brizola,­ então governador­ do Rio Grande do Sul.

Balzac, Dickens e Dostoiévski nas cartas de Kerouac e Ginsberg

Jack Kerouac e Allen Ginsberg nutriram uma intensa amizade durante mais de 20 anos por meio de cartas. Os assuntos eram os mais variados, desde assuntos pessoais até o gosto em comum por autores como Balzac, Dickens e Dostoiévski e estes registros estão no livro As cartas que acaba de chegar ao Brasil pela L&PM.

Leia uma das cartas, em que Kerouac fala do “espírito de Natal” e termina desejando “Feliz ano novo” ao amigo Allen Ginsberg:

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Andy Warhol censurado na China

Quando se fala em Andy Warhol, o que logo vem à mente são os retratos em série de celebridades e grandes personalidades da história do mundo como da atriz Marilyn Monroe e do líder comunista e revolucionário chinês Mao Tsé Tung. No entanto, o que parece unanimidade no mundo das artes pode esbarrar em questões políticas muito maiores: a grande exposição “Andy Warhol: 15 Minutes Eternal” foi censurada na China justamente por causa dos célebres retratos de Mao.

Entre as mais de 300 peças que fazem parte da mostra, entre pinturas, fotografias, silk screens, desenhos, instalações 3D e esculturas, os 10 retratos do líder comunista feitos em serigrafia e acrílico deverão ficar de fora da exposição em Pequim e Xangai no ano que vem.

Serigrafias com a imagem de Mao Tsé-Tung ficarão de fora da exposição de Andy Wharol em Pequim e Xangai

O museu Andy Warhol de Pittsburgh lamentou que os retratos tenham sido retirados da exibição, mas não explicou a razão da mudança. “Esperávamos incluir nossas pinturas de Mao na exposição para mostrar o grande interesse que Warhol tinha pela cultura chinesa. No entanto, compreendemos que algumas imagens nem sempre podem ser mostradas na China”, declarou o museu em um comunicado.

A exposição, que vai percorrer a Ásia até 2014, passará por cinco cidades do continente: Cingapura, Hong Kong, Xangai, Pequim e Tóquio. Ainda que proibidos em território chinês, os retratos de Mao poderão ser vistos em Hong Kong, território semiautônomo no sul da China, até março de 2013.

Para saber mais sobre a vida e a obra do pai da pop art, vale ler os Diários de Andy Warhol da Coleção L&PM Pocket.

“On the Road” eleito um dos dez melhores filmes independentes de 2012

Você já parou pra pensar na quantidade de filmes independentes que são feitos no mundo inteiro ao longo de um ano inteiro? A gente garante que são muitos. Isso significa que ser escolhido como um dos melhores de 2012 é um feito e tanto. E “On the Road”, de Walter Salles, conquistou essa posição. O filme baseado na obra homônima de Jack Kerouac foi eleito um dos dez melhores filmes independentes de 2012 segundo a National Board of Review.

Há mais de cem anos, a National Board of Review, uma organização sem fins lucrativos, “celebra a voz inconfundível do artista individual, honrando a excelência e apoiando a liberdade de expressão no cinema” como diz o seu site. Ao longo do ano, essa ONG promove seminários e oferece subsídios a estudantes de cinema. A cada ano, são assistidos e analisados mais de 250 filmes (de grande estúdio, independente, de língua estrangeira, animação e documentário) por um seleto grupo do qual fazem parte cineastas, acadêmicos, estudantes e entusiastas do cinema em geral.

No final do ano, os membros da National Board of Review recebem uma lista de todos os filmes exibidos, juntamente com as cédulas finais de votação. Depois, os votos são tabulados por uma empresa de contabilidade pública certificada, a fim de determinar os homenageados. Confira aqui a lista dos vencedores de 2012 da qual faz parte o excelente On the Road de Salles.

Garrett Hedlund (Dean Moriarty) e Kristen Stewart (Marylou) ao lado do diretor de On the road, Walter Salles

O nascimento de Henry Miller

Henry Valentine Miller chegou como um presente de Natal atrasado. Nasceu no dia 26 de dezembro de 1891 em Nova York, filho de uma modesta família de origem alemã. Com o pai, que era alfaiate, o jovem Henry teve uma ótima relação. Já com a mãe, uma mulher intolerante e severa, a harmonia não foi tanta.

Sua juventude foi difícil e Henry passou a maior parte dela perambulando pelas ruas do Brooklyn ou cuidando da irmã com problemas mentais. Nesse período, leu toda a obra de Dostoiévski. Ao abandonar os estudos – porque não conseguiu se encaixar no sistema tradicional de ensino – fez de tudo um pouco: foi lavador de pratos, mergulhador, açougueiro, caixeiro-viajante, jornalista, entre outras profissões.

Aos 21 anos, foi morar na Califórnia e descobriu o anarquismo e, em 1917, casou-se com a primeira das cinco esposas que teria ao longo da vida –  e que seriam transformadas em personagens de muitas de suas obras.

Por volta de 1930, Henry viajou para Paris com os parcos recursos obtidos com a venda de seus livros. Lá conheceu personalidades importantes da cena artística, entre elas, Anaïs Nin, que viria a ser sua amante e que financiaria Trópico de Câncer, lançado em 1934 e logo proibido nos EUA, acusado de obscenidade e pornografia.

Nos anos 40, o autor passou uma temporada em Big Sur (depois Jack Kerouac faria o mesmo) e lá escreveu e pintou muito. Tão forte foi a ligação de Henry Miller com Big Sur que, ao morrer, em 7 de junho de 1980, suas cinzas foram lançadas nestas montanhas da costa californiana.

Henry Miller no início dos anos 30

Henry Miller no início dos anos 30

Henry Miller em sua cabana em Big Sur

DEZEMBRO

Conheci Henry Miller.

Ele veio almoçar com Richard Osborn, um advogado que eu tinha que consultra sobre o contrato para meu livro de D. H. Lawrence. Quando ele saltou do carro e se dirigiu para a porta onde eu estava esperando, vi um homem de que gostei. Em seus escritos ele é extravagante, viril, animal, opulento. E um homem a quem a vida embriaga, pensei. É como eu. (…) Conversamos durante horas. Henry disse as coisas mais verdadeiras e profundas, e ele tem um jeito de dizer “mmmm” enquanto divaga por sua viagem instrospectiva.

(Trecho de Henry & June, de Anaïs Nin, e que faz parte dos Diários Não-Expurgados da escritora)

De Henry Miller, a Coleção L&PM Pocket publica A hora dos assassinos e O colosso de Marússia.

“As aventuras de Pi”: um filme que só existe graças a “Max e os felinos”, de Moacyr Scliar

Em 2002, um livro chamado “Life of Pi”, do escritor canadense Yann Martel, foi o grande vencedor do Booker Prize, da Inglaterra. Assim que o prêmio foi anunciado, o jornal britânico The Guardian publicou uma matéria em que afirmava que o livro de Martel era um plágio de Max e os felinos (Coleção L&PM Pocket), obra que Moacyr Scliar (1937-2011) lançou em 1980 e que havia sido traduzida para o inglês em 1990. A partir daí, o circo estava armado e Scliar foi procurado por jornais do mundo inteiro para que desse uma declaração oficial sobre o provável plágio. O que os livros têm em comum e o aconteceu a partir daí, o próprio Moacyr Scliar conta em “Palavra de Escritor”, um vídeo/entrevista feita com ele, em março de 2010, pela L&PM WebTV:

Dez anos depois, o assunto voltou à pauta com a estreia de “Life of Pi” (As aventuras de Pi), filme dirigido por Ang Lee. Independente de ser plágio ou não, uma coisa é certa: a adaptação para o cinema só existe por causa do livro de Martel. E Martel só teve essa ideia por causa de Scliar.

"Max e os felinos" e de "Life of Pi": a imagem da capa não deixa dúvidas de que há algo de semelhante entre as duas histórias

O poster do filme que já está em cartaz no Brasil